Por natureza
entendemos o conjunto dos seres orgânicos e inorgânicos, os campos
energéticos e morfogenéticos que existem como sub-sistemas de outros
sistemas maiores, sejam ou não afetados pela intervenção humana,
constituindo um todo orgânico, com um equilíbrio dinâmico. O ser humano
é parte da natureza e co-pilota o processo de evolução junto com as
forças diretivas da Terra.
A natureza é uma realidade tão complexa que não pode ser encerrada em
nenhuma definição. Ela permanece um mistério, como mistério é o ser e o
nada. O que possuimos são discursos culturais sobre a natureza: das
culturas ancestrais, das modernas e das várias ciências. Em nome de cada
compreensão, decide-se qual é o nosso lugar nela e que tipo de
intervenção é adequada ou não.
Quando contemplamos a natureza salta logo aos olhos uma medida imanente
a ela que resulta não das partes tomadas isoladamente, mas do todo
orgânico e vivo. Há harmonia e equilíbrio. Ela não é biocentrada como se
a vida fosse tudo, mas no equilíbrio dinâmico entre vida e morte.
Para os contemporâneos a natureza resulta de um imenso processo de
evolução que vai além do modelo de Charles Darwin (1809-1882) que
fundamentalmente a restringia à biosfera sem incluir o cosmos. Tudo
começou com o big bang num processo não linear que conhece
saltos, flutuações e bifurcações. Não só se expande mas cria e organiza
possibilidades novas. Significa que as leis naturais não possuem caráter
determinístico mas probabilístico.
Os conhecimentos da termodinânica nos sinalizam que a vida e qualquer
novidade no universo surge a partir de certa ruptura do equilíbrio. Essa
quebra da medida é só um momento, pois provoca em seguida a
auto-organização que cria um novo equilíbrio dinâmico. É dinâmico porque
continuamente se refaz, não pela reprodução do equilíbrio anterior, mas
pela criação de um novo. A lógica da natureza em evolução é esta:
organização-desorganização-interação-nova organização. E assim
suscessivamente.
Isso não significa que a natureza não possua uma medida (leis da
natureza); o que ela não possui, é uma medida estática e mecânica, mas
dinâmica e flutuante, caracterizada por constâncias e variações. Há
fases de ruptura para logo em seguida gestar nova regularidade. O clima
da Terra por exemplo, bilhões de anos atrás, passou por turbulências e
terríveis devastações. A Terra já foi quase duas vezes mais quente que
hoje, mas apesar disso, mostrou ao longo das eras um incrível
equilíbrio dinâmico que tem favorecido benevolamente a vida em sua
diversidade.
A natureza vista como um todo não impõe prescrições. Aponta para
tendências e regularidades que podem ir em várias direções. Cabe ao ser
humano, auscultando a natureza e com fina percepção, escolher uma que
lhe pareça mais adequada. Então ele surge como um ser responsável e
ético.
O ser humano deve seguir a lógica da natureza: fazer e refazer
continuamente o equilíbrio. Não de uma vez por todas, mas sempre em
atenção ao que está ocorrendo no ambiente, na história e nele mesmo. A
justa medida muda, o que não muda, é a permanente busca da justa
medida.
O ser humano capta essa medida multidimensional na proporção de sua
escuta e do dialogo com a natureza. Quanto mais mergulha nela e respeita
seus ritmos, mais sente quando deve mudar e quando deve conservar.
Os povos indígenas nos dão disso o melhor exemplo. Por uma afinidade
profunda com a natureza, os solos, as nuvens, os ventos e outros eventos
naturais sabem, de golpe, o que vai acontecer e o que fazer. A natureza
fala com eles e por eles porque ambos formam um todo só.
Investigações recentes mostraram que as pessoas não mudam por causa de
informações sobre o aquecimento global mas quando sofrem na pele com a
degradação ambiental. Isso comprova que o motor que move as pessoas é
menos o inteleto que o sentimento profundo, raiz do novo paradigma de
convivência com a Terra. Sem esse sentimento não ouviremos a grande voz
da Terra a nos convidar para sinergia, a compaixão, a co-existência
pacífica com todos os seres. A partir desse pathos se
torna absurdo querer subordinar o novo conhecimento genético à obtenção
de lucros, como se a vida não valesse por si mesma, sem ser reduzida a
uma simples mercadoria no balcão de negócios.
Se esta sintonia fina com a natureza em nós e também ao nosso redor não
se transformar numa cultura, então estaremos sempre às voltas com a
busca da justa medida a ser encontrada e aplicada. Viveremos
reconciliados conosco mesmo e com a natureza. Eis um caminho a seguir. |