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ALEXANDRA ESCUDEIRO, funcionária superior da Universidade de Lisboa, tem a felicidade de trabalhar num dos lugares mais românticos de Portugal, romântico em todas as acepções do termo - o Jardim Botânico de Lisboa. Nossa colega e amiga, concedeu-nos o exclusivo de uma visita guiada em demanda das espécies do tempo dos dinossauros. Infelizmente, é difícil fotografar árvores, e para efeitos de identificação, mesmo as melhores fotos careceriam de valor científico, por uma razão explicitada no decurso da conversa - a classificação, em Botânica, não se faz a partir do aspecto geral das árvores nem das folhas, por muito que estas sejam tão características como as da Ficus religiosa. Noutra ocasião daremos melhor notícia deste espaço lindíssimo, inteiramente obra do homem, que nada deixou ao acaso da selecção natural. Em anexo forneceremos textos com a biografia do jardim. |
PALEO-ESPÉCIES DO JARDIM BOTÂNICO DE LISBOA
VISITA GUIADA POR ALEXANDRA ESCUDEIRO
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Paleo-espécies: em cima, cavalinhas à beira de um regato; em baixo, uma cica. |
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O traçado romântico pretende imitar os acasos do natural, ao contrário do jardim clássico, de traçado geométrico. |
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TRIPLOV - Alexandra, é por uma questão de bom senso que se diz terem aparecido plantas primeiro, na Terra, e só depois os animais, pois sem elas não teriam de que se alimentar, ou há alguma prova científica de que tal tenha acontecido realmente, tal como de resto conta a Bíblia?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Sei lá como foi! - é difícil estabelecer precedências nas profundezas do Pré-Câmbrico. Os organismos eram simples, na sua maioria nem plantas, nem animais. O peso do tempo, isto é, das camadas geológicas, deixa-nos poucos sinais para decifrar. Mas sabemos que nas águas mornas daqueles tempos coexistiram algas e invertebrados, ainda sem esqueleto. Mas, sendo os animais consumidores, a sua existência tem de estar condicionada aos produtores primários, que poderiam ser, por exemplo, bactérias.
TRIPLOV - Que espécies existem no Jardim Botânico de Lisboa contemporâneas dos dinossauros?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Temos colecções notáveis de cicas e de araucárias. Temos pinheiros, cedros, teixos, sequoias, um cipreste dos pântanos, loureiros, magnólias, cavalinhas, etc.. O mapa do Jardim, com a descrição de algumas destas espécies, encontra-se em http://www.jb.ul.pt
TRIPLOV - Se estas plantas são contemporâneas dos dinossauros, quer dizer que chegaram até à actualidade sem terem sofrido variações devidas à evolução. Achas que essas espécies pertencem a algum clube anti-darwinista ou há explicação científica para o fenómeno?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - As plantas que sobrevivem durante milhões de anos, mantendo-se sem terem evoluído, têm que ser capazes de se adaptar a diferentes condições ambientais; ser resistentes a ataques por outros organismos que os comam, os parasitem ou lhes causem doenças; têm que ser geneticamente estáveis; e têm de ser competitivas relativamente às outras plantas. A Ginkgo ilustra estes atributos, foi a única árvore que, em Nagasaki, sobreviveu à bomba atómica, e brotou na Primavera seguinte. É cultivada pelos seus atributos estéticos, de resistência à poluição, medicinais e sagrados.
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TRIPLOV - A Ginkgo biloba é considerada uma relíquia. Explica-nos o que isso é e diz se todas as espécies vegetais contemporâneas dos dinossauros ou anteriores a eles são relíquias.
ALEXANDRA ESCUDEIRO - A Ginkgo biloba é uma relíquia por ser um “resto de glórias passadas”: As Ginkgo cobriram toda a Terra no Triásico e no Jurássico. Hoje toda a família das Ginkgoaceas e plantas afins encontra-se extinta, exceptuando a Ginkgo biloba, única espécie sobrevivente. Não se sabe se cresce na natureza em algum lugar. É cultivada como árvore sagrada junto aos templos xintoistas aos pares, uma masculina e uma feminina (são dióicas) para simbolizar o Yin e o Yang. Cultivam-se hoje como árvores ornamentais em jardins citadinos e avenidas, por aguentarem bem a poluição.
Outras relíquias, em sentido geral, são as cicadáceas e as afins stangeriáceas e zamiáceas. Também tiveram uma área de distribuição global, mas hoje as suas áreas naturais restringem-se ao Sul de África e à América Central. São valiosas plantas ornamentais, cultivadas em jardins. Há ainda outras espécies como os pinheiros, as sequoias, os loureiros e as magnólias que não considero relíquias em sentido biológico, por pertencerem a famílias com várias espécies, que ocorrem em diversos continentes. Nem consideraria, por exemplo, as araucárias como relíquias, mesmo sendo uma família tão diferente de todas as outras; apesar de haver fósseis de araucariáceas que remontam ao Triásico, nos dois hemisférios e a distribuição geográfica actual ser apenas no hemisfério Sul (excepto em África); no entanto esta família ainda tem dois géneros e dezenas de espécies. Para mim, uma relíquia é rara, muito preciosa ou sagrada.
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As plantas identificam-se pelas flores, não pelas chapas...
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TRIPLOV - Os animais identificam-se como pertencendo a esta ou àquela espécie por um sem número de caracteres, entre os quais o sexo, tanto quanto sei, não tem grande importância, a menos que sirva para tirar dúvidas, porque às vezes os naturalistas só têm um exemplar, não conhecem a população, e vai daí, toca de classificar fêmeas e machos como duas espécies distintas. Já no caso das plantas, os órgãos genitais foram o centro do sistema de Lineu... Nem Freud teria sido tão atraído para eles, até parece mal...
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Lineu estabeleceu um critério excelente e que ainda hoje serve para classificar as plantas: o número, a posição relativa e a forma das várias estruturas do sistema reprodutor. Isto não tem nada de mal. Pelo contrário, há órgãos genitais de tanta beleza que muitos se servem deles para enfeitar igrejas e andores de santos. E é sabido que só uma mente perversa consideraria escabroso oferecer um ramo de flores à amada...
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À esquerda, deve ser um teixo, uma paleo_espécie. A da direita não é paleo- mas é bíblica : um sicômoro. |
TRIPLOV - Se bem que nem todas as plantas sejam exibicionistas, nem todas andem para aí a mostrar o que nós tapamos. Os musgos, por exemplo, terão partes fracas?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Queres tu perguntar se têm reprodução sexuada? Sim, senhora. Não se chamam "partes fracas" e até são húmidas os musgos precisam de água para se fecundarem. Nos arquegónios, órgãos sexuais femininos, diferenciam-se os óvulos, e nos anterídios, masculinos, desenvolvem-se as células espermáticas. É só na ponta que isso se percebe, e só ao microscópio...
TRIPLOV - Ponta, foi o que disseste? Nos musgos?!
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Claro, até os musgos têm ponta...
TRIPLOV - No tempo dos dinossauros, achas tu que predominavam as plantas exibicionistas ou as recatadas? Terão aparecido ao mesmo tempo ou em diferentes períodos geológicos?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - As primeiras flores apareceram no fim da era dos dinossáurios. Nessa altura, dominavam as gimnospérmicas, numa Terra revestida de coníferas, de ginkgos, de cicas, de fetos com e sem sementes, de musgos e de umas progimnospérmicas, hoje extintas, tal como extintos estão os fetos com sementes... As coníferas, como os pinheiros, os cedros, enfim, tudo o que dá pinhas, eram o último grito da evolução!
TRIPLOV - Evoé!
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Eram o máximo!...
TRIPLOV - És capaz de me dar uma cábula a ver se de uma vez por todas aprendo a distinguir as cicas das palmeiras?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Com a tua licença, aqui vai uma cábula de genitalia: se vires estróbilos masculinos e femininos desenvolvendo-se no ápice de plantas diferentes, isso é uma cica.
TRIPLOV - Essa da genitalia, francamente! Achas-me com cara de quem gosta de espreitar os órgãos genitais alheios?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - Não pediste uma cábula? Então... O estróbilo é uma forma de pinha constituída por estames (estróbilo masculino) ou óvulos (estróbilo feminino) com escamas ou plumas protectoras. Se vires flores em cachos na axila das folhas, isso são palmeiras. Também se distinguem pelo desenvolvimento das folhas: as folhas das cicas nascem enroladas em espiral como as dos fetos.
TRIPLOV - Sim, sim, quando tiver dúvidas, trepo a uma palmeira, e procuro a genitalia... Para rematarmos em beleza, vamos fotografar os dragoeiros. No séc. XVIII, Vandelli foi acusado de ter introduzido em Lisboa uma epidemia de dragoeiros... Dracaena draco era como se chamavam. Seria por serem do tempo dos dragões, que por exemplo o Prof. Galopim de Carvalho identifica com os dinossauros?
ALEXANDRA ESCUDEIRO - O dragoeiro não será do tempo dos dragões, mas “Dracaena” é a mulher do dragão ou talvez a mãe do dragão. A seiva é sangue de drago, e o fruto, olho de dragão...
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PORTUGAL
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