Confrades amigos/as
Juan Carlos Garcia Hoyuelos, poeta espanhol nascido em Basauri
(Vizcaya) em 1968 e residindo em Burgos, tempo atrás meteu
ombros a um projecto chegado há dias a bom porto: dar a lume
uma antologia, acompanhada de um CD protagonizado por trinta
e três cantores destacados - de qualidade, seria melhor
dizer, de Gonçalo Salgueiro a Liliana Benveniste, de Filipe
Gonçalves a Gabriel Moreno... - dando corpo ao seu poemário
"Aire, fuego y deseo" com traduções em todas as
línguas faladas na Ibéria.
Fui um
dos tradutores para a língua lusa. A par de confrades como
Maria Estela Guedes, João Rasteiro, Sónia Bettencourt,
Carlos Nogueira Fino, Gabriela Rocha Martins, Luís Reis,
Zilda Joaquim, Xavier Zarco, Inês Ramos e José Viale
Moutinho.
Tanto
quanto é de minha informação, a obra tem sido extremamente
bem recebida nas diversas Feiras do Livro havidas em
Espanha, estando previsto o seu futuro lançamento em
diversas cidades portuguesas.
Para
dois minutos de eventual leitura, aqui vos deixo os 3 poemas
que tive o gosto de verter para a nossa língua.
Vai, com
a estima de sempre, o abraço estival com desejos de
magnificente Verão do
ns
APROXIMA-TE,
SEJA COM A VERDADE OU COM A MENTIRA
Diz-me,
ainda que seja uma mentira
de amor com
sons de certeza.
Hoje, como
nunca, necessito
das tuas
palavras, tenho de rodear-me
dos teus
montes de nevoeiro.
Deixa uma
verdade de amor na minha respiração,
um placebo
nas minhas dúvidas,
aquelas que,
tolo de mim, num dia são ferida
sem cura
possível,
e num dia
diferente, não muito distante
da ruína
evidente, levianas intrigas.
Aproxima-te,
ainda que a hena das tuas carícias
leve
embebida uma morte súbita,
ama-me como
eu te sinto agora,
deixemos
feridos os nossos lábios
de tanto
provocarem vendavais de lume.
E quando o
leito não consiga
distinguir-nos, desfolhemos nós
essa mentira
até dar
com o seu
oculto pensamento.
O CULPADO
Será pelos
arquejos do ar que respiro
ou pelo
bailado do piano que desde o antigo
hangar da
memória continuo a escutar,
será a tua
ausência ou o precário esquecimento
que me
atraiçoa ante a menor adejo
que a brisa
provoca na minha roupa, morada das tuas caricias
farrapos das
nossas loucuras,
será por
tudo isso,
ou porque
não sei viver sem o teu mistério…
os meus
olhos deitam-se num desconsolo, vagueando por sonhos
que nunca
lhes pertenceram,
ou ainda
pior, tenho a sensação
de ter
desapossado
quem agora
acompanha os teus.
Pergunta-lhe
que sonhos tem, pergunta-lhe,
e se em
nenhum deles eras cúmplice
eu dois
delitos confesso:
arrombamento
de moradia
e ter-lhe
dado a morte de cada vez que dorme.
Sim, culpado
por procurar-te
na
intimidade da tua cama,
culpado
porque os meus despertares
são tão
alegres como tristes são as noites
que se
prendem ao calor da almofada.
PODE SER QUE
…
Pode ser que
por serem tão iguais,
o fogo se
haja extinto em nossos olhos,
pode ser…que
as palavras exactas,
as mais
necessárias,
antes tão
usuais e espontâneas
se hajam
quebrado em mil pedaços
por lhes
faltar o ar
Nós nos
esforcemos por
encontrar
uma razão
nos
plurais
ou em
esperar
quem
no fim
se
apropriará
da última
palavra;
era um facto
mais que evidente
que ambos
fômos uns náufragos
aprisionados
na mesma ilha
Nem sequer
seria
justo
dizer que
vivíamos
num
equívoco;
lembra-te
dos beijos
que
derrubaram
o pulso
meticuloso
da noite
e dos
olhares
cúmplices
que não
precisavam de
outro
vocabulário
Embora
assegures
que o
amor
não
dura toda
uma vida
(começo
a pensar que
tens razão),
pode ser que
ao dividir-se o dia
na lonjura
a escassos
metros do seu ponto final
ainda fiquem
contudo
beijos rebeldes
esperando
na
retaguarda
Pode
ser…
Juan Carlos
Garcia Hoyuelos
Tradução de
Nicolau Saião para a antologia “Aire, fuego e deseo”
(Em todas as
línguas usadas na Ibéria, do ladino ao português)
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