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EUGÉNIO DE ANDRADE
Sobre Outros Lábios

Eu crescia para o verão.
Para a água
antiqüíssima da cal
Crescia violento e nu.

Podiam ver-me crescer
rente ao vento,
podiam ver-me em flor
exasperado e puro.

À beira do silêncio,
eu crescia para o ardor
calcinado dos cardos
e da sede.

Morre-se agora
entre contínuas chuvas,
os lábios só lembrados
de um verão sobre outros lábios.

 
Eros Thanatos

1
Ó pureza apaixonadamente minha:
terra toda nas minhas mãos acesa

2
O que sei de ti foi só o vento
a passar nos mastros do verão.

3
Um corpo apenas, barco ou rosa
rumoroso de abelhas ou de espuma.

4
Entre lábios e lábios não sabia
se cantava ou nevava ou ardia.

5
Amo como as espadas brilham
no ardor indizível do dia

6
Seria a morte esta carícia
onde o desejo era só brisa?