António Salvado

 

PAULO JORGE BRITO E ABREU
ANTÓNIO SALVADO: DA POESIA, OU TEURGIA, COMO A TAUMATURGIA


«O homem é um actor de Deus no palco do Universo.»
Jacob Levy Moreno

 

LIMIAR

Em crítica acribia, bem recta e escorreita, aqui eu faço a pergunta por a Palavra, liberal, de António Salvado. Interroguemos, na jorna, a Esfinge e o fingimento de António Salvado. Pois com Palavras se faz a nossa habitação. A Língua, segundo Heidegger, é a Casa do Ser; colega ou legente, a Língua religa – e as Letras, cá em baixo, elas reflectem, ou repetem, as Estrelas, no Céu. Quero eu dizer: labora, o António, com as «fôrmas», ou formas, do Espírito Absoluto… Pois Apóstolo, espiritual ou Epopta, nós assim acarinhamos o António Salvado – e é dele a ciência dos tópicos e tropos. Ou melhor: dos Arquétipos, arcaicos e tipos Arcanos. E da Música, o Museu e o Templo das Musas. Do arquivista, Arquitecto, da Arqueologia do Ser. Pois postado aqui à porta, e entre os deuses e os homens, socorremo-nos, agora, socorremo-nos, no lustre, do Heidegger ilustre: para o germano, desse modo, o pensador diz o Ser – e o Poeta, dessarte, ele nomeia o sagrado. Saboreamos, desse modo, o António Salvado – e nós sabemos, nós outros, que o divo Artista é artilheiro. Ele é soldado, curial, no Exército do Verbo. E sem rebuço, e sem disfarce, ele publicou, organizou, publicitou, «Anunciação e Natal na Poesia Portuguesa» ( 1968 ), «A Paixão de Cristo na Poesia Portuguesa» ( 1969 ), e, ademais, «A Virgem Maria na Poesia Portuguesa» ( 1970 ). Quero eu dizer: muito mais que em qualquer outro, aqui se propala, aqui se propaga, uma Ontologia, ou Teologia, dos poéticos valores. Pois forte e fértil, em firme Firmamento, Isidoro de Sevilha o assertava dessarte: na Antiguidade Clássica, os «teólogos» são Poetas, apologetas, dos valores religiosos da cidade, os que defendem, providentes, o panteão do seu povo. Sempre, sempre entre a porta e o porto – e recebendo, dos deuses, pra doarem aos homens – e assim o Vate é Vaticano, assim se aprende, e compreende, «A Flor e a Noite».

E dissertamos, sem dolo: a Lusitânia, em Salvado, é uma citânia de Luz. Devolvendo, à parábola, o papel que ela ocupava entre os povos antigos: e aqui eu falo, outrossim, da hierofania, da alegria fantástica das alegorias. Se a linguagem deste Poeta é qual Ágora, agora, o grego dos Setenta traduz «sonho» por «extasis» – e equipara-se, o sono profundo, a um estado místico factual, e portanto fundamental. Queremos dizer: a Poesia, pra Salvado, é profissão de Fé. Ou diríamos, em vez disso, um solene Sacerdócio? A Poesia, no Arcano, a Magia ou Teologia, uma «ekstática» insistência na Verdade do Ser. E em firme Firmamento, é tempo de afirmar: se o sonho, dessarte, é uma pequena loucura, a loucura, no Espírito, é um grado e grande sonho. Ou melhor: se o sonho é, para o indivíduo, um Mito particular, o Mito, oblativo e colectivo, o Mito não é mais do que o sonho dum povo. Ou em parábolas primeiras do nosso Poeta: a Poesia, afinal, é uma «Difícil, estreita passagem, / força quente perscrutada / corpo de névoa, de imagem / com sulcos de tatuagem, / voz absoluta escutada». Esse, desta sorte, o hermetismo. Minha quermesse, ou hermenêutica: como em Somerset Maugham, a Poesia é uma difícil, estreita passagem por «o fio da navalha». E esquadrinhando a quente força, que se vela em «Bateleur», o corpo é de névoa, de bruma ou de imagem – mas os fantasmas são mais fortes, e mais pesados do que as pedras. E a tatuagem, teurgia, significa o tutear, tipifica o tutelar, e é «persona» exibida por um certo inconsciente para lograr, ou iludir, a sanção do Super-Ego. Matricial e maternal, matéria de coturno, matéria de coturno e não e nanja de soco. E o que é, afinal, a vez escutada, a verve absoluta, senão a voz, lilial, do Espírito Santo??? O pensamento, aqui, é movimento – e como é facto, e como é feito, o Eu, de Salvado, ele move o não-Eu, por meio da faculdade imaginativa – e o «mensonge», e a mentira, ela é verdade, matricial, de uma grande mascarada. Aqui se trata, portanto, do fetiche e fantoche, da feeria, ou fantasma, de António Salvado. Sabendo, como Aristóteles, sabendo, malabar, que a Poesia, afinal, é mágica lanterna, que «em todos os seres da Natureza existe um pouco de maravilha». Ou na voz, vitoriosa, do nosso Poeta: «Cedo as luzes extintas / das casas da cidade / e o transeunte sozinho / nas pedras da calçada // A perene presença / de qualquer voz serena / que a cada instante surge / vivificando os dias // e a derramar em tudo / harpejos de alegria», e eis o esperto, e a esperança, do Espírito Paracleto.

O Estilo, entanto, é o homem. Seguindo e segundo o Peripatético, o homem, de hombridade, é animal racional, ele é Alma, portanto, provida de «Logos». Na razão, por isso, animada, Salvado é movido por o Entusiasmo, é eduzido, conduzido, e suflado por o divino – e estamos próximo, aqui, do teurgo e do teatro, do êxtase e do sonho em «terra sigillata». A terra na qual ele é rapsodo e jogral. Se esse jogo, do jogral, é contra o jugo, eu considero, o Salvado, como o ledo «Homo Ludens». O praticante, oficiante, da simbólica função. Irmanada, alfim, a Ludoterapia, à leiva e à liga da Logoterapia. Ou professando aqui a «schola» como o recreio, o lazer e o princípio do prazer. É que Ensino Superior é ensino soberano – e não era, Museu, discípulo de Orfeu??? Que através das signas ensina o Salvado. Ou no escólio joanino, sereis, veramente, discípulos do Cristo, conhecereis a Verdade – e a Verdade, alfim, vos libertará. Ou em livros libertos: plasmados por o Verbo, a caminho do Pai, no escol e na escola de Santa Maria. Memorando, por isso, a adiafa, celebremos, o Ágape, em Ágora, agora. Como diz, e aduz, o nosso Profeta, «Maravilhas ocultas / no vadiar do tempo / o silêncio um murmúrio / uma brisa ou o vento // o broto renascido / a flor anunciada / uma folha caída / da sossegada árvore // O céu azul aberto / às aves que o percorrem / quando uma nuvem erra / subitamente informe», e eis o germe, e a lição, da ginástica visão.

Realço e alço, em António Forte Salvado, a infância sempiterna e uma d’Alma nobreza. É que faz, o Poeta, a sua menagem, à «flor anunciada» e ao «broto renascido». Não só, aqui, a lavra já feita, mas a cultura, por fazer, da Língua Portuguesa. Aqui eu trago, à colação, Aniel Iannini, professor e professo da Universidade de Milão: é que «a poesia verdadeira é sempre novíssima», é de espanto a admiração, e o Poeta está sempre em idade escolar. Porque foi, dessarte, o mirar, porque foi a admiração, que os homens levou à Filosofia. Em hermenêutica breve, e por isso muito leve: anela, a criança, a fidelidade – e apela, o adulto, ao adultério, apelam, seniores, ao esquecimento do Ser. Depois de treze lustros, está, no recreio, António Salvado, e continua, o Profeta, em estado de Graça… Angélica, evangélica Palavra: se não formos como os meninos, não entraremos, rectos e escorreitos, em Reino do Céu. Que é da criança a criação, é do jogral o estádio, ou estágio, mágico-simbólico; assim o crismou, no jogo, o Jean Piaget. Acataremos, dessarte, e aceitaremos, na Sorte: em anagrama, ou hinário, o grimório é do Hermes, o irónico é onírico. Quer dizer: os Mistérios de Orfeu bem acoplados, ou ligados, aos Mistérios do Egipto. Sempre e sempre e sempre associados ao Apolo, à «poiesis», à língua dos deuses. Pelotiqueiro é pois Mercúrio, filho de Zeus e de Maia, ele medeia, ou faz a ponte, entre o Céu e a terra. O que é, entretanto, a Kabbalah fonética??? Redargue, rapsodo, António Salvado: é «O céu azul aberto / às aves que o percorrem». Sapiente, ou sabedor, da sápida ciência, da «indissolubilidade de som e sentido» identificada, por Valéry, no estro da Musa. Que me seja permitida uma autocitação: «Se a mulher é pois morada, e a casa do homem, a Eclésia é qual a casa, e a causa de Deus.» Ou estoutra, outrossim: «O génio, dessarte, é aquele que gera, independentemente dos órgãos e dos genes que a Madre Natureza destinou à geração»: é que a Palas, ou Minerva, foi nada e nativa do crânio de Zeus. Pois qual a purga, e a sangria, a Palavra é pois alento, medicamento, e alimento preste. E aqui eis, na verve, os Estudos Gerais, e aqui se compreende o papel de Salvado como o guia, dessarte, ou Educador. Ou melhor: no corpo místico de António, o seduzir é induzir e logo, logo o conduzir, é eduzir, o crianço, pra fora da lura e por isso do Leteu, pra fora, dessarte, do ramerraneiro. Por isso António é de Eleutério, por isso induz, o seu ledor, às Artes Liberais. Quereis, portanto, acabar com as prisões??? Construam, no carme, construam as Escolas, e nelas doutrinando, os doutores e varonis como António Salvado.

Salvado, afinal, Amigo do ABC – e, por isso mesmo, do refusado, rebaixado e «abaissé». Catedrático, lilial, em Liberdade, ou liberalidade, Salvado publicou, organizou, publicitou, Autores e Actores como José Régio, Afonso Duarte, Carlos de Oliveira, Branquinho da Fonseca, Jorge de Sena, Fernanda Botelho, David Mourão-Ferreira, Fernando Echevarria, João Rui de Sousa e Teixeira de Pascoaes. Fez a menagem, no seu tempo, a Mário Cesariny, Fernando Pessoa e António Maria Lisboa. E salvou, do olvido, o Ângelo de Lima, o ( ev )angélico qual o Anjo de William Blake. Ou como quem diz: voam juntas, e felizes, as aves, liliais, da mesma plumagem. E no grande Café Gelo, e nas «Folhas de Poesia», comensal, no convívio, foi António Salvado dos nomes e dos Numes: e aditamos, na cita, Herberto Helder, José Carlos González, José Sebag, o António José Forte, Luiz Pacheco, dessarte, e Raul de Carvalho. Fastas «Folhas de Poesia» de que se publicaram, quatro números, entre 1957 e 1959. Pois  mais e muito mais que o Liceu Aristotélico, funcionou, pra Salvado, o Café Gelo, como o livro e a lavra, Universidade Livre. Ensino Superior ou Ensino soberano??? O signo, de feito, libertário. Sempre em busca da meta, da metáfora, da mental Poesia preste. E ensinando, ao mundo culto, a volição de Kierkegaard: o que faz falta, à nossa época, não é a reflexão, mas sim a paixão; ela é consóror do patético, passional, e também da simpatia. Que o mesmo, agora, é dizer: no cenáculo, ou Psicodrama, é lídimo o ledor, e encena Salvado as suas imagens. À frente do espelho, do espécime e espectacular. Na «Katharsis» de Aristóteles, isto é, nas Catarses do Sigmund Freud, de Josef Breuer, de Jacob Levy Moreno e, jornadeando, do Pierre Janet. Este último um artífice, artesão, da Psiquiatria dinâmica. Avocamos, por isso, a Bertha Pappenheim, e por isso praticamos uma ab-reacção. Por isso falámos, mais atrás, da Ludoterapia, sempre aliada, ou ligada, ao jocoso, ao jogral e à Logoterapia. Remembramos, no lance, Max Scheler: a emoção, da Simpatia, é qual metáfora e Amor duma Ontologia. Ou seja, da ciência, luminar, do Ser enquanto Ser, ciência arcaica, e arcana, dos princípios primeiros. Como assinala, certeiro, J. Cardoso Duarte, o Eu «ex-siste» no «outro, mostra o outro em mim e me mostra no outro»: na «enérgeia», ou sinergia, continuamos a falar do generoso Café Gelo. Se o nosso António, aqui, é inteligente, ele é que lê, no artefacto, e no arteiro interior – e a Artemísia, ou artimanha, é feita com Arte. Como engenho, como «ingenium», e generativa. E é altura, agora mesmo, é tempo de indagar: o Artista imita a vida, ou a vida imita a Arte??? Seja como for, as palavras são naus, e a «Mimesis» aqui surde aliada à «Mathesis» – e esse o escopo, e a escola, de António Salvado. Em nossa reza, portanto, e razoar, ouçamos o que diz, o Autor, em «Cicatriz»: apresentando, presenteando, e aprimorando a «Amizade», «Uma criança muito suja atira pedras a um cão. O cão não foge. Esquiva-se e vem até junto da criança para lhe lamber o rosto. Há, depois, um abraço apertado, de compreensão e de amizade. E lado a lado», meu Deus, «lá vão pela rua estreita, em direcção ao Sol».

E muita Paz, e muito Bem. Aluz, na lembrança, o filosofema: «Quanto mais conheço os homens, mais gosto do meu cão». Este poema revela, na «alêtheia», o Amor e a amizade por o senciente, o sensitivo e todo o ser vivo – e bastaria o teor, o comento franciscano, pra aquilatar, Salvado, como o divo cristiano. Aquele que faz, por isso mesmo, a templação da Teoria, contemplação, alcandorada, da Bondade, da Beleza e da Verdade.

Que o pensar, por isso mesmo, é pôr o penso, é pesar as palavras na balança de Témis; por isso com-pensa, no Thoth, por isso com-pensa a Palas Atena. Que o comento e a mente de António Salvado é qual a mão que mensura – e o «Manas» é Minerva no Génio verdadeiro. Se o Poeta significa, e ele dignifica a Catarse, o expressar é pois prensar, o exprimir é espremer o pus e o fel da ferida narcísica. O Profeta, dessarte, é aquele que profere, é aquele que professa, Professor, a ex-centricidade do Ser. E já o dissemos: o intelecto que lê, o intelecto que aluz no arteiro interior……………….


NO CORAÇÃO DO SANTUÁRIO

Altíssima Metafísica, a Ontologia, por isso, é irmã da Teologia. E aduz José Marinho: «Filosofia. Ensino ou Iniciação?» E o mesmo indicaremos, o mesmo indagaremos, nós outros, da Poesia, ou Teurgia, de António Salvado. Pois quer a Poesia, quer a Teologia, são saberes desinteressados, e a Filosofia, para Aristóteles, é a mais universal, desinteressada e gratuita de todas as ciências – e Metafísica é da meta, e Metafísica é por isso Filosofia primeira. «Com a filosofia», aluz Heidegger, «não se pode fazer nada», não se pode fazer nada no sentido utilitário; poder-se-á fazer muito, embora, no sentido teorético, ou especulativo. Se o saber filosófico, se a poética Palavra, é livre em sua essência, só a Filosofia é, segundo o Estagirita, «ciência da verdade» em estrito sentido. E queremos aventar: bem longe e apartado da razão geométrica, na Poesia de Salvado se expecta, esperançoso, o «esprit de finesse». Memoremos, em Minerva, e lembremos Schopenhauer: se  o mundo fenomenal é «Maya» para os hindus, e princípio de razão, se encontra e conta, em António Salvado, o Arquétipo, arcano, e arquivo da Ideia – e não estamos, aqui, e não estamos muito longe do agónico Jung; a «agonia», para os gregos, é «luta nos jogos, combate, exercício em geral», pois é, o argonauta, para o protagonista, e o Reino dos Céus se toma de assalto. Dissertava e acertava o teutónico Hegel: quer a Arte, quer a Religião, quer a Filosofia, são as expressões, ou lugares, do Espírito Absoluto, e queria o Hegel sugerir: na Filosofia, na Religião e na Arte é que vive, o criador, em estado de Graça. E historiemos, nós outros, historiemos a estese: em 1955, se estreava, António, com «A Flor e a Noite» – mas esse verso é criador, é veloz-criacionista, tem a voz e a vez do grande Herberto Helder. Revertamos, agora, um pouco mais atrás: a palavra com que os avitos Romanos traduziram, em Latim, o termo «Theoria», é o deveras «contemplatio». «Theoria id est contemplatio»: assim reza, dessarte, a tradução latina do Peripatético.

E viva, aqui, o «Homo Ludens». Se as palavras são um jogo, se nós falámos, mais atrás, da Ludoterapia, nos aparta e afasta, o «divertissement», do letargo e do Leteu. E «divertir-se» significa, em sentido etimológico, o «distrair a atenção, o desviar-se» do jugo – e é o recreio, a pantomima e a recreação. Como a que teve, o António, no Coro da Academia dos Amadores de Música; o Fernando Lopes Graça, gratuito, o Fernando Lopes Graça o forjava gracioso – e já sabia, Salvado, já sabia, o seu coral, de cor e coração. Diria Santo Agostinho, o Bispo de Hipona: quem canta, cordial, é porque reza duas vezes. E eis aqui a Magia, ou Teurgia, eis a Música, o Museu e o Templo das Musas. Pois divisamos, desta sorte, e avisamos: homem de prol, e de coturno, ele é, de feito, Francisco Tavares Proença Júnior ( 1883 – 1916 ). Que é Teurgo, em Salvado, o grego «dêmiourgós»; se a Teurgia, por isso, é mágico trato, se faz, o Teurgo, uma operação divina, o publicista, ou Demiurgo, é «o que trabalha para o público, artífice, operário manual». Queremos assertar: no arauto e altar, o artista, o artefacto, e por isso o artilheiro – e o paládio, paladino e a Palas Atena. Falta aduzir, e declarar, que o vocábulo «Metafísica» é, na origem, locução adverbial de lugar: onde acabam, entanto, os livros da Física, começam, portanto, os Metafísicos livros. E citemos, nós em broto, Sampaio Bruno: «Quanto aos portugueses, não quiseram saber da Metafísica na filosofia; mas da Metafísica os portugueses quiseram saber na matemática e na poesia». Queremos dizer: no escol e na escola da Sabedoria, o objectivo e o escopo da Poesia teológica será, em Salvado, o Ser enquanto Ser. Mais um poucochinho e aditemos, na cita, o Livro do Êxodo: «Moisés disse a Deus: ‘Eis que eu vou ter com os filhos de Israel e lhes digo: O Deus dos vossos pais enviou-me a vós.’ Eles dir-me-ão: ‘Qual é o nome dele?’ Que lhes direi eu?’ Deus disse a Moisés: ‘Eu sou Aquele que sou.’» Reiteramos, por isso mesmo: se o Vate é Vaticano, um Profeta é, antes do mais, uma «persona», que fala em nome de, que transmite, ou transporta, a Palavra de Deus. Que em portuguesa, e superna, Filosofia, dizer que Literatura é produção do inconsciente é o mesmo que inferir: letradura é expressão do preternatural.

António Forte Salvado, afinal, qual o médium, medical, do Verbo divino. E se as palavras, aflantes, são portadoras de Numes, se a Psicologia, de Salvado, é qual a fala da Alma, ouçamos, caroais e caroáveis, o «Salmo com Gratidão» do nosso albicastrense: «Louvor à claridade inicial, diáfana, levemente colorida, após o desalento amorfo e confuso da noite interminável, louvor à confiança ilimitada, ardente e exaltante, na boa-ventura da sucessão do tempo, mistério que nos traz agora e que para outro mistério nos leva – e que esse ir e vir seja sempre realizado com amor.» Pois este é o «topos» onde vive a Teologia, ou melhor, «onde possa edificar a casa da poesia». Poeta-porto, poeta-porta, poeta-clave, a chave que nos leva à «Flor Álea» de Alumbrado. Não foi, deveras, o António Salvado, quem dirigiu, coordenou e organizou, em 1972, as «Orações dos Primeiros Cristãos»??? Orações do vasto início, quero eu dizer, iniciáticas, laborações e orações em conúbio com o Sol. Se o Simpósio, em Salvado, ele vai haurir, e vai beber, a Dilthey, Unamuno e Ortega y Gasset, ao «more geometrico» ele há-de opor, e propor, a religião vitalista ou vitalista razão. A Poesia, por isso, é existencial, ou melhor, é hermenêutica mundana e do meu estar-no-mundo. E continua, colaço, o nosso Poeta: «Louvor às palavras, admirável criação, que me deixam dizer louvor e, ainda, muitos outros sentidos de ternura.»  Pra acabar, cordato, com chave de ouro: «Grato a Ti, Senhor, por em cada instante me re-ensinares a manter-me sob a Tua luz, com fé maior e com a mais viva esperança.» Pois crer, dessarte, e querer: e eis, aqui, o sagrado, e eis o segredo de António Salvado.

Salvado que é, à imagem, sacral, de Sua Santidade Bento XVI, cooperador, colaborador, na Obra da Verdade – pois ele ora, e labora, no Verbo caroável, na Vinha do Senhor. E tem, o operário, direito à jorna, ao jornal, à apostólica jornada. Por a Palavra é dada ao homem a redentora possibilidade de cooperar, pois, com Deus, no projecto criacionista: se a oração é de acalanto, essa oração é portanto uma Arte das Letras. Que o nosso Poeta difunde, e ele defende, o Salmo e o almo, a Boa Nova nitente. Pois passou, Salvado, por o Carmelo, a «Noite Escura» e obscura de S. João da Cruz. «Ad augusta», por isso, «per angusta», «fortuna favet fatuis» – e só assim entenderemos que António Salvado ocupe, em Salamanca, a Cátedra, Poética, «Fray Luis de Léon». Pois coevo do Camões, e magnânimo Professor na Universidade de Salamanca, Frei Luis de Léon foi qual Poeta e Humanista, o Religioso Agostinho das almas quixotescas. Doutor, dessarte, em Teologia, Mestre em Artes, portanto, e Filosofia, plantou, o professo, a boa Palavra, e encarnou, Salvado, o Frei Luis de Léon. Ou melhor: à força de exercer, na semente, o ministério, acabou, Salvado, por magicar o magistério; sua raiz é portanto o ministério menestrel. Se tratámos, mais atrás, dos tópicos e tropos, aditemos na adiafa: na língua, peninsular, dos novilatinos, apanágio são os tropos do Poeta trovador. E mais, e muito mais do que a comunicação, é «communio», comunhão, o escol e a escola de António Salvado. Quero eu dizer: em vez do senso literal, ou denotativo, se alicerça, o António, em nota, notária, do conotativo. Como quem diz: em vez da marcha militar, divisamos aqui a dança, e a Musa malabar. E visamos aqui o dote, e o destino de Orfeu. Dividindo bem o Logos, à guisa de Empédocles, distribuindo-o, mais e mais, pelas nossas entranhas. Seguindo e segundo María Zambrano, «nem só de pão vive o homem» equivale a dizer: o homem não vive, tão-só, da Ciência e da Técnica, o homem ultrapassa o razoar positivista. Ver, dessarte, para crer: e aqui se estrutura a Ciência experimental: mas felizes, portanto, os que crêem, sem nunca terem visto. Nossa Fé, diz a «Carta aos Hebreus», é «o firme fundamento  das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se vêem». Ou seja: no episódio de S. Lucas, entre Marta e Maria, Salvado escolhe a maga, e a mística Maria. E ele prefere, e ele requer, a Filologia, Magia ou Metaciência – e as imagens, os mitos, as metáforas, o nascimento, ou «co-naissance», de António Salvado. Sendo assim, se o gerador é genial, a Gnose apela à génese, e é genuína, generosa,  a Palingenesia ……………….


PARALIPÓMENOS

E muito, muito bem: pra entendermos, melhor, António Salvado, remembremos, na cita, «Ao Encontro da Palavra» do Padre Manuel Antunes – e ele nos fala, adrede, da minha «condição de ser «in-sistente» no mundo e do mundo «ex-sistente». Como a planta ou como o animal, o homem mergulha no mundo ( «in-siste» ), lança raízes na terra, oculta-se. Mas, contrariamente à planta ou ao animal, o homem ergue-se acima do mundo ( «ex-siste» ), emerge da terra, transcende» – e assim o conotava o grande Jesuíta. Nós queremos dizer: na solerte «alêtheia», com uma das mãos inda vela o Poeta – e com outra, manipresto, ele desvela a Verdade. Ou melhor, no pundonor: contra o Letes, o olvido, o esquecimento do Ser, se alevanta, leda e leve, a «alêtheia» do letrado. Ouçamos, por isso mesmo, as duas últimas quadras duma «Oração a Lilith»: «Deidade transformada em feiticeira, / não sei como te orar: que sacrifícios / exiges nesse reino onde culteias / e entregas a nudez calma agressiva… / Confluência de sombra e claridade / sedentas no esplendor liso do ventre: / és a origem que não tem idade, / o mistério inefável para sempre.»

Que a mulher, pra Salvado, é sortilégio, ela é Maga, meigueira e portanto feiticeira. Pois indo, adrede, à história das palavras, o hino, e o canto, se ligam, deveras, ao carme e ao charme – e o hinário himeneu é o rompimento do hímen. Não tenhamos, por isso, medo de afirmar: o astro e o estro, em António Salvado, é qual a estrofe e o estrogénio, ele é Vénus Vinália, Vénus venusta e também o venusino. Pensamos, por isso, o seguinte e o requinte: como cidadão da Pátria, ou da plaga, portugalaica, cumpre, deveras, António Salvado, o seu dever de patriota – mas, tomado por o Furor, ele sonha, ele ex-siste, e ele está fora de si. Tal como pra Platão, no «Íon» e no «Fedro», Poesia, pra Salvado, é forte hieromania, é mania como a vemos n’ «As Bacantes» de Eurípides. Ou na festa dionisíaca donde mana a tragédia. Clemente de Alexandria, ele tinha toda a razão: essa «mania», deveras, é sagrada e é secreta, e hierodrama é a trama da hierofania. Por isso é pois, o Salvado, o Hierogramatista, ele cultua, no teor, a «Tékhne Grammatiké». Ou melhor: ele é Mago e maiêuta, ele doutrina, e ensina, através de Sóis e signos – e através, na signa, do selo e sigilo. E como sucedeu, outrossim, com Carl Gustav Jung, a História da vida de António Salvado é a do seu Inconsciente – e ele cumpriu, deveras, a sua missão. Que ele da parte passou ao todo, do incônscio pessoal ele passou, recto e escorreito, para o lectivo, colectivo Inconsciente. E titularemos, adrede, o orbe e a Obra de António Salvado: «Introdução à Essência da Mitologia». Ou melhor: representações, na Alquimia, de símbolos, arcaicos, e génios arcanos. Como os que se encontram no jogo do Tarot. Que a Poesia, face a isso, não serve para nada??? Ela é Catarse, ela é limpeza, e é moral desinfecção. Partamos, selecto, partamos da seguinte proposição: António Salvado não só é génio, como é assistido, em Graal e graça, por os génios do Bem. Ouçamos pois o charme, ouçamos o carme de António Salvado: «Cantarei porque a terra está madura / e as papoulas namoram as cigarras / e as madressilvas trepam pelos muros / e lá ao longe alvoram alvoradas». Quero eu dizer: se o natal, em António Salvado, é nutrice e é natura, Salvado não constrange, dessarte, a Natureza, o Poeta é essente e não e nanja o tenente, é frade e Frei, o Salvado, de todo o ser senciente……………….

Que me perdoe, agora, o ledor, que me releve, na Ágora, o excurso e o curso. Pois prestes a findar, uma questa, ou demanda, da Pitagórica, ou sófica, Numerologia. António Salvado, o Vate albicastrense, foi nado, para as Musas, a 20 de Fevereiro de 1936: ora, para o Número do Destino, 20 + 2 + 1936 = 1936 + 22 = 1958 – e os dígitos somando, 1 + 9 + 5 + 8 = 10 + 13 = 23; a delicadeza, a discrição do número 2 é expressa, na imprensa, através do número 3. Por vocábulos outros, os seus liames, lianças, ligações, levam, Salvado, à Liberdade liberal. Mas indo ao pormenor, 2 + 3 = 5 – e temos, aqui, o Éter, quintessência, o chamado Quinto Império. Em Numerologia Comparada, 5 é também o Caminho de Vida do Escritor, e Poeta, António Cândido Franco. Representa, outrossim, os Números de Vida de Charles Darwin, Marlon Brando, e do Benjamin Franklin. Pra não falar, aqui, do Vincent Van Gogh. Pois 5 é o número de Mercúrio, é o Hermes, o Thoth, e o Sumo Sacerdote. A Rosa, maviosa, no centro da Cruz. E alembremos, também, o Quinto Evangelho, o Eterno Evangelho de Joaquim de Fiore. Os símbolos, na mensagem, não mentem: filho de Maia e Jovis Pater, Mercúrio é magíster, Mercúrio faz a ponte entre o Céu e a terra. Porque a palavra «anjo», em grego ( eles dizem «ággelos» ), significa «mensageiro». E o Sumo Sacerdote indica, ou tipifica, aquele que ensina ou que abençoa, o aliado e ligado, deveras, à Religião, à Sabedoria, à facunda, forte e fértil Filosofia. Pois o clérigo é o «clerc» e o «clerk» é clerezia. E a talho de foice, concordamos, caroal, com Álvaro Ribeiro: o problema da Filosofia Portuguesa é também o lema, e emblema, da educação nacional. Propalemos, portanto, o Pentagrama, o lema e emblema do Áugure pítico. Que os quatro dedos da mão humana realizam preensão através do polegar – e comanda, certeira, a cabeça, os dous braços e duas pernas. Mas há mais, ainda mais: 5 x 10 = 50, e «Pentecostes», em grego, significa, ou quer dizer, o «quinquagésimo dia». Celebra-se, essa festa, 50 dias depois da Páscoa, e ela avoca, ou comemora, a descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos, reunidos, adrede, no Cenáculo ( Act 2: 4 ). Foi nesse primeiro Pentecostes, depois da morte de Jesus, que foi nada, ou nasceu, a Igreja Católica – e daí o Paracleto, e daí o seu carácter pneumatológico.

Mas quanto à Missão de António Salvado, 20 + 2 = 22 – e é, o Tau, a vigésima segunda letra do alfabeto hebraico; ela apresenta, na crisologia, a Cruz em forma de T. Ela é, simbolicamente, a Cruz com asas egípcia, a Cruz ansada do hermetismo e o «Ankh», afinal, do povo das pirâmides; assinala, para os Antigos, a imortalidade. E Tau significa, também, o «sendeiro» ou a «senda», a «Via Crucis – Via Lucis». Se alia aqui, o Doutor, à Sabedoria divina: o Tau pertence, exclusivamente, aos Iniciados, e Adeptos, de cada país. São 22 os capítulos do feraz Apocalipse, 22, dessarte, os Arcanos Maiores, 22 as letras do alfabeto hebraico. Que apodo e chamo, ao Nume 22, uma grande, grande Luz, o número, alteado, do Construtor das Catedrais. Como é a «Ars Magna», o Arquitecto, aquele que se dedica à conceição, e construção, das obras concretas. E prosseguindo, com alor, na pitagórica ciência: nascido e nado em dia 20, é, o Salvado, pessoa calorosa, e deveras generosa. Se o 2 é o símbolo do casal, degusta e gosta, o nosso Poeta, de se sentir amado, acarinhado e protegido; ele não procura o poder, mas sim e em vez disso a associação. Ele gosta de colaborar e também de se integrar; em busca maviosa de Amor e harmonia, demanda, este emotivo, o acorde, o cor e a concórdia. Uma das suas missões, senão a principal, é ser, no plectro, um criador de Paz, é forjar, de feito, os consensos, e evitar as desavenças. Daí que ele preze, ademais, o sentido e o senso comunitário, ele ama, muito e muito, a vida em família. É que o 20, portanto, porta a Música, a Lira, e a Beleza em geral. Aquele que colecciona no canto, no tempo, e Templo das Musas, o Professor, museologista ou bibliotecário.  E tudo o que é arteiro, o artifício, artefacto, a Arte e a Música esperam por ele. E se os números são os nomes, e os nomes são os Numes, vamos ora apurar a Personalidade de António Salvado. Somando as letras, 34 + 20 = 54, e 5 + 4 = 9. O 9 é o mais elevado dos algarismos elementares, ele é, por isso, o portador da Boa Nova. Ou melhor: dedicado ao projecto, e ao prospecto humanitário, ele é a signa e a sina da consciência grupal, sinala as pessoas universalistas ou idealistas, e que anelam, por isso, o mundo mudar. Muitas vezes são beneficentes, emotivas, e fortemente missionárias, demandam a Luz, a ciência e a expansão da consciência. Salvado, por isso, é espiritualista e altruísta, ele é, do Cristo, o «go-between» ou porta-voz. E homem do estudo, e não e nanja do Estado, ele está fora do rude, ele busca, em Belas-Artes, erudição. E sendo António Salvado o nome do publicista, o nome que o marca, enquanto indivíduo, é, no Fado, António Forte Salvado. E adicionando, dessarte, os números de «Forte», 6 + 6 + 9 + 2 + 5 = 21 + 7 = 28, sendo, desta sorte, 54 + 28 = 82, e, desse modo, 8 + 2 = 10. Ora a décima letra do alfabeto hebraico, ela é fecunda, forte e firme, ela é, seguramente, a primeira letra do Tetragrama Sagrado, que no Livro do Êxodo, 3: 14, se escreve YHWH, Yod, Hé, Vau e Hé, que significa «Javé», ou, então, «Eu sou Aquele que sou»; e eis o nome, para os hebraicos, do Deus Adonai.  Que em joanino Apocalipse, em 1: 4 e 4: 8, é descrito desta sorte: «Aquele que é, que era e que há-de vir.» Simboliza, o Yod, a vis criacionista, o poder manifesto na mão do homem, ou melhor, no seu dedo indicador. Mas 1 + 0 = 1. Se esse 1 indica solidão, solidez e precisão nos objectivos, o Ser enquanto Ser é pois o lema, o emblema, do nosso publicista, ou melhor, sendo centrado, concentrado e criativo, é um ledo e é um «leader» António Salvado. O 1, aqui, vai autonomizar, mitigar, e tornar varonil, o que dissemos, dessarte, acerca do 20. A mónada, por isso, assume o comando, a direcção, o espírito, esperto, da inspiração. Por vocábulos outros, o 1 dá ao Vate o pioneirismo, energia, a grande e grandiosa força de vontade. Regra geral, no seu trilho, ou demanda, não gosta, Salvado, de seguir os modelos, ele tende, na senda, a desbravar  caminho virgem. E por isso ele é Actor. E buscando, sempre e sempre, a originalidade, ele atinge a autarquia de que falam os Estóicos. Um homem como este só poderá, de feito, ser liberal ou libertário, professar, desse modo, as Artes Liberais.

Depurando, e acurando, a missão de Salvado, nós temos o seguinte: 20 de Fevereiro corresponde ao início do signo de Peixes. E no signo de Peixes, situa-se Neptuno. Sendo o símbolo da receptividade passiva, Neptuno confere, ao António, intuição, mediunidade, inspiração, ou melhor: Salvado é meio, ou instrumento, nas mãos de forças e poderes que em muito o transcendem, ele é médium, desse modo, do Verbo divinal. Ou melhor: se o homem, corriqueiro, possui o talento, o génio, afinal, é aquilo que nos possui. Pois seguindo e segundo o discípulo de Sócrates, os Poetas, coribantes, videntes e rapsodos são os entusiasmados, são plasmados e tomados por o Espírito Paracleto. E graças a Posídon, nós temos, então: fortemente idealista, Salvado está ligado ao espiritualismo, à renúncia e abnegação, à Musa, dessarte, e à Música do carme. Aqui temos, sobremaneira, o Poeta e o Vate como Vidente, aquele que indica, indicia, ou nomeia o sagrado. Quero eu dizer: como gota de água deitada no oceano, Salvado pertence, ele, sacral, à «communio» universal de todos os homens da terra, ele comunica, faz parte e participa no lectivo, colectivo inconsciente. E como firma e afirma o Tertuliano, em seu «Tratado Sobre o Baptismo»: renascido das águas por a força baptismal, o cristão é comparável a um peixe pequenino, à imagem, caroal, de Cristo Jesus. Pois mais do que projécteis, ou armas de arremesso, as palavras são navios, são palavras as naus pra António Salvado. Pois em viático, em via, em Verdade e a vida, pertence o Vate a um país de aventureiros e nautas. E como asserta, acertando, a Kabbalah fonética: as letras que compõem a palavra «Ichtus» ( «verbi gratia», «peixe» em grego ), são as iniciais de outras tantas palavras que assinalam o seguinte: «Iesus Christós, Theou Yios Soter», que significa, afinal, no vernáculo português: «Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador». Equipolente na grafia, equivalente, o «Salvador», à palavra «Salvado».

E estamos, agora, na recta final. O Poeta, em Salvado, é Sacerdote, e dele exige, a profecia, o sacrário, sacramento, o sacrifício, o Pão, da Poesia, partido em pequeninos. Prestámos, então, a menagem, plausível e possível, a um grande, um nome grado nas Letras lusitanas. Matematicamente, isto é, na «Mathesis Universalis», são ora cumpridos, em António Salvado, os 65 anos de vida literária. Se a minha escrita florescer, isto é, se fortificar e frutificar, que se funde, em parabém, que se funde, albicastrense, o «Centro de Estudos António Salvado» ou «Casa da Poesia António Salvado» – ou finalmente, e alfim, a «Escola Secundária António Salvado» – e sejam eles o alento, sejam eles, aladamente, o nutrimento e alimento. Pois eu louvo, em sua lavra, o alqueive, a leiva, o viço da pletora – e assim sorri a Musa, meu Deus, e assim se faz a História………………………………..


Que Luz, 21/ 11/ 2020

MISERANDO ATQUE ELIGENDO

PAULO JORGE BRITO E ABREU


POST SCRIPTUM

Aquilo que exarámos, no fim deste texto, se carnalizou e concretizou: foi criada, em Castelo Branco, a 07/ 10/ 2020, a Associação «Amigos da Casa de António Salvado». A escritura de doação da sua casa natal à Câmara Municipal de Castelo Branco foi assinada, por o Poeta, a 12/ 02/ 2020; na Rua d’Ega, números 38 e 40 é que sonhou, foi falante e foi aflante o Autor, e promotor, de «A Flor e a Noite». Sociedade de homens e mulheres de boa vontade, os Amigos do nosso Poeta têm por escopo o difundir, e defender, o património e a memória do Vate albicastrense. António Salvado, dessarte, sugere e pretende que no rés-do-chão fique instalada, com donaire, uma Biblioteca infantil e, no primeiro andar, uma Biblioteca de Poesia que abarque, e abrace, a Música, a Arte e a Museologia. A Casa de António Salvado será também um local onde se façam tertúlias, se organizem recitais e se dêem conferências. Ficará, no forro, um arquivo contendo o espólio de missivas e recortes de jornais atinentes, e concernentes, à vida profissional e literária de António Salvado. De sublinhar, deveras, e alçar: a reunião de sócios fundadores deste grémio cultural se deu a 1 de Outubro de 2020, na Universidade Sénior Albicastrense, tendo presidido à mesa Maria de Lurdes Barata, José Pires e Costa Alves. Óptima chance pra dilatar, a Cultura, no Norte do País. Pra recitar, e pra cantar, ao som de uma guitarra.


NOTA BENE

Os números são nomes e os nomes são Numes, o Escritor é Sacerdote duma Ideia universal. E palavras são espíritos seguindo e segundo o Pinharanda Gomes. Desta sorte e desta arte, Afonso Lopes Vieira tinha, na reza, toda a razão: o primeiro dever de cada português é falar e escrever, escorreita, correcta e rectamente, o «Logos» e a língua Portugalaica – e essa, na vida, essa a senha e o norte de António Salvado. António Salvado, o especulativo, isto é, aquele que observa, o Firmamento, com a ajuda de um espelho. Se outras provas não houvesse da existência de Deus, bastariam, bondosas, estas duas: a existência das Mães e a resistência, a insistência dos Poetas. Pois o que está em cima, sideral, é como, afinal, aquilo que está em baixo – e o que está por fora, de feito, é como aquilo que dentro está. Já o dissemos, noutro sítio: as Letras, cá em baixo, elas reflectem, ou repetem, as figuras, celestes, das constelações. Em certo sentido, portanto, são as palavras impressas que dirigem, ou que regem, a sorte das nações, essas nações serão julgadas segundo os livros seus. E aqui cito, «verbi gratia», na língua do Lácio: «verba volant, scripta manent», ou seja, se «as palavras voam, os escritos permanecem» – e prosseguimos, por isso, no afã, e continuamos a falar de António Salvado. Ele é, veramente, inteligente, isto é, ele sabe ler, com arte, no coração das pessoas. Ele sente, como o sentia, outrossim, o solerte Estagirita, que o livro, afinal, é um ser vivo, atraente e activo. E que no que concerne à  Católica eclésia, deveria, a Igreja de Pedro, se irmanar, e adunar, à Igreja de João. Pois de acordo com esta última, Adonai criou o mundo com as 22 letras do alfabeto hebraico. E as palavras escritas, elas são, no portento, como as palavras proferidas: elas regressam, sempre e sempre, ao seu ponto de partida. Ou melhor: o Arcano, como vimos, do Papa, concernente e atinente a António Salvado, ele indica, ou indicia, o cunho e o carácter do nosso albicastrense: é que há 84 anos que ele ensina, alimenta, que ele ajuda e abençoa. E só nos resta, a nós, a sorte metafísica, só nos resta, a nós, o mirá-lo e admirá-lo.

Nos seja lícito, e explícito, afirmar e dizer: depois de lermos, de D. Francisco Manuel de Melo, o «Tratado da Ciência Cabala», resolvemos, dessarte, proceder aos anagramas, transpor e transmutar as letras contidas no nome do Poeta – e alteamos, e loamos, «António Forte Salvado». E finalmente e alfim, depois de horas e horas de faina e afã, obtivemos, com as mesmíssimas letras, o cunho, o carácter, a marca seguinte: «Santa Noite Vodo Flora». Que o mesmo, agora, é dizer: a estreia do Poeta se dá, em 1955, com o livro intitulado «A Flor e a Noite». Nos remete, a «Flor», para o mundo venusiano – e nos remete, a «Noite», para S. João da Cruz, e pra um neo-romantismo de cariz supra-real. E também, e outrossim: nos remete, a «Santa», para a santidade, imarcescível, da Metaciência – nos reenvia, o «Vodo», para o Corpo de Cristo, para o culto, caroal, do Espírito Santo, e para o Pão da Poesia partido em pequeninos: pois em António Salvado é como, figadal, no Padre Manuel Bernardes. Sendo pois, o companheiro, aquele que manja, manduca, e come do mesmo Pão – e sendo ora, a «Fracção do Pão», outro nome, numinoso, para a selecta Eucaristia. Em escólio breve e leve: se enceta o Cristo, a Sua vida publicista, com as Bodas de Canaã, nos seja recto, escorreito, e correcto concluir: através do simpósio, cenáculo ou banquete, se realizam, esponsais, entre o Céu e a Terra – e o Salmo é pois o almo, e nos educa, o Nazareno, no edível e edule. No viático e via da vianda que é Sua. E uma vez aqui chegado, trazemos, então, à colação: tanto António Forte Salvado, como Maria Adelaide Neto Salvado, eles difundem, eles defendem, o culto, cordial, do Espírito Paracleto – e eis o ápice,  o acume e o acme, eis o escol e a escola de Agostinho da Silva. Seguindo e segundo Joaquim de Fiore ( 1145 – 1202 ), que é, no santo culto, um dos meus Mestres, a História universal se decide, ou divide, em três Idades ou eras: a Idade do Pai, a Idade do Filho e a Idade, fraternal, do Espírito Santo. O lema e emblema, na Idade do Pai, é a lei, o temor, e o poder absoluto; na Idade do Filho, com o Novo Testamento, se cria, ou constrói, a Igreja de Cristo, é o «Logos», o Verbo, e a Sabedoria divina – e, finalmente, na terceira Idade, o  que impera, aqui, é o Amor universal, a Graça redentora, a igualdade, caroal, entre todos os homens. Quero eu dizer: depois do Antigo Testamento, e do Novo Testamento, a figura-fulgor ela é, veneranda, o Evangelho Eterno – e eis o cunho e a benesse, e eis a Boa Nova em António Salvado. Ou melhor: se na Idade do Pai reside o temor, e portanto a «Torah», se reside, a Fé, na Idade do Filho, decorrerá, dessarte, a tércia Idade, na Luz e no carme da contemplação. E como corolário do Evangelho Eterno: a abundância, a partilha e a amizade, a Fraternidade, lilial, entre todos os povos, e eis o Frade e a Flora, eis a ponte e a porta em António Salvado. Se a letra, portanto, é o conteúdo latente, lateja, o Sopro, no conteúdo manifesto, e eis o «speculum», a esperança do nosso especular. Ora o Espírito Paracleto se avigora, e comemora, 50 dias depós a Páscoa – e já vimos, aqui, a simbologia, ou selecto, do número 50. De tal modo que afirmamos: em Poetas do quilate de António Salvado, Poesia, afinal, não é apenas letradura – ela é esperta e ela é Esperança, é escritura, mensagem, do Espírito Santo. E temos, então: os principais propaladores, em Portugal, do pensamento joaquimita, eles foram, espirituais, os frades franciscanos. E foi sob a égide dos Frades Menores que a Rainha Santa Isabel instituiu, na lusa gente, as Festas populares do Consolador. O seu avô Jaime I lhe chamava, com carinho, a «rosa da casa de Aragão», ela é frol e é saudosa, é qual Rosa, teosófica, no centro da Cruz. E novamente, o Quinto Império  ou quintessência. Ou não fosse, em Salvado, dilecta a «Flor Álea», ou não fossem, aqui, as «Rosas de Pesto». E na reza, na oração, no fulgor criacionista, «jamais pedir mãos emprestadas para erguer a casa» – e eis o selo e a senha em António Salvado. O dissemos, com «adresse», há poucochinho: se o domingo da Poesia é do domínio do sagrado, Salvado é culto, cordial e caroal Construtor das Catedrais. E se temos, neste Vate, Literatura qual expressão do preternatural, ouçamos, na signa, o seu lavor e lampejo: «Há enigmas que contribuem, com o seu silêncio, para a iluminação confidencial d’o que se julga ser o desconhecido.» Quero eu, aqui, certamente asseverar: na Poesia de Salvado, é como na sessão psicanalítica: é mistério sondar, é mister o trazer, à luz do dia, os temas recalcados no inconsciente: não hemos aqui, bem consóror, a Poesia, ou profecia, do grande Herberto Helder???

Um pouco por toda a Obra de António Salvado, existem, louvados, dous temas e lemas: o preito à Santidade, o culto, caroal, da genialidade. Ou melhor: a cultura do campo aliada, e ligada, à cultura das Almas. E nunca será de mais reiterar, ou repetir: realça e sublinha, o nosso Poeta, a Bondade, beletrista, a Beleza e a Verdade. Que são, respectivamente, manifestações, ou missões, da Religião, da Arte, duma augusta e robusta Filosofia. Os três tópicos, e tropos, se encontram, e contam, nos orbes, e Obras, de S. Paulo, de Orfeu, e Teixeira de Pascoaes. E hemos dito, e esquadrinhado, que o Génio, portanto, é genuíno e generoso. Ou melhor: que é inata, nativa e natal, que é ingénita, a Lira, em António Salvado. E que este, de acordo com uma frase de Almada-Negreiros, tem na vida, mental, uma robusta missão: o eduzir, reproduzir-se, igual a si próprio. E lavorando em lavaredas ele entra, numinoso, na galera, ou galeria, de Santo Agostinho, de Sinésio de Cirene, do Padre, suserano, do Padre Manuel Antunes. E como nos ensina, e doutrina, o Santo Evangelho:  se a vida de Marta é negócio, e se a vida de Maria é o «otium», a ilação, aqui, é bem clara, e Maria, como António, tomou a melhor parte. Poesia, portanto, como forma de oração. A imagem como ponte, ou ligação, entre o mundo sensível e o mundo inteligível. E o Sacerdote qual docente, e qual doutor, na ciência do sagrado. Aqui a barca, aqui o berço, aqui o canto e o carme em António Salvado. E quanto ao lente, e ao legente, quem é ele, afinal, perante esta voz??? Redargo e digo, citando João Belo: «Sou mais Eu quando Tu és a síntese de Nós.»


NOTA BENE

Este Ensaio é uma versão aumentada, expurgada e acrisolada de um texto dado a lume no livro intitulado ‘O caminho se faz por entre a vida…’, «ANTÓNIO SALVADO, COLÓQUIO SOBRE A SUA OBRA POÉTICA, COMUNICAÇÕES». Propriedade da Câmara Municipal de Castelo Branco, o volume foi publicitado por RVJ Editores, Lda, no ano sagrado e secreto de 2017. E bem antes disso, logo, logo em 2014, o mesmo texto foi dado a lume por a Universidade de Coimbra, mais concretamente no número 11 de «Estudos: Revista mensal do Centro Académico de Democracia Cristã», a quem fica, o Autor, deveras penhorado.

 


LABORARE EST ORARE

AD MAJOREM DEI GLORIAM

PAZ NA TERRA PARA TODOS OS SERES

PAULO JORGE BRITO E ABREU