Aspecto moral inegociável

 

NICOLAU SAIÃO


…caros confrades & amigos/as.
 
 Neste dia aqui cheio de sol, do sol que ainda podemos gozar, proponho-vos uma ligeira reflexão no momento em que o mundo vive uma das piores crises dos últimos anos.
 
  Quero falar-vos no aspecto moral inegociável que o actual momento comporta e que pode ser evocado, por exemplo, pelo debate havido anteontem na CNN Portugal em que estiveram presentes Sérgio Souza Pinto, António Filipe e Sebastião Bugalho.
 
   Souza Pinto, mediante um discurso sereno e bem articulado, frontal e honesto, colocou sobre a mesa os dados da questão: dum lado a posição das sociedades abertas, onde se procura emendar e melhorar a existência civil das populações, nomeadamente através da necessária liberdade de expressão pela qual as críticas, mesmo acerbas, se exercem, em vista do bem comum. Do outro, regimes onde a verdade possível é a verdade das cliques que nelas exercem o seu poder absoluto, onde a liberdade de expressão está condicionada, onde os direitos humanos são o que os mandantes deliberam – ou seja, a sua negação – o que através dos tempos a História documenta pelo saldo de milhões de mortos que exerceu essa pretensa criação do “homem novo”.
 
  E acrescentou então uma pergunta: qual pois a autoridade moral do PCP, que Filipe ali representava, para através de capciosas explicações, de argumentações que não são mais que a expressão da sua ideologia totalitária, justificar a presente acção do autocrata Putin?
 
   Perante estas palavras percucientes, baseadas em realidades inegáveis, qual a reacção de António Filipe? António Filipe, que alguns têm tentado apresentar como uma das caras “suaves” do PCP e cuja expressão corporal é de facto melíflua, insinuante, mansa (aquilo a que o povo, na sua saborosa linguagem vernácula, caracteriza como um “mija mansinho”) reagiu como reagem  os que não suportam que os coloquem perante razões frontais indesmentíveis: chamou-lhe mentiroso e ameaçou abandonar o debate, chegando mesmo a recolher caneta e papéis e demais aprestos.
 
   Nos países onde dominaram, e ainda dominam, o que caberia a Souza Pinto seria, como depreendem, bem pior.
 
   E eis o meu ponto, quando me referi ao aspecto moral inegociável: o sector que o PCP e seus asseclas representa entre nós, tem durante anos e anos, mediante o poder que conseguira ter na sociedade (e que agora democraticamente lhe está a fugir) manipulado a realidade dos factos e o verdadeiro sentido da sua acção, que incessantemente busca justificar com a  militância feita contra o salazarismo. Ora, a prova dos tempos mostra – e isso ficou bem demonstrado no chamado PREC – que se assim sucedia o que eles visavam era instaurar em sequência uma ditadura ainda mais pesada, a exemplo das que exerceram nos países de Leste e em todos os outros onde estacionaram.
 
  E não podemos ignorar que, sim, muitos homens e mulheres, sob a égide comunista (ou assim chamada) se bateram nobremente contra o antigo regime que vigorou em Portugal até ao golpe do 25 de Abril. Tal como, na Revolução de Outubro, aconteceu. Mas veja-se como foram atraiçoados pelos que deles se serviram, o que culminou, dezenas de anos mais tarde, com o colapso dum regime e duma concepção de vida que afinal se provou ser só simulacro.
 
  E é isso, finalmente, que hoje está em jogo na Ucrânia. Jogam-se ali duas concepções políticas vitais: a Democracia, com todos os defeitos que tenha – mas que a liberdade permite contestar e emendar – e a Ditadura justificada com argumentos capciosos e pretensamente de equidistância, mas que afinal deixam entrever a face nauseabunda da violência, da repressão e finalmente da guerra. Que agora Putin, na sua paranoia, já ameaça poder ser nuclear!
 
   A Ucrânia, melhor ou pior, bate-se hoje por todos nós.
 
  O abraço de boa saúde e estima, do vosso
 
   ns