Conferência do professor Arassari Pataxó

O Brasil indígena. Conferência do professor Arassari Pataxó na Università degli Studi Internazionali di Roma (UNINT)

Por MARIA CLOTILDE BENVENUTI
Aluna de terceiro ano de língua portuguesa na Università degli Studi Internazionali di Roma (UNINT)


No dia 9 de dezembro de 2019, a Università degli Studi Internazionali di Roma (UNINT) teve o prazer de acolher o Professor Arassari Pataxó, uma grande liderança indígena no Brasil.

Desde o início, ele sublinhou os motivos pelos quais estava aqui em Roma: ele quer dar voz e memória às problemáticas actuais do Brasil.

Ele apresentou os povos indígenas do seu país: os que moram na floresta, que têm uma relação sagrada com a Natureza e lutam todos os dias para a sua preservação.

“Nós”, os cidadãos da Europa, somos gente da cidade; eles são as pessoas da floresta.

Por isso, o pensamento e a cultura deles são totalmente diferentes dos nossos.

O senhor Arassari sublinhou o valor fundamental do respeito: estes povos moram na floresta há mais de 500 anos e lutaram sempre para preservá-la, embora os governadores quisessem destruí-la vendendo os produtos da terra.

De facto, a terra está rica de ouro, de minerais, de madeira e de outros materiais.

O Arassari diz-se preocupado pela possibilidade que, daqui há pouco tempo, a floresta não tenha mais vida, caso os seus moradores sejam obrigados a ir-se embora.

A terra agora, graças a eles que permitiram tudo isto, é um lugar preservado, com flora, fauna e água limpa.

Esta forte relação com a Natureza aparece clara também no nome do Professor.

“Vocês sabem qual é a origem da palavra Pataxó?” perguntou-nos o senhor.

Ninguém o sabia…

Pataxó é o som da água do mar que bate nas pedras. De facto, o povo dele mora perto da praia e quando a lua está cheia, todo o povo faz o ritual da abundância: eles dançam e cantam alegremente na praia, onde depois vão dormir.

Mas como é a sociedade destes povos?

A tribo é formada por velhos e jovens; na aldeia dele, o mais velho tem 118 anos!

Os homens e as mulheres passam por duas fases diferentes da vida:

  1. Ser criança: ela/e brinca e fica em casa com a mãe;
  2. Ser adulto: quando iniciam as mudanças (voz, corpo, ficar menstruadas para as mulheres…) ela/e passa através de rituais de preparação (foro da orelha com espinho…).

Ele vai aprender os segredos da medicina, da Natureza, as técnicas de luta e ela vai aprender “os segredos da boa mulher”, ou seja, como cuidar do corpo, da casa e como comportar-se na vida social.

Eles são “agráficos”, ou seja, não têm uma norma escrita e não escrevem; eles são os povos da oralidade. A história, as tradições, os valores são passados por voz, como Arassari Pataxó diz, “eu ouço o outro”. O Professor disse uma frase que nos surpreendeu bastante: “Nós buscamos o passado, vocês buscam o futuro”.

Nas aldeias eles não têm internet; os velhos transmitem a sabedoria aos jovens. Eles vão à escola, que não é como nós a imaginamos: é uma oça coberta com folhagens e as crianças participam em círculo, sentados no chão, sem cadeiras nem secretárias. Eles aprendem a ética, a moral, os valores, o idioma e o contato com a mãe Natureza.

Na aldeia dele as pessoas usam paramentos como uma espécie de “diploma” social.

As lideranças vestem penas de araras (a recolha delas demora mais de 6 meses e eles não matam o animal) e os outros vestem paramentos com penas de pato.

Às vezes, ouve-se dizer que os povos indígenas são os donos da terra; Arassari Pataxó afirma que eles são os filhos dela, não os donos.

O Arassari disse também que eles têm um grande respeito pela Terra e contou que as pessoas pedem licência à Natureza quando precisam algo de ela.

Esta é uma coisa que me tocou muito, porque o Professor afirmou que neste universo todos precisamos do outro e que os povos indígenas nos ajudam na preservação do nosso mundo. Depois ele lembrou-nos que nada de este mundo é “nosso”; de facto, nós somos só pessoas de “passagem” e, se quisermos deixar um mundo sustentável aos nossos filhos, netos e descendentes, deveríamos começar a ser mais responsáveis e cuidar da terra.

A nossa vida é frenética, corremos todos os dias, mas às vezes precisamos parar para refletir um pouco. O Professor fez-nos uma pergunta:

“Aqui está mais o menos tudo bem, mas vocês nunca se perguntaram se no outro lado do mundo está o mesmo? Se as vossas ações têm consequências nos outros?”.

Estas perguntas fazem-nos pensar muito e reflectir sobre o facto que muitas vezes nós somos egoístas.

Os povos indígenas vivem através da sustentabilidade, comem fibras (milho, mandioca, batata doce, peixe, abóbora…), comunicam diretamente com os pássaros através de rapsoi (um assobio para pássaros, que se toca com o nariz, a boca e a língua).

Esta última actividade é fundamental para os indígenas, pois eles afirmam que “a maior sabedoria do ser humano é entender e falar com a mãe Natureza”.

Depois apresentou-nos uma distinção entre 5 tipos de povos indígenas:

  1. Isolados: aqueles que não têm contacto nenhum com a sociedade nacional;
  2. Semi-isolados: aqueles que moram nas florestas e têm algum contacto com o “mundo exterior”;
  3. Índios aldeiados: aqueles que moram nas aldeias;
  4. Indígenas em contexto urbano: aqueles que abandonam a terra deles e se deslocam na cidade;
  5. Índio de auto-reconhecimento: aqueles que se reconhecem índios, mas foram expulsos ou nunca moraram na aldeia)

Para concluir o encontro, o Professor Arassari Pataxó enfrentou um assunto delicado: as problemáticas que há naqueles territórios.

Enquanto ele explicava a situação actual do Brasil, a voz dele mudou e esta foi uma coisa que todos os participantes notaram. Foi um momento muito tocante, porque este era o motivo pelo qual ele chegou à Itália.

Em primeiro lugar, hoje a problemática mais critica é o desmatamento, a queimada das florestas, mas também o fazer mineração na terra indígena.

Pataxó sublinha sempre que os Índios são os guardiãos da nossa terra, da floresta, dos rios, da Natureza.

Mas “nós”, que não moramos no Brasil, o que podemos fazer para ajudar os povos indígenas?

Há muitas coisas, mas a mais importante é “falar”, narrar as condições dos outros países e sobretudo sensibilizar os nossos cidadãos, porque há uma grande falta de respeito pela Natureza e por aqueles que vivem em simbiose com ela.

Esta foi a conclusão deste dia, e podemos dizer que ele teve um grande sucesso.

Desde hoje, iremos tentar ser menos “egoístas” e mais empáticos com as problemáticas mundiais; reflectir mais sobre as consequências das nossas acções e difundir a sabedoria sobre culturas diferentes das nossas.

Obrigada, Arassari Pataxó!

“Hoje, nós estudamos para defender nossos direitos e encarar o mundo lá fora.
Hoje, nós somos a minoria, mas, antigamente, erámos a maioria e vivíamos felizes nessa terra.
Nós, Pataxó, somos fortes guerreiros, como as outras nações indígenas que vivem por lá e em outros Estados.” (Arassari Pataxó)


Arassari Pataxó