SÍMBOLOS GEOMÉTRICOS E ALGÉBRICOS NA ARTE:
Almada e Lima de Freitas
RAQUEL GONÇALVES
3. «Quem é Eu» e «que é o quê»? 515
O ponto de partida de Lima de Freitas – melhor diria o número de partida de Lima de Freitas – foi o 515. 

«A Aparição de Cristo à Virgem», do retábulo do antigo convento da Madre de Deus em Xabregas, é um óleo sobre madeira que pode ser actualmente admirado no Museu Nacional de Arte Antiga em Lisboa. Embora não se encontre assinado, o que era normal na época, é correntemente atribuído a Jorge Afonso, pintor do rei D. Manuel I. Sobre a data da sua feitura, porém, existe alguma polémica.

Na parte central da obra um anjo sustém uma presumível data: 1515.

O estilo da obra, todavia, não acorda com esta data, antes com uma época mais tardia, entre 1530 e 1540. Como se mostra na ampliação de uma parte da tela - Figura 8, o primeiro algarismo é diferente dos outros, provavelmente apócrifo. Sendo assim, “esconderá”, segundo Lima de Freitas, o 515.

O 515 tem uma história antiga ligada a Dante e à «Divina Comédia» onde surge, inexplicavelmente, no último canto do Purgatório, quando Beatriz profetiza a vinda do Messias de Deus (o cinquecento diece cinque) para restabelecer o reino da justiça.

Lima de Freitas descobre o 515 e entende-o, apoiado em construções geométricas, como o lugar do espelho, o conversor, o número capaz de restituir, a partir do reflexo invertido e pouco transparente, a imagem da realidade perfeita e divina do Antropos. 

(À esquerda:
O "515" de Lima de Freitas)

É, pois, decididamente, o número da transmutação alquímica de êxito, do mistério da ressurreição.

O 515 foi número de fixação de Lima de Freitas que a ele dedicou um livro e muitas telas, uma das quais, «O Achado do 515», apresenta estreita simbiose com o poliedro da «Melancolia» de Albrecht Dürer. 

É o "quem é Eu?" e o "que é o quê?", desejos primordiais de saber, um interior, outro exterior, que originaram esta arte específica (e universal) do simbólico em Almada e em Lima, arte que traduz, afinal, as inquirições, as dúvidas e as certezas comuns a todos os povos, com ou sem interacção no espaço e no tempo. Todos os homens se interrogam sobre o sentido de Ser envolvente e utilizam o símbolo como forma de mensagem.

A coisa mais difícil do mundo é um homem encontrar-se a si próprio.

Disse Lima de Freitas:

Cada poeta, cada nação, cada modo de sentir terá de traduzir o mito sem tempo para a inteligência do seu tempo.

 
II Colóquio Internacional Discursos e Práticas Alquímicas (1999).
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Discursos e Práticas Alquímicas". Volume II (2002) - Org. de José Manuel Anes, Maria Estela Guedes & Nuno Marques Peiriço. Hugin Editores, Lisboa, 330 pp. hugin@esoterica.pt
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