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Adelto
Gonçalves (Brasil). Mestre em Língua Espanhola
e Literaturas Espanhola e Hispano-americana e doutor em Literatura Portuguesa
pela Universidade de São Paulo (USP), é autor de Os
vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, José
Olympio Editora, 1981; Taubaté, Letra Selvagem, 2015),
Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro,
Nova Fronteira, 1999), Barcelona brasileira
(Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher
Brasil, 2002), Bocage – o perfil perdido (Lisboa,
Caminho, 2003), Tomás Antônio Gonzaga (Academia
Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2012), e Direito e Justiça em Terras d´El-Rei
na São Paulo Colonial (Imprensa Oficial do Estado de
São Paulo, 2015), entre outros.
E-mail:
marilizadelto@uol.com.br
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ADELTO GONÇALVES
Rodolfo Alonso,
o fabricante de encantos
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I |
Depois de conhecer Antologia
Pessoal, do poeta argentino Rodolfo Alonso, edição bilingue,
com traduções de José Augusto Seabra (1937-2004), Anderson Braga
Horta e José Jeronymo Rivera (Brasília, Thesaurus Editora,
2003), o leitor brasileiro tem a oportunidade de entrar em
contato com Poemas Pendentes, do mesmo autor, igualmente
em edição bilingue, com tradução de Anderson Braga Horta e
apresentação de Lêdo Ivo (1924-2012), que acaba de chegar ao
mercado pela Editora Penalux, de Guaratinguetá-SP.
Um dos maiores poetas latino-americanos do nosso tempo,
Rodolfo Alonso tem tudo para ser o primeiro argentino a ganhar o
Prêmio Nobel de Literatura, mas, a exemplo de Jorge Luis Borges
(1899-1986), Julio Cortázar (1914-1984) e Ernesto Sabato
(1911-2011), corre o risco de ser igualmente esquecido pela
Academia Sueca, que, na América Latina, premiou Gabriela Mistral
(1945), Miguel Ángel Astúrias (1967), Pablo Neruda (1971),
Gabriel García Márquez (1982), Octavio Paz (1990) e Mario Vargas
Llosa (2010).
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II |
Na contracapa, há
um texto de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) em que o
poeta diz que Alonso não usa as palavras pela sensualidade que
desprendem, mas pelo silêncio que concentram. Mais: que “sua
poesia tenta exprimir o máximo de valores no mínimo de matéria
vocabular, impondo-se por uma concisão que chega à mudez”.
Quer dizer, depois de uma
apresentação como essa, não há muito para um resenhista o que
acrescentar. Mas ainda vale a pena reproduzir o que Lêdo Ivo no
prefácio disse dele, a quem chamou, com incontestável precisão,
de “fabricante de encantos”: nesta coletânea, os poemas se
exibem sempre em sua nitidez e concretude, com a rigorosa face
imagística.
Lêdo Ivo, outro grande poeta esquecido pela Academia
Sueca, aponta para o pano de fundo que cerca a poesia de Rodolfo
Alonso, dizendo que sempre aponta para “uma era de emergências e
turbilhões do século XX, como seu extenso catálogo de colisões e
mudanças”. É o que se pode ver neste trecho do poema mais
extenso desta coletânea, “Ocupem-se de Arlt”, de 1977, em que
ele homenageia o romancista Roberto Arlt (1900-1942), que, em
tão pouco tempo de vida, criou obras fundamentais, como Los
siete locos (1929), um romance sobre a impotência do homem
diante da sociedade que o oprime e obriga a trair seus ideais e
a aceitar a hipocrisia burguesa. Eis um trecho:
Recordo a primeira vez que vi
atuar a Aliança
os primeiros noticiosos do pós-guerra
rostos de homens mulheres meninos judeus quase sempre
em ossos atrás de arame farpado
os campos de concentração que nunca esquecerei
como o inextinguível esplendor leproso do cogumelo de
Hiroxima
a primeira vez que foram me buscar no colégio um dia de
chuva
como um casaco para lançar-me aos ombros não tinha capa
Recordo o barulho da chuva sobre o teto de um automóvel
dentro
do qual sou um menino que sobe pela primeira vez num
carro
quando havia poucos carros
e descobre ambas as coisas
a intimidade de um interior em movimento
a intimidade da chuva
a cara íntima que a cidade dá à chuva no outono o prazer
de
escutar chover sobre um teto
Recordo a impossibilidade da prosa para contar tudo isso
Recordo estas duas linhas de Rafael Alberto Arrieta
(“Sol da manhã/ glória do inverno”)
lidas num de meus primeiros livros de leitura
nas quais sem dúvida descobri a poesia
por experiência própria
e de uma vez para sempre
Quisera vir a ler outra vez Os sete loucos (...)
Para o leitor brasileiro – pouco conhecedor da história
argentina –, o tradutor Anderson Braga Horta lembra que a
Aliança aqui citada é uma referência ao violento grupo de
extrema direita Alianza Libertadora Nacionalista, muito ativo à
época do primeiro período do governo de Juan Domingo Perón
(1895-1974), que vai de 1946 a 1955. Acrescente-se
aqui que Rafael Alberto Arrieta (1889-1968) foi um professor e
poeta que chegou a ocupar a presidência da Academia Argentina de
Letras (1964), ligado ao modernismo do nicaraguense Rubén Darío
(1867-1916), que nada tem a ver com o modernismo brasileiro, mas
com a tendência francesa art nouveau.
Composto em parte por poemas mais antigos que não
apareceram em livros anteriores e em parte por poemas recentes,
alguns curtos, de duas linhas, mas não hai kais, este
livro traz ainda uma homenagem – a que poucos poetas brasileiros
fizeram – à cantora brasileira Maria Bethânia, de 2007, em que
se lê:
(...) Há tom, há densidade,
há gravidade, há timbre,
há palavra que canta
e há música que expressa
a pulsação que sentes.
Rege, Bethânia, ordena
a poesia do mundo,
torna o caos em sentido,
a altura em canto fundo,
e faz do intenso, alento (...)
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III |
Poeta, tradutor e ensaísta reconhecido
internacionalmente, Rodolfo Alonso (1934) foi pioneiro na
tradução para o castelhano na América Latina dos poemas de
Fernando Pessoa (1888-1935), especialmente de seus heterônimos,
e de grandes poetas brasileiros, dos quais era amigo como Carlos
Drummond de Andrade, Murilo Mendes (1901-1975), Manuel Bandeira
(1886-1968) e Lêdo Ivo.
Publicou mais de 30 livros. Traduziu poemas do francês,
italiano e galego. Foi editado não só na Argentina como no
Brasil, Bélgica, Colômbia, Espanha, inclusive em galego, México,
Venezuela, França, Itália. Cuba, Chile e Inglaterra. Destacam-se
as suas celebradas traduções de grandes poetas como Giuseppe
Ungaretti (1888-1970), Cesare Pavese (1908-1950), Paul Eluard
(1895-1952), Eugenio Montale (1896-1981), Charles Baudelaire
(1821-1867) e Guillaume Apollinaire (1880-1918), entre outros.
Entre as distinções que recebeu, estão o Prêmio Nacional
de Poesia e o Prêmio Único Municipal de Ensaio Inédito (por
La voz sin amo), da Argentina, a Ordem Alejo Zuloaga da
Universidade de Carabobo, na Venezuela, e Palmas Acadêmicas, da
Academia Brasileira de Letras. Seu último livro de poemas, El
arte de callar, obteve o Prêmio Festival Internacional de
Poesia de Medellín, na Colômbia.
Seu arquivo pessoal (textos e fotos) encontra-se em fase
de catalogação na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.
Recentemente, foi lançada em inglês The art
of keeling quiet (Salt, Cambridge, 2015). Na França, saíram
no mesmo ano L´art de se taire, com prólogo de Juan José
Saer (Paris, Reflet de Lettres), e Dernier tango à Rosario
(Paris, Al Amar) e está para ser lançado Entre les dents,
com prólogo de Juan Gelman (Toulouse, Po&psy/Erès). Na Espanha,
saiu em idioma galego Cheiro de choiva (Cangas,
Barbantes, Cangas, 2015) e está prevista a publicação de
Tango do galego fillo (Cangas, Rinoceronte). Dirigiu sua
própria editora, com um catálogo de mais de 250 livros.
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Poemas Pendentes,
edição bilingue, de Rodolfo Alonso.
Tradução e notas de Anderson Braga Horta, com apresentação
de Lêdo Ivo.
Guaratinguetá-SP: Editora Penalux, 2016, 198 págs.
E-mail:
penalux@editorapenalux.com.br
Site:
www.editorapenalux.com.br
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