REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


ns | número 63 | março-abril 2017

 



Shuntarō Tanikawa
(Japão). Nasceu a 15 de Dezembro de 1931, em Tóquio. É poeta e tradutor, sendo frequentemente referido quando se fala no Prémio Nobel.O seu livro Floating the River in Melancholy, traduzido por  William I. Eliott & Kazuo Kawamura, ganhou o  American Book Award em 1989. Tanikawa escreveu já mais de 60 livros de poesia e traduziu os Peanuts de Charles Schulz e os poemas infantis da Mother Goose.

SHUNTAR0 TANIKAWA

 

Seis poemas de Minimal 


Traduções para português por Francisco José Craveiro de Carvalho, com base em traduções para inglês de William I. Elliott & Kazuo Kawamura. 

 

Trapos

 

A poesia

chegou

antes do amanhecer

 

 

vestida

de

palavras sórdidas.

 

Nada tenho

para lhe dar.

Dão-me antes

 

o seu corpo nu

vislumbrado

entre farrapos.

 

Mais uma vez

lhe remendo

os trapos.

 

Rejeitar

 

Uma montanha

não rejeita

a poesia;

 

nem as nuvens

a água

ou as estrelas.

 

São sempre

as pessoas

que a rejeitam,

 

com medo,

ódio

e palavrosas.

 

Sentado

 

Estou sentado num sofá

como uma amêijoa na concha

nesta tarde parcialmente enevoada.

 

Tenho coisas para fazer

mas, encantado,

não faço nada.

 

As coisas belas são belas.

Mesmo as coisas feias

têm  em si algo de belo.

 

Só estar aqui

é extraordinário

e deixo de ser eu.

 

Levanto-me

e bebo água.

Até a água é fantástica.

 

E

 

Quando chega o verão

as cigarras

voltam a cantar.

 

Fogos de artifício

congelam

na minha memória.

 

Os países distantes atenuam-se

mas o universo

está mesmo à frente  do nosso nariz.

 

Que bênção

podermos

morrer

 

deixando

apenas a conjunção

“e”.

 

Uma canção

 

Alguém

está

a cantar-me

 

tons das nuvens

e a harmonia

das árvores.

 

Um dia

parará,

o pulsar do coração.

 

Mas a canção continuará

em teu

louvor.

 

A melodia da água

desliza

pelo leito do rio.

 

Sobre as ruínas

a pausa da noite

ressoa.

 

Uma face

 

Uma face –

a única

no mundo...

 

Uma face –

um afloramento

do destino...

 

Desorientada

pela luz  fraca

na profundidade do espelho,

 

incapaz

de procurar

outra face,

 

espero,

na noite do coração

o último raiar do solo.

 

 
 
 

EDITOR | TRIPLOV

 
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