Um mergulho na história de Minas Gerais   

ADELTO GONÇALVES


 Adelto Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Academia Brasileira de Letras, 2012),  Direito e Justiça em Terras d´El-Rei na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2015) e Os Vira-latas da Madrugada (Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981; Taubaté-SP, Letra Selvagem, 2015), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br


I

 

O território de Minas Gerais talvez tenha sido, entre as 27 unidades que compõem a federação brasileira, o mais contemplado até hoje por estudos acadêmicos, desde os tempos que antecedem a capitania de São Paulo e Minas de Ouro, criada em 1709, e a capitania de Minas Gerais, surgida em 1720, passando à província do Império a partir de 1822 e estado com a República em 1889. Mas, como sempre há muito o que se descobrir e estudar, tudo o que diz respeito à região de Minas Gerais atrai o olhar dos especialistas, resultando em estudos enriquecedores que satisfazem o leitor de bom gosto.

Um bom exemplo disso são os trabalhos apresentados durante os dois seminários organizados pelo Instituto Cultural do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG Cultural) para comemorar os seus 30 anos de atuação nas áreas de artes e cultura. O primeiro foi realizado em dezembro de 2017, com curadoria da professora Eliana de Freitas Dutra, e discutiu a cidade de Belo Horizonte como espaço de história e cultura.

Já o segundo, realizado em maio de 2018, com curadoria do professor Caio César Boschi, procurou abordar, de maneira ampla, a trajetória de Minas Gerais à luz do processo histórico. Os textos lidos pelos conferencistas nos dois seminários foram reunidos em Estudos sobre Belo Horizonte e Minas Gerais nos trinta anos do BDMG Cultural (Belo Horizonte, BDMG Cultural, 1ª ed., 2018).

II

 

Um dos mais lúcidos ensaios é “Os caminhos da economia de Minas: passado, presente e futuro”, do economista Paulo Roberto Haddad, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (1992-1993), incluso na segunda parte desta obra (“Minas e seus caminhos”) e apresentado durante o seminário realizado em maio de 2018. Neste texto, o economista, depois de apresentar as causas para as quatro décadas de baixo crescimento pelas quais o Estado de Minas tem passado, defende a necessidade de se implantar um novo ciclo de expansão para melhorar os indicadores de emprego, de renda, de condições de vida da população.

Para Haddad, não basta atribuir os problemas de baixo crescimento e de desemprego em Minas à recessão econômica brasileira, mas é preciso arquitetar um “novo modelo de desenvolvimento sustentável, tendo como fundamentos ideias renovadas, instituições revitalizadas e instrumentos e mecanismos reconstruídos do velho modelo que se exauriu”.

Outro trabalho de muitos méritos é “Sentido e sentimento de Minas” em que o jornalista João Paulo Cunha, ex-professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-MG), pesquisador da Escola de Saúde Pública de Minas Gerais e presidente do BDMG Cultural, procura tentar definir “o que é ser mineiro”.

Para tanto, faz uma digressão sobre as obras daqueles autores que contribuíram para a formação desse sentido de mineiridade, ou seja, os intérpretes de Minas, como Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Alceu Amoroso Lima (1893-1983), Sylvio de Vasconcellos (1916-1979), João Camillo de Oliveira Torres (1915-1973), Otto Lara Resende (1922-1992), Darcy Ribeiro (1922-1997), Pedro Nava (1903-1984), Afonso Arinos de Mello Franco (1905-1990), Francisco Iglesias (1923-1999), José Carlos Reis e outros, para concluir com uma visão do trabalho da professora Sônia Maria Viegas Andrade (1944-1989).

Educadora e pensadora de muito destaque nas décadas de 1970 e 1980, esta autora publicou A Vereda Trágica do “Grande Sertão: Veredas” (São Paulo, Loyola, 1985), sua dissertação de mestrado, uma leitura filosófica do romance de Guimarães Rosa (1908-1967), e teve sua obra reunida em Escritos: Filosofia de Sônia Viegas (Belo Horizonte, Tessitura, 2009, 3 v.), organização do professor Marcelo Pimenta Marques (1956-2016).

III

 

Já na primeira parte do livro dedicada ao seminário “Escrita, memória, movimento: BH 120 anos”, são de se destacar os dois textos de abertura:  “Belo Horizonte entre palavras e formas: o que restou as modernidade”, de Carlos Antônio Leite Brandão, professor aposentado de Arquitetura da UFMG, e “Milhares de brilhos vidrilhos – Mário, Drummond e Nava na Belo Horizonte dos anos 1920”, de Wander Melo Miranda,   professor emérito e professor titular de Teoria da Literatura na UFMG. Nestes textos, os autores se debruçam sobre as palavras e formas que desenharam a modernidade belo-horizontina e “respondem pelas suas sobrevivências, ou esbatimentos, no presente”, como observa o texto de abertura a curadora do seminário, Eliana de Freitas Dutra.

Outro ensaio que se destaca é “Cidade e canção: narrativas sobre o espaço e o tempo”, de Bruno Viveiros Martins, doutorando em História pela UFMG e autor do livro Som Imaginário: a reinvenção da cidade nas canções do Clube da Esquina (Editora UFMG, 2009),  em que o ensaísta procura  decodificar a fisionomia de Belo Horizonte por meio do mapa sono criado pela canção popular.

Enfim, como observa o historiador Caio César Boschi na apresentação que fez para a segunda seção do livro, o que se pode dizer é que toda esta obra é um convite para se conhecer um pouco mais esse mistério chamado Minas Gerais.

IV

 

Eliana de Freitas Dutra, doutora em História pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doutoramento na École des Hautes Études em Sciences Sociales na França, é  professora do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), além de pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e vice-presidente do International Committee of Historical Sciences. É autora de O Ardil Totalitário – Imaginário Político no Brasil dos Anos de 1930 (Belo Horizonte, Ed. UFMG, 2012, 2ª ed.), Rebeldes Literários da República (São Paulo, Humanitas, 2005), entre outras obras.

Caio César Boschi, doutor em História Social pela USP, é professor titular aposentado de História do Brasil da UFMG e professor titular do Departamento de História da PUC-MG. Entre 1999 e 2009, foi professor convidado e leitor em História do Brasil na Universidade de Lisboa e na Universidade do Porto. É membro da Academia Mineira de Letras, da Academia Portuguesa de História e do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB).

É autor de Os Leigos e o Poder: irmandades e política colonizadora em Minas Gerais (São Paulo, Ática, 1986); Barroco Mineiro: arte e trabalho (São Paulo, Brasiliense, 1986); Por que estudar História? (São Paulo, Ática, 2007); O Brasil-Colônia nos arquivos históricos de Portugal (São Paulo, Alameda, 2011); O Cabido da Sé de Mariana (1745-1820): documentos básicos (Belo Horizonte, Fundação João Pinheiro; Ed. PUC-MG, 2011); e Exercícios de pesquisa histórica (Belo Horizonte, Ed. PUC-MG, 2011).

Na área da Arquivística, publicou Fontes primárias para a História de Minas Gerais em Portugal (Belo Horizonte, Fundação João Pinheiro, 1998) e é co-autor do Inventário da Coleção Casa dos Contos, livros – 1700-1891 (Belo Horizonte, PUC-MG; Fapemig 2006). Elaborou os catálogos da documentação avulsa das capitanias de Minas Gerais, Maranhão, Pará e Rio Negro do acervo do Arquivo Histórico Ultramarino (AHU), de Lisboa. Em 1997, foi distinguido pelo governo português com a comenda da Ordem do Infante Dom Henrique.

 

Estudos sobre Belo Horizonte e Minas Gerais nos trinta anos do BDMG Cultural, de Eliana de Freitas Dutra e Caio C. Boschi (orgs.). Belo Horizonte, BDMG Cultural, 408 p., 2018.