Nas livrarias de todo o país, o livro de contos O perfume de Roberta , do escritor Rinaldo de Fernandes. É editado pela Garamond, do Rio de Janeiro, pela qual Rinaldo já publicou em 2004 a coletânea Chico Buarque do Brasil . O livro, com prefácio de Moacyr Scliar, tem 18 contos e foi preparado nos últimos 8 anos (o primeiro livro do autor intitula-se "O Caçador", de 1997). São contos essencialmente urbanos, com exceção de "Sariema", uma recriação do clássico "A hora e vez de Augusto Matraga", de Guimarães Rosa. "Negro", um dos contos do volume, virou em 2004 um curta-metragem do cineasta Renato Alves. Encerrando o livro, há uma seção com apreciações críticas dos contos feitas por vários autores: Mário Chamie, Nelson de Oliveira, José Castello, Tereza Andrade, Adriano Espínola, Tércia Montenegro, Carlos Ribeiro, Ataíde Tartari, Carlos Gildemar Pontes e Luiz Antonio Mousinho. Dessa mesma seção consta um ensaio em que professora e doutora (pela PUC/Rio) Sônia Lúcia Ramalho de Farias analisa três contos do autor. Sobre "O perfume de Roberta", conto que dá título ao volume, diz Moacyr Scliar: "Um relato realista, ambientado em São Paulo, cidade que é uma síntese da realidade brasileira. Um homem sai de casa para viver uma aventura sexual, que nos é descrita em termos pungentes. Uma dolorosa transgressão, mais dolorosa do que transgressão e que desvenda o conflito oculto sob o bruto desejo, culminando na frase final que funciona como melancólica metáfora". Ainda sobre esse conto, diz José Castello: "Rinaldo, em 'O perfume de Roberta', descreve o amor triste entre um homem maduro da classe média e uma menina miserável que vive nas ruas usando um tônus kafkiano. Adota a mesma frieza e indiferença do autor de uma ata de reunião de condomínio, ou de uma secretária que se limitasse a registrar, sem comentários, aquilo que ouve. [...] Para as sessões de sexo, a adolescente veste a roupa de Roberta, a filha do narrador, fantasia que ele mesmo lhe cede. O capricho pode ser tomado como uma encenação do incesto, mas pode ser visto também só como um expediente prático, e sem significados, para disfarçar o nojo e tornar aceitável o inaceitável". O poeta Mário Chamie, que considera Rinaldo um dos melhores ficcionistas brasileiros da atualidade, entusiasmado, aplaude o conto "O Cavalo": "Gozei do privilégio de ter sido o primeiro a ler o primoroso, comovente e perturbador conto 'O Cavalo'. [...] Um cavalo de élan mítico, um cavalo em estado de solidão, mas à mercê dos abrigos casuais que o seu teto a céu aberto pode lhe propiciar. Daí porque esse cavalo se refugia em si mesmo e se faz de auto-barca de Caronte. Um Caronte benfazejo, pois o auto-refúgio que caminha nele e com ele não leva (nem transporta a pobre mulher) ao inferno da prisão dos desentendimentos e dos martírios fúteis. A mulher, acolhida nesse auto-refúgio vigoroso e dócil, ao contrário, é levada à paz desconhecida, longe e livre do seqüestro doméstico que a vitimava com as suas pífias e amesquinhadas paixões. Que beleza de conto!". Nelson de Oliveira, por sua vez, avalia: "Dos contos que eu li de Rinaldo de Fernandes, 'Confidências de um amante quase idiota" é o meu predileto. É também um dos contos mais canalhas que já foram produzidos em língua portuguesa. É claro que há um quê de Dalton Trevisan nele, mas não vejo problema algum nisso, porque Rinaldo digeriu um estilo já conhecido e vomitou algo novo. Eis um conto verdadeiramente cruel e cafajeste. A cena em que o narrador puxa a gravata e depois passa a mão na bunda da moça é antológica". Tereza Andrade, editora (proprietária da Lamparina/RJ), também se entusiasma com o autor: "O conto 'Oferta' me pegou. Reflexo puro de nosso tempo. Retrato do nosso Brasil e do mundo. Funciona muito mais como denúncia contra crimes de prostituição infanto-juvenil do que qualquer campanha que possamos fazer. E me fez pensar muito. O personagem é consciente o tempo todo do que está fazendo e justifica, alivia sua culpa, pela ação conivente de outro homem, que faz a mesma coisa. Termina assoviando! Não poderia ser mais cruel e realista. E sem moralismo algum. Apenas a realidade. Qualquer um, normal, não regido pela ética, é capaz de praticar um crime assim. Uma coisa comum. Banal. A própria avó, sem pudor de sua usura, abençoa o crime. Isso sem contar com o mérito de que a escrita de Rinaldo de Fernandes é absolutamente envolvente, cativante". |