REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências

ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE

 

 

 






JOSÉ PINTO CASQUILHO::::.::::

 25 de Abril de 2011

Hoje passou uma arruada à minha porta, miúdos e graúdos, gaita de foles e rufar de tambores. Pendurado da janela, lá fiquei com um cravo vermelho. Foi há 37 anos e eu tinha 16 anos então. Que belos sonhos tivémos na minha geração, um mundo mais justo, um mundo melhor, utopias claro, mas como dizia o poeta: quando um homem sonha o mundo pula e avança. E assim foi e parecia ser durante largos anos. Falo de Portugal.

Portugal hoje, ou melhor: uns tantos bancos e outras tantas empresas públicas, estão classificadas como lixo pelas agências de notação, e a dívida soberana está a um passo. Essas agências foram recentemente consideradas pelo Senado americano como as principais causadoras da crise financeira que eclodiu em 2008 e por aí sucedeu como bolhas num sistema em cavitação. Como foi possível termos chegado a este estado do Estado? Terá sido a nacionalização do BPN que salvou as fortunas dos poderosos e se espraiou pelas contas públicas em défices e buracos sucessivos? Seria algo que já estava escrito de longe e ninguém falou? Não sei, estou por fora de quaisquer meandros políticos. É verdade que o problema é comum a Portugal, Grécia, e Irlanda, e esperemos que não alastre, e constitui assim um síndroma: o lote dos países periféricos que receberam pacotes de fundos comunitários nos anos oitenta e noventa tinham uma pesada factura escondida à espera, é o que parece. Capitalismo financeiro no seu esplendor totalitário.

Sei que estou falido, e sei porquê. Em 2005 fui tempestivamente despedido por uma instituição do Estado, sem ter tido processo disciplinar, sem acusação de incumprimento de serviço, e nem tive direito a subsídio de desemprego porque, apesar de tal lacuna na lei ser inconstitucional, não estava previsto então para os professores universitários. Advogados disseram-me que tal despedimento seria ilegal, e até inconstitucional, e fui convencido a interpor acção judicial, para não ser cúmplice por omissão com uma injustiça que cometida sobre um constituiria uma ameaça sobre muitos. Seis anos depois, sobre uma questão tão simples como um contrato automaticamente renovado pouco mais de um ano antes do despedimento, e ainda com quatro anos pela frente, não conheço a resposta do tribunal.

Ainda hoje não sei qual o motivo maior desta perseguição. Várias pessoas me disseram então que tinha sido um despedimento claramente político. Enfim, contrariei de várias maneiras interesses poderosos mas o que me moveu nessas lutas foi o meu conceito de bem comum, e, hoje, depois de ter lido muita história reconheço que o que era o desfecho mais provável: não é impunemente que se ataca interesses poderosos.

Enquanto procuro construir um futuro noutro lugar, coisa que parece estar encaminhada, ainda sou investigador em Portugal, sem vínculo nem vencimento, fica o título, mas está aí o meu cv para quem quiser julgar [*].

Vejo-me na necessidade de dizer que já conheço as privações  e se ainda tenho abrigo, e enquanto tenho, já é pela boa vontade de alguém. Se outros me quiserem ajudar no entretanto, aceito, contactem-me por email. Dantes, quanto mais não fosse por orgulho, ser-me ia impossível escrever isto, agora não.

[*]http://www.triplov.com/casquilho/Curriculum/index.htm

José Pinto Casquilho. Centro de Ecologia Aplicada Baeta Neves (CEABN/UTL), Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens
josecasquilho@gmail.com
(CECL/UNL).