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JOSÉ CASQUILHO::::......:::: |
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Morfogénese:
borboleta cauda de andorinha |
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Mais l’homme est perdu dans son
contemplation.
Il a abbordé aux rives de l’´éternité. Ivar Ekeland (1) |
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Nas cáusticas de luz [2] vimos a cúspide associada à ruga, e foi dito
que se lhe seguia a cauda de andorinha. Podemos recordar o contexto:
estamos no âmbito da Teoria das Catástrofes e da elaboração da lista das
sete catástrofes elementares, correspondentes ao desdobramento universal
de um polinómio - entendido como função de Lyapounov [3] - que governa
um sistema dinâmico que se expressa numa dinâmica; os pontos em que o
gradiente se anula são os equilíbrios, podem ser estáveis ou instáveis,
ou ainda degenerados, e estão reunidos numa variedade real. Estamos fora
do âmbito das variedades complexas, aqui não intervêm números
imaginários.
No
plano real Peirce referiu as cúspides e inflexões como singularidades
ordinárias bem como os pontos estacionários e as tangentes , e ainda
definiu uma singularidade de tipo superior como sendo uma que difere
muito pouco de um agregado de singularidades ordinárias. Peirce
analisava as singularidades no plano cartesiano [4] mas é possível fazer
uma extensão para o espaço com mais dimensões.
É assim que se vê que a ruga é formada por duas dobras, sendo a dobra a
catástrofe elementar, e a cauda de andorinha é formada por uma ruga e
uma dobra. O nome cauda de andorinha foi sugerido pelo matemático cego
francês Bernard Morin [5].
Também vale a pena recordar que o termo catástrofe não tem aqui a
conotação negativa da linguagem corrente, corresponde a uma transição
abrupta, uma transição de fase, mas tanto pode ocorrer num sentido
negativo como positivo. Nas palavras de Thom era essa transição abrupta,
uma descontinuidade no comportamento, que muitas vezes salvava o
sistema. Aliás Thom preferia designar o tema geral como morfogénese[6]
retomando a expressão de Alan Turing, e insistia que a TC era uma
linguagem e um método que visa encontrar o modelo dinâmico mais simples
capaz de explicar uma morfologia empírica.
O
conjunto catastrófico num tal sistema dinâmico é o complementar do
conjunto aberto dos pontos regulares - é o conjunto fechado dos pontos
singulares -, também chamado conjunto de bifurcação, entendendo-se por
singularidade uma figura que se concentrou num ponto; o conjunto
catastrófico obtém-se projectando a sub-variedade dos equilíbrios
degenerados no espaço definido pelos parâmetros de controlo.
Tinha-se uma boa imagem na cúspide e também se tem uma boa idéia na
figura seguinte onde o ponto f se designa ponto cauda de andorinha e à
medida que nos aproximamos do ponto, fazendo um corte vertical, vê-se
que a estrutura permanece a mesma, embora cada vez mais pequena:
condensação progressiva da figura num ponto. |
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Fig. 1 - esquema do conjunto catastrófico cauda de andorinha
em que o ponto f é o ponto cauda de andorinha [7] |
No
diagrama seguinte apresenta-se a configuração dos diferentes equilíbrios
do sistema (inflexões, mínimos e máximos) segundo um corte vertical
nesse esquema. |
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Fig. 2 - corte vertical do esquema anterior mostrando a taxonomia
das funções estabilizadas [8] |
A
cauda de andorinha e a borboleta são as duas catástrofes elementares que
fecham a sequência das que têm uma só variável de comportamento (ou de
resposta) - designadas genericamente por cuspóides - e vários
parâmetros. O ponto de partida é a não-catástrofre elementar: o mínimo
de uma função potencial, o estado elementar do ser, que se coloca como
hipótese e que funda a estabilidade estrutural. |
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Fig. 3 - caracterização das singularidades cauda de andorinha
e borboleta na lista de Thom[9] |
O
desdobramento universal da cauda de andorinha expressa-se canonicamente
como uma fórmula com três parâmetros de controlo {u,v,w} e uma
variável-resposta x inserida na arquitectura de um polinómio de grau 5.
Usando a interpretação cinemática de Peirce na caracterização da
cúspide[10], também na cauda de andorinha podemos ensaiar uma leitura
cinemática sobre o diagrama canónico interpretado como um legissigno
icónico remático[11] na classificação de Peirce, comportando uma lei. |
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Fig. 4 – diagrama simplificado da cauda de andorinha com leitura
cinemática |
Nesta leitura o ponto f representa um ponto de retorno, trata-se no
entanto de um regresso ao futuro, já que segue por uma linha diferente
da trajectória original, onde à conta de duas cúspides (sendo uma delas
dupla) regressou à direcção principal mas sentido diverso – a cauda de
andorinha pode ser vista como a figura do retorno, a que podemos
associar a parábola de que as andorinhas anunciam o regresso da
Primavera. Petitot caracterizou-a como sendo a figura da deixis[12], um
sistema de indicadores.
A
cauda de andorinha foi o título e o tema do último quadro de Salvador
Dali. |
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Fig. 5 - Salvador Dali, 1983: Swallowtail |
Sucede que a cauda de andorinha tem poucos equilíbrios estáveis quando
comparados com os instáveis, para um grande número de condições, pelo
que não é um bom modelo qualitativo para fixar estados empíricos. A
catástrofe que se lhe segue - a borboleta - pelo contrário, contém três
camadas distintas de equilíbrios estáveis, representando a intermédia um
compromisso entre as outras duas. |
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Fig. 6 – secção do diagrama de fase da catástrofe borboleta[13] |
Fazendo uma bela síntese de nomes a borboleta cauda de andorinha
permite-nos imaginar a transição metafórica. |
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Fig. 7 – borboleta cauda de andorinha, foto da Wikipedia |
A
catástrofe borboleta tem uma fórmula que comporta uma variável-resposta
e quatro parâmetros. Que interpretação podemos fazer disto? Imaginemos,
a propósito da situação contemporânea de crise internacional que a
variável resposta representa um índice de confiança e então os quatro
parâmetros que definem o espaço de controlo podem ser entendidos como
índices de verdade, liberdade, igualdade e solidariedade: {v,l,i,s}. A
confiança é função daqueles quatro parâmetros e a sua retoma exige uma
concertação adequada. Na cauda de andorinha temos à mesma uma variável
resposta e três parâmetros, seja {v,l,i}, é a falta de solidariedade que
instabiliza a situação dir-se-ia; outras interpretações são possíveis,
obviamente, a falta de aderência à verdade é letal para a credibilidade
do sistema.
Estamos a falar de morfogénese, o tema que foi introduzido por Alan
Turing[14] a partir da formulação matemática de processos de
reacção-difusão, e que era o quadro a partir do qual Thom enunciava os
modelos.. A palavra chave é desdobramento universal [15] de um polinómio
definido como um desdobramento versal com o número mínimo de parâmetros,
no âmbito da teoria da estabilidade estrutural.
Também em Ecologia o tema é recorrente, o espaço de Turing ficou uma
referência conceptual [16], sendo aplicada a definição de catástrofe ao
caso em que uma população decresce abruptamente de um estado de
abundância para baixa densidade [17], rarefacção, podendo
ser várias as causas, tema aliás que vem sendo tratado na relação com os
recursos desde Malthus para não ir mais longe.
PS: Caro Leonardo Boff, desde há muito
que o leio, creio que vamos no mesmo sentido e se calhar no mesmo barco,
complexo por certo, ou real ainda por fazer, fazendo-se. Desde que vi
que, antes de mim, você e o Wilson já tinham usado o termo biofilia, que
trabalhei aqui [18], que nos senti companheiros.
Li este seu texto [19] enquanto compunha
estas palavras que apresento em cima. O meu esforço, nestes últimos
tempos, foi fazer pela reabilitação do rigor da Escola Francesa,
desgraçadamente banido de cena durante uns tempos pela pérfida
orientação da polémica Sokal. Foi agenda política, esta escola de
pensamento era a única que se poderia ter oposto à vertigem da
adrenalina da aceleração do lucro e do embuste, porque é mais platónica
do que aristotélica, vê formas. Agora já está de novo em cima da mesa. |
NOTAS |
[1]
Ivar Ekeland. 1984. Le Calcul, l'Imprevú
– les figures du temps de
Kepler à Thom. Éditions du Seuil. Paris.
[2]
http://www.triplov.com/casquilho/2008/Causticas-de-luz/index.html
[3]
http://en.wikipedia.org/wiki/Lyapunov_function
[4]
372.5 singularities] Peirce
defines singularity in geometry as (CD 5648): (. . .) An ordinary
singularity is one of a set of singularities of which all others are
modifications or compounds. Thus, an actual node upon a skew curve is a
modification of an apparent node, and ought not to be reckoned as an
ordinary singularity. But cusps and inflections, as stationary points
and tangents, are ordinary singularities. A higher singularity is one
which differs indefinitely little from an aggregation of ordinary
singularities.
[5] Alexander Woodcock e Monte Davis.
1984. Théorie des
catastrophes. Editions l'Age d' Homme, Lausanne
[6]
René Thom (s/ data). Morphogenèse et Imaginaire.
Circé 8-9 Cahiers de
Recherche sur l' Imaginaire. Pp : 7-24
[7] Jean Petitot-Cocorda. 1992.
Physique du Sens – De la
théorie des singularités aux structures
sémio-narratives.
CNRS, Paris
[8]
Petitot. 1985. Local/global in
Enciclopédia Einaudi: vol 4,
Local/global
[9]
René Thom. 1980. Modèles Mathématiques de
la Morphogenèse. Christian Bourguois Ed., Paris
[10] 373.2
cusp]
A cusp is defined by Peirce as (CD 1412): "a
stationary point on a curve where a point describing the curve has its
motion precisely reversed" (p. 1412).
[11] cf. Elizabeth Walter-Bense. 2000.
Teoria Geral dos Signos.
Editora Perspectiva, São Paulo
[12] Jean Petitot. 1983. Théorie
des catastrophes et structures sémio-narratives in Sémiotique et
théorie des catastrophes. Actes
Semiotiques, V, 47-48
[13]
Jean Petitot-Cocorda. 1992. Physique du
Sens – De la théorie des singularités aux structures
sémio-narratives.
CNRS, Paris
[14] Alan Turing. 1952. 'The chemical
basis of morphogenesis' from Philosophical Transactions of the Royal
Society of London, Series B, No.641, Vol. 237.
[15] G Nicolis. 1995.
Introduction to nonlinear
science. Cambridge University Press
[16] Affonso G Gomes e Maria Cristina Varriale. 2001.
Modelagem de
Ecossistemas: uma introdução. Editora da Universidade Federal de
Santa Maria, Santa Maria
[17] Ricard V Solé e Jordi Bascompte.
2006.
Self-Organization in Complex Ecosystems. Monographs in Population
Biology 42, Princeton University Press
[18]
http://www.triplov.com/creatio/casquilho.html
[19]
http://www.triplov.com/boff/2009/suicidario.htm |
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José
Casquilho. Centro de Ecologia Aplicada Baeta Neves (CEABN/UTL),
Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens
josecasquilho@gmail.com (CECL/UNL).
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