Tendo abordado, no filme Casablanca, aspectos da ficção fílmica, da linguagem cinematográfica, o fulcro da personagem feminina central e sua relação com as duas figuras masculinas centrais que a solidão e a segunda grande guerra mundial fizeram convergir, para serem encontrados e por ela amados, vemos que, se não fosse a presença de Ilsa, por todas as suas qualidades humanas, espirituais, a sua beleza sem mancha nem qualquer esboço vil ou perverso, se não fosse a sua força alquímica, não se sabe se Rick teria tido força para superar tudo o que de edipiano lhe poderia restar e fixar-se possessivamente numa paixão por uma mulher casada. Não se trata de paixão mas de amor profundo, apenas expresso no essencial de palavras. Rick ajuda Ilsa, ajuda-se a si próprio e a Victor Lazlo a darem a volta por cima de uma espantosa e comovente história que poderia acontecer a qualquer um de nós, em tempo de guerra, sem cair no aviltamento. Ilsa acaba por aceitar a vida, continuar a amar o marido sem nunca deixar de amar Rick que a acompanhou com amor, sem saberem muito um do outro, na sua solidão em Paris, quando ela julgava que o marido estava morto também pela conjuntura da segunda guerra mundial. O amor acontece, não se programa e permanece no seu mistério, sendo a alquimia positiva do feminino a grande força que pode contribuir para transformar os próprios sentimentos em ouro, na maior elevação de espírito. Este filme, além de ter marcado inúmeras gerações, deveria ser revisto pelas novas gerações actuais e de todos os tempos, para meditarem neste desafio às energias mais belas, mais profundas, sinceras, positivas e verdadeiras do ser humano, no processo raro de não excluir nada que seja amor profundo, transmutado e apoiado pelo feminino, portador de alma pessoal, interpessoal, de futuro e de eternidade.
Maio-Junho 2007
Helena Langrouva
Maître ès Lettres Modernes-Cinéma (Montpellier III)
Agradecimento: Eduardo Langrouva
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