Desde os seus primórdios
no final dos anos 60 do século passado, este tipo de teologia nasceu no
esforço de articular o discurso da fé com o discurso da sociedade na
perspectiva dos oprimidos. Sua marca registrada foi e continua sendo
“opção pelos pobres contra a pobreza”. A perspectiva era e é global, de
sorte que já nos anos 70 se organizaram os primeiros Fórums Mundiais da
Teologia da Libertação, em Chicago, no México e no Brasil e continuaram
até que a cegueira de setores poderosos do Vaticano os tivessem
proibido. Como são por natureza ecumênicos, tais fórums continuaram a
acontecer regionalmente.
Com o surgimento dos Fórums Sociais Mundiais a partir de 2001
encontrou-se o espaço público para a continuação destes encontros
globais, primeiro em Porto Alegre em 2005, o segundo em Nairobi no
Quênia em 2007 e agora em 2009 em Belém.
Perfilou-se melhor o estilo da reflexão. Ao invés de se falar
simplesmente de teologia da libertação e assim ressuscitar as discussões
do passado, preferiu-se falar em teologia e libertação. O sentido é
confrontar a fé refletida e critica (teologia) com os temas da opressão
que possuem os mais diversificados rostos desde as crianças consumidas
como carvão na máquina produtivista até os massacres como os de Gaza. O
discurso não é intraeclesiástico e em favor ou contra as Igrejas mas
público, voltado para a sociedade mundial. A questão central nao é
discutir o futuro do cristianismo, mas que contribuição este pode dar
para os verdadeiros problemas humanos que são a perpetuação da paixão
dos pobres, o aquecimento global e suas eventuais conseqüências
perversas.
O cristianianismo não pode ser um superego castrador de temas
importantes da agenda mundial, mas deve ser uma fonte de inspiração e de
ousadia para questionar o paradigma cvilizatório dominante que faz de
todos, ricos e pobres, oprimidos, afogados no consumismo de bens
materiais, sem sentido de solidariedade e de cuidado para com o
patrimônio comum que é o planeta Terra. Mas principalmente pode
mostrar-se fecundo no compromisso, junto com os movimentos sociais – os
verdadeiros novos atores - no combate ao sistema do capital produtor de
grandes injustiças, na luta pela terra, negada às grandes maiorias e na
busca de alternativas de produção e de vida. Não é sem razão que é
unicamente esse tipo de cristianismo que possui mártires como a Irmã
Doroty, o Padre Josimo e tantos outros da América Latina. Das
burocracias eclesiásticas nunca saem místicos, santos e mártires mas
apenas medíocres reprodutores do stablisment religioso.
Em todos estes Fórums de Teologia e Libertação compareceram mais de mil
pessoas vindas de todos os Continentes, também da Europa e dos USA, o
que mostra a vitalidade deste tipo de pensamento. As autoridades
doutrinárias do Vaticano estão iludidas quando imaginam que com sua
disciplina liquidaram a Teologia da Libertação. Ela nasce do grito da
Terra e dos pobres. Enquanto estes continuarem a gritar, há todas as
razões de se atuar de forma libertadora e elaborar a partir daí uma
teologia. De certa forma, suas intuições se tornaram patrimônio comum
do cristianismo contemporâneo, salvando-o do cinismo.
O tema deste ano em Belém foi “Água, Terra e Ecologia para um outro
mundo possível”. Partiu-se da conjunção das várias crises, todas elas
ligadas à falta de sustentabilidade do sistema-Terra. O tema da ecologia
se impunha. Não como técnica de gerenciamento de recursos escassos mas
como novo paradigma de relação para com a Terra, não como mero meio de
produção mas como um ser vivo, gerador de toda a vida. Como disse um
discípulo de E.Morin, Patrick Viveret, biólogo e economista, em sua
palestra: importa fazer “um bom uso do fim de um mundo”. Agora se abre
espaço para um outro mundo não só possível mas necessário. O
cristianismo é chamado a trazer a sua contribuição a partir de seu
capital de respeito e de cuidado. |