Transitar de um regime
definido por uma só cúspide, que esquematiza a crise, para outro regime
onde podem coexistir três modos de equilíbrio estáveis {{A,B,C}} numa
região, obriga o parâmetro t a passar de positivo a negativo. Ora
o parâmetro t, associado ao termo do quarto grau, designado
factor borboleta [5], é identificado com o tempo, expresso
como número real. Passamos então de um regime de cúspide para outro de
borboleta quando o tempo se torna negativo. Em termos de números reais -
um conjunto ordenado identificado com uma recta orientada - um valor
real negativo quer dizer apenas: antes da origem.
A origem é representada
pelo número zero, que tem uma longa história [6], só tendo adquirido os
primeiros direitos de cidadania na Europa por volta do século XIII, com
a sua fixação simbólica por Leonardo de Pisa em 1202, terminando com a
sua definição axiomática como número por Peano no final do século XIX.
O domínio de existência
da catástrofe borboleta é assim um espaço misterioso que pode
interpretar-se como ocorrendo num tempo antes da origem, num tempo antes
do tempo.
Mircea Eliade define o
tempo sagrado como um tempo circular, reversível e recuperável, espécie
de eterno presente mítico, em oposição ao tempo profano, destruidor,
irreversível. E acrescenta que o sagrado tem uma outra origem porque se
trata de um tempo primordial, santificado pelos deuses e susceptível de
tornar-se presente pela festa.
Pode dizer-se que nesta
acepção coexistem assim duas dimensões de tempo, o tempo sagrado e o
tempo profano, que relevam da dicotomia clássica kairos/chronos.
A representação simultânea das duas dimensões - se associarmos valores
de absoluto a tempo sagrado e valores de universo a tempo profano -, cai
no quadro daquilo que Fontanille e Zilberberg designaram por sintaxe
tensiva [7]: um esquema com duas dimensões onde a sua conjugação
constitui o facto tensivo propriamente dito, resultante da correlação
entre a sua intensidade e a sua extensidade. Outros poderão argumentar
que o tempo sagrado é o lugar onde se dissolve toda a tensão.
Na catástrofe borboleta,
um modelo de morfogénese, sai-se do esquema da crise representado pela
cúspide para um modo que permite a introdução de um mediador, um
terceiro incluído, um equilíbrio do meio. Ora sendo o número 3 o
primeiro representante de muitos fica aberta a multiplicidade. Ou
seja: saiu-se da disjunção exclusiva geradora de conflito ou a ou b
para a extensão ou a ou b ou c, podendo c ser apenas nem
a nem b.
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