A peça não revela de forma explícita se Subtle fazia ou não justiça nesta área à figura pública que lhe terá servido de modelo. Contudo, a sua aliada mais próxima na empresa tripartida, em que se empenha, é uma prostituta - Dol Common - que parece partilhar ou ter partilhado com ele uma grande intimidade. Aliás, Dol Common não se exime a prosseguir o seu mister desde que a concessão dos seus favores contribuisse para os objectivos comuns. Além disso, tanto Subtle como Face, o seu ajudante, disputam entre si, com bastante acrimónia, os favores de Dame Pliant, uma viúva jovem e rica que um irmão inprudente, recém-chegado a Londres, pôs ao alcance da desmedida cobiça e da óbvia lascívia de ambos.
Subtle está, pois, muito longe do «homo frugi», piedoso, santo e casto que Pertinax Surly, o satirista céptico desta comédia, descreve a Sir Epicure Mammon. Segundo Surly, só um homem com estas características podia empreender com êxito o trabalho alquímico e constituir-se como fiel depositário e guardião da Pedra Filosofal. Surly tenta, deste modo, alertar Sir Epicure Mammon que, como o nome indica, ama os bons prazeres terrenos e adora o deus dinheiro, para a circunstância de que as suas prioridades o excluem à partida como candidato à posse da Pedra dos Alquimistas e de que esta não se adquire, pagando-a em géneros ou espécie, mas se ganha por mérito próprio não transmissível a outrém.
Contudo, a cobiça de Mammon embota-lhe a clareza de raciocínio. Assim, para ele, os argumentos que Surly aduz são o resultado lógico da pertinácia da sua descreença que, se encontra consagrada no seu nome próprio Pertinax com o qual Mammon, por vezes, se permite fazer jogos de palavras. Além disso, o carácter desta personagem possui uma faceta ingénua que o transforma em presa fácil dos três comparsas. De facto, Mammon está genuinamente convencido de que Subtle possui todas as qualidades que Surly enumerou como fazendo parte integrante do perfil do alquimista e, por isso, tem para com ele uma atitude respeitosa de piedade filial.
A confiança cega que Mammon deposita em Subtle facilita aos três parceiros a manipulação dos factos de modo a convence-lo de que o trabalho alquímico que, como é óbvio, nunca teve início, se esvai em fumo e fogo pela sua inépcia em cumprir a parte que lhe cabe no contrato. Com efeito, o falso alquimista exigira de Mammon uma vida impoluta até que todo o percurso estivesse completo. Insistiu, sobretudo, na observância de uma abstinência sexual rígida, isto é, que não se traduzisse só na renúncia ao acto em si, mas também na contenção, porventura supressão (?), dos pensamentos que pudessem conduzir ao acender do desejo. Também aconselhou a recusa de situações dúbias cujo resultado prático fosse análogo. Como é evidente, Subtle empenha-se em que os seus conselhos não sejam acatados, instruindo Dol para que, no momento oportuno se mostre aos olhos ávidos de Mammon. Este fica tão obcecado que se propõe prevaricar com o auxílio de um Face «relutante». .Fingindo descobrir a tramóia que ele próprio congeminara com a ajuda dos outros dois, Subtle entra na sala em que se encontram Face Dol e Mammon qual Deus Pai no Jardim do Paraíso para que a sua criatura responda às suas perguntas magoadas e sofra o merecido castigo por desobediência aos seus preceitos.
Porém, ao contrário do que acontece no episódio biblico em que Adão acusa Eva e esta a Serpente, Mammon assume a sua culpa e a de Face para que o «Mestre» Subtle não lhe inflija um correctivo demasiado severo. Esta cena que é, sem dúvida, uma das mais brilhantes da peça, divide o espectador que hesita entre o riso fácil pelo ridículo e absurdo de que a intriga se reveste e um certo desconforto perante a atitude de inteireza inesperada de Mammon.
Quando se procede à análise de The Alchemist há sempre uma pergunta que fica sem resposta: Seria Ben Jonson um praticante da Arte Alquímica? Os seus contemporâneos pareciam suspeitá-lo, visto que a sua vasta biblioteca, onde se encontravam algumas obras de grande valor, foi consumida por um incêndio ateado por mão criminosa. Aliás, na época, só o facto de Jonson ter exercido o mister de pedreiro já justificava a desconfiança. Contudo, é muito provável que existissem outros indícios de que hoje não se tem notícia. Por outro lado, a destruição do seu património podia resumir-se a uma mera vingança pessoal, visto que as críticas e sátiras, por vezes caricaturais, de Jonson não poupavam ninguém. No entanto, a evidência interna da peça aponta para aquilo que os homens que com ele conviveram pressentiam ou, até tinham como certo. Com efeito, Jonson demonstra um conhecimento profundo de tudo o que se relaciona com a Alquimia: os materiais e substâncias que era preciso trabalhar, em que proporções e como conseguir o equilíbrio das mesmas, o equipamento necessário e, com todos os pormenores mesmo os mais ínfimos, o modo como o processo se desenrolava.
Alguns críticos e estudiosos do dramaturgo atribuem este facto ao excesso de zelo perfeccionista de Jonson. Outros, mais agressivos, acusam-no de ser um auto-didacta pedante. Estas hipóteses são, porém, meras conjecturas tão dignas de crédito ou desabono como quaisquer outras. O que a leitura da comédia permite concluir é que as três personagens principais - Subtle, Face e Dol Common - falam a mais pura linguagem da arte alquímica exprimindo-se cada um deles nos termos que mais se adequam ao seu papel dentro da intriga. Dol Common, por exemplo, quando finge que enlouqueceu por se dedicar com tanto desvelo a diversos estudos sobre várias matérias, empenha-se num discurso em que cita longos excertos de um livro redigido por Hugh Broughton (1549-1617), um puritano que se dedicava ao estudo de textos rabínicos relacionados com a cabala.
Além disso, todas as personagens desta peça constituem matéria susceptível de transmutação. Este facto torna-se óbvio desde a primeira cena do primeiro acto, visto que a peça se inicia com uma violenta disputa entre Subtle e Face em que ambos se vangloriam de terem tirado o outro do estado bruto e impuro em que se encontrava, transmutando-o em algo diferente, porventura melhor.
Jonson tem sido muito censurado pela ousadia de escrever uma peça na qual se permite satirizar os saberes herméticos pondo, desse modo, em causa a lisura dos seus adeptos. Contudo, esta é uma interpretação totalmente errónea dos objectivos que nortearam o dramaturgo. Com efeito, este dirigia as suas críticas àqueles que, de modo indevido, se apropriavam de uma linguagem específica de uma forma de conhecimento que, na realidade não possuiam, com o intuito de explorar os incautos rebaixando, deste modo, os praticantes idóneos que, de facto dedicavam a sua vida ao estudo dessa matéria. Portanto, o alvo de Jonson em The Alchemist não reside nos saberes em si próprios, mas nas práticas abusivas dos mesmos, ou seja, nos meandros ínvios do percurso alquímico que o dramaturgo denuncia, tomando-os como exemplo paradigmático. E, por muito que certos críticos se esforcem por contradizer o óbvio, não há nenhum indicador na peça que permita afirmar sem distorção de dados que Jonson tenha, em algum momento, demonstrado o mais leve desprezo ou desrespeito pelas ciências herméticas, ou por aqueles que delas se acercavam com pureza de alma.