Quarenta e quatro anos de liberdade desperdiçados

A.M. GALOPIM DE CARVALHO
Prof. Fac. Ciências da Univ. Lisboa. Geólogo, escritor.


Como na Primeira República, a classe política a quem os Capitães de Abril, generosa e honradamente, entregaram, “de mão beijada”, o destino dos seus concidadãos, mais interessada nas lutas pelo poder, esqueceu-se completamente de lhes facultar cultura civilizacional e humanística. Entre os sectores da vida nacional que nada beneficiaram com esta abertura à democracia está a educação. E, aqui, a escola falhou completamente.
A sucessiva e elevada abstenção em actos eleitorais, a iliteracia cultural e científica, mesmo aos níveis mais básicos, e a irracionalidade e violência associada ao futebol são prova dessa absoluta falência.
Esta, agora, manifestação estudantil de Coimbra, um arraial de cerveja, irreverência gratuita e mau gosto, que dá pelo nome de Queima da Fitas, é mais uma demonstração dessa falência. O carro do habitual cortejo, onde, alarve e ostensivamente, evocam a ex-ministra da administração interna, uma muito respeitável senhora, vítima de um terrorismo incendiário, ainda por explicar, que deu e continua a dar muito jeito às oposições, representa a falta de civismo e a alienação, dos que nela participaram.
Privilegiados, numa sociedade onde ainda grassa flagrante desigualdade, estes rapazes e estas raparigas são filhos e filhas de uma geração de pais e mães, em grande parte carentes da dita cultura civilizacional e humanística, educados no chamado Portugal de Abril, que de Abril pouco ou nada teve e tem para muitos e muito teve e tem para poucos.

Na imagem, uma fotografia que circula na net e cuja autoria desconheço