Procurar imagens
     
Procurar textos
 

 

 

 

 

 


 

 

José Roberto Baptista

O uso do termo alucinação no âmbito da psicopatologia e sua utilização em parapsicologia

Geraldo José Ballone, em seu artigo As alucinações e os delírios na psicopatologia,[1] nos ensina que a "Alucinação é a percepção real de um objeto inexistente, ou seja, são percepções sem um estímulo externo. Dizemos que a percepção é real, tendo em vista a convicção inabalável da pessoa que alucina em relação ao objeto alucinado. Sendo a percepção da alucinação de origem interna, emancipada de todas as variáveis que podem acompanhar os estímulos ambientais (iluminação, acuidade sensorial, etc.), um objeto alucinado muitas vezes é percebido mais nitidamente que os objetos reais de fato."

E continua: 

 

"Tudo que pode ser percebido pelos nossos cinco sentidos (audição, visão, tato, olfato e gustação) pode também ser alucinado. As alucinações sempre aproveitam o material consciente conhecido do paciente. Na alucinação, por exemplo, um leão pode aparecer de asas, ou um caracol que cavalga um ouriço. O indivíduo que alucina deve ter percebido isoladamente cada um dos objetos e, mentalmente, combina uns com os outros." (grifos nossos)

 

Em parapsicologia, contudo, o emprego do termo alucinação, apesar de reconhecermos seu uso por um número bastante substancial de estudiosos, é inadequado. É nossa compreensão que tal comportamento aproxima desmedidamente psicopatologia e parapsicologia como pertencentes a uma única e mesma realidade. A razão para separarmos "o joio do trigo" nos parece defensável.

 

O termo alucinação, quando utilizado no âmbito da psicopatologia, como vimos poucos passos atrás, faz referência a um fenômeno de natureza mórbida, normalmente associado a estados psicóticos. Ora, em parapsicologia nenhum estudo, até o presente momento, associou estados patológicos a vivências parapsicológicas. Estas são de outra natureza. Isso tentaremos demonstrar.

 

Vejamos alguns relatos de experiências parapsicológicas, retiradas ao acaso, em Richet, (s.d.) que certamente nos ajudarão a refletir um pouco sobre essa questão.

 

Relato 1

 

"J... deixou seu amigo F... quando F... não tinha senão ligeira indisposição. Ora, pouco depois, em seu quarto, J... vê nitidamente a aparição de F... Pergunta a hora à esposa: 9 horas menos 12 minutos. É portanto às 9 horas menos 12 minutos, diz J..., que F... morreu.

Acabo de vê-lo.

Ora, F... morreu entre 8h35m e 9 horas da noite. Admitamos 8h45m como média. Temos exata concordância da hora.".

 

Relato 2

 

"A Sra. Green sonha com duas moças num carro puxado por um cavalo, que se afogam num lago e ela vê dois chapéus de mulher flutuando na superfície da água. No mesmo momento, do outro lado do mundo, uma sobrinha da Sra. Green, fazendo, com uma amiga, um passeio num carro puxado por um cavalo, afoga-se num lago e encontraram os dois corpos, porque viram dois chapéus flutuando à superfície."

 

Relato 3

 

"A Sra. Bettany viu em seu quarto uma mulher velha com um mantô muito comprido, de cócoras no chão. O Sr. Bettany também vê a mesma forma. E eles reconhecem que é a Sra. X...

A morte da senhora X se deu na mesma hora."

 

No relato 1, apreendemos pelo próprio texto que havia certa proximidade entre J... e seu amigo [pouco tempo depois, em seu quarto, J...]. No relato 2 fica clara a longa distância entre a Sra. Green e sua sobrinha [do outro lado do mundo] e no relato 3 não há referência alguma, para que possamos nos orientar, em relação à distância. Contudo, podemos agrupá-los, sem receio, por proximidade, como vivências parapsicológicas de conhecimento referentes à morte.

 

É através de relatos como esses, que estão nos servindo de exemplo, que há um agrupamento por semelhança de casos, para que possam ser estudados.

 

Todavia, as análises de casos semelhantes, ocorridos em várias partes do mundo, com pessoas dos mais diversos níveis culturais e crenças religiosas, apontaram para evidências bastante significativas que criaram a convicção nos estudiosos de que devem existir formas outras de obtenção de conhecimento, que não se limitam às formas sensoriais conhecidas. A essa proposição que se apresenta desafiadora, em relação ao atual estágio das ciências, a parapsicologia vai identificar como possíveis ocorrências perceptivas extrassensoriais.

 

Mas, "nem sempre o que reluz é ouro".

 

Vejamos um caso recolhido por Jacobson (1975) em The paranormal dream and man´s pliable future, publicado na Psychoan, Rev. 56 (1969, 28-43), aparentemente semelhante, mas que pode diferir substancialmente dos anteriores.

 

Relato 4

 

"Uma mulher acordou seu marido, certa noite, para contar-lhe um sonho horrível. Ela vira um grande lustre cair sobre uma criança e matá-la. O relógio do quarto marcava quatro e trinta e cinco. O marido riu de sua angústia quando ela levou o filho para a cama do casal, mas não pode rir duas horas depois, quando se ouviu o baque do lustre no quarto da criança, cujo relógio marcava quatro e trinta e cinco. [hora exata em que a mulher acordou seu marido para contar-lhe o sonho] O lustre caíra exatamente sobre a cama da criança."

 

Nos relatos 1 e 3, apesar de não podermos identificar com precisão a distância entre o local da ocorrência e o lugar em que se encontrava o(s) perceptivo(s) nos parece razoável aceitar que se tratava, minimamente, de ambientes próximos, mas não necessariamente, pertencentes ao mesmo edifício.

 

No relato, de número 4, acredito não podermos descartar de chofre a possibilidade de uma outra forma perceptiva, independente dos sentidos conhecidos. Contudo, seriam necessários mais detalhes.

 

Mas, certamente, devemos, neste caso, considerar a proximidade entre os quartos da criança e da mãe; isso pode nos sugerir outra explicação.

 

Por essa razão selecionamos este caso. Ele identifica que as análises e classificação de tais ocorrências não são tão simples como podem, num primeiro momento, parecer.

 

Assim, admitamos a possibilidade de a mãe ter "pressentido" a queda do lustre. Mas este "pressentimento" talvez possa ser explicado pela hiperestesia. Assim, a mãe, por uma percepção hiperestésica, pode ter obtido conhecimento de que o lustre estava se deslocando do teto e o ruído do deslocamento, que não seria audível numa situação normal, foi percebido hiperestesicamente pela mãe e, essa percepção hiperestésica foi, através de complexos mecanismos associativos, simbolicamente, traduzida em imagens oníricas. A preocupação maternal, com relação à segurança da criança, naturalmente, a conduziu a agir retirando a criança do leito.

 

UM APARTE, UM ALERTA

 

Os casos aqui discutidos não podem, de forma alguma, serem assemelhados aos trabalhos de "vidência", normalmente oferecidos por meio de panfletos em várias cidades do mundo. Nós os encontramos em Madri, em Barcelona, em Lisboa, em Roma e, naturalmente, de forma abundante, em São Paulo, Salvador, Rio de Janeiro etc.

 

Estes "profissionais" que se autointitulam videntes, ciganos, bruxos e outras denominações mais extravagantes, se utilizam de uma verdadeira parafernália místico-religiosa que, na maioria das vezes, os colocam menos na categoria de "videntes" e mais na categoria de estelionatários. São pessoas de caráter duvidoso, que vendem nas esquinas, e também em ambientes previamente preparados com símbolos místicos, imagens religiosas, amuletos e tudo que possa impressionar os incautos clientes, certezas reveladas por mecanismos ainda mais duvidosos, para o nosso já tão incerto futuro.

 

Recentemente, um canal de televisão paulistano filmou vários "videntes" em ação. É um grande espetáculo de horror. Mas, chamou-me a atenção a forma como tais "profissionais" são maleáveis em relação ao pagamento que recebem em troca de seus presságios, que tratam com naturalidade como sendo contribuição espontânea. Um deles teve a desfaçatez de aceitar, como forma de pagamento, um videogame, escolhido por ele próprio e adquirido pelo consulente no cartão de crédito.

 

E nem precisamos nos esforçar para encontrá-los. Basta estarmos atentos aos postes de energia elétrica, um dos meios que utilizam para expor seus inaceitáveis cartazes. Como se não bastasse, ainda podem ser encontrados com facilidade através da Internet. Muitos, inclusive, autodenominam-se "videntes e parapsicólogos". Daí... é necessário dizer mais alguma coisa?

 

Este aparte, acreditamos, tenha sido necessário em virtude de muitos associarem fenômenos perceptivos de natureza extrassensorial, como nos relatos 1, 2 e 3 e mesmo ocorrências de percepção hiperestésica, como acreditamos ser o caso do relato 4, com tudo que envolve o misticismo, incluindo na mesma cesta básica, a "vidência" antecipada do futuro, oferecida a granel nas grandes, e também nas pequenas, cidades do mundo, com reais fenômenos parapsicológicos. Não há, como vimos anteriormente, nada que os compare.

 

Concluindo

 

Nosso objetivo, neste resumido artigo, limitou-se a uma reflexão sobre o uso do termo alucinação, no âmbito da psicopatologia e sua inadequação, quando utilizado no âmbito da parapsicologia.

 

Assim, vimos que o termo alucinação, em psicopatologia, faz referência a um fenômeno de natureza mórbida, normalmente associado a um estado psicótico.

 

Em parapsicologia, defendemos a não utilização do termo uma vez que nenhum estudo, até o presente momento, associou qualquer estado de natureza mórbida, a vivências ou experiências parapsicológicas.

 

Também pudemos compreender que os estados alucinatórios, em psicopatologia, não estão associados a nenhum tipo de ocorrência no mundo real. Daí serem as alucinações, percepções reais de objetos inexistentes, ou seja, "são percepções sem um estímulo externo".

 

Em parapsicologia, contudo, as percepções visuais, nos casos de experiências perceptivas extrassensoriais, sempre se dão em virtude de um estímulo motivador externo. Independem da proximidade ou não do evento.

 

Notas

 

[1]. As alucinações e os delírios na psicopatologia. in

http://www.cerebromente.org.br/n17/doencas/alucinacoes.html - (26/04/2012)

 

Referências Bibliográficas

 

INARDI, Mássimo. O sexto sentido. São Paulo, Hemus, 1977.

Richet, Charles. Tratado de Metapsíquica. São Paulo, Lake, s.d. Tomo I.

Jacobson, Nils O. Vida sem morte? São Paulo, Círculo do Livro, 1975.

 

José Roberto Baptista é editor da ARTE-LIVROS Editora. Foi professor universitário e Diretor-Acadêmico de tradicionais instituições de ensino superior em São Paulo. É estudioso da fenomenologia parapsicológica e autor, entre outros, do livro Introdução ao Estudo da Parapsicologia (Arké, 2007), além de já ter escrito vários artigos sobre o tema. Dirigiu o IEP-SP - Instituto de Estudos Psicobiofísicos de São Paulo voltado, exclusivamente, ao estudo e ao ensino da Parapsicologia.