REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


Nova Série | 2010 | Número 03

 

A

quando a favela aqui do lado da Globo pegou fogo foi um perereco as pererecas se debandaram e foram embora mas devem ter morrido no Pinheiros de fome de poluição não que aqui poluição é moeda corrente é alimento pros abastados bastardos dos imigrantes Bebês de Rosemary dos yankees a eles não falta nada nada pedem e recebem tudo quem nada tem tudo perde ad aeternum 

B

a prefeitura até que tentou ser rápida deu um jeito dos coitados comerem coitadinhos pra eles que trouxeram umas marmitas praqueles que perderam o fogão que não tinham fubá que queriam ajuda pra cuidar da própria vida muito ajuda quem não atrapalha não são coitados serem tratados de coitados é que faz da política o que é e é o que é por que ninguém quer destruir a estrutura estrutura dos grandes conglomerados empresariais viva os bastardinhos de gravata listrada camisa salmão terno de linho terninho e saia porque tá cheio de bastardinhas agora meu batom caro comprado com os 50 salários de 100 dos coitadinhos assalariados-mínimos da região e o William e a Fátima achando ruim do Hugo ter desmamado meia dúzia de malandros das refinarias e o escambau o poder é uma merda taxaram o cara de ditador o povo engole como essa marmita azeda de burguês das pastorais das associações das Ongs english eggs

DIRECÇÃO

 
Maria Estela Guedes  
   
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Homero Gomes

EULULARIA

 

(Ao som de Take The Power Back, de Rage Against The Machine)

                                                       

 
 
 
 
 
 
 

C

eu tô quase perdendo a bunda dinheiro na mão calcinha no chão 

D

vinha gente da banda nobre da favela e roubava a marmita dos que tavam com fome desigualdade entre classes pegue o poder de volta mané vai aceitar calado aleijado não desprovido momentaneamente do poder porra cara eles querem só economizar da despensa que às vezes nem dá pro mês mas a prefeitura tá dando vamu pegar geral é nosso eles têm que dar eu vou pra cidade defender uma grana como por lá não quero receber esmola meu filho tá desnutrido com verminose o médico do postinho disse que eu tenho que dá comida de gente pra ele manda seu filho comer na casa do mediquinho então o que andam ensinando nas escolas não está fazendo nada pro povo educação não transforma não nesses moldes dos PCNs é o dircurso sufocante da elite o discurso que pobre é pobre tem que ficar no sinal esmolando porque é vagabundo mesmo não presta não se esforça o rico é o melhor que o país possui coitado do país a mensagem continua batendo martelando brilhando na tela 20 polegadas do barraco que pegou fogo que bom que salvei a televisão agora dá pra ver o que aconteceu com a gente no jornal se tá na Globo do jeito da Globo na versão da Globo então é verdade Ave Marinho 

E

é foda hoje eles diziam acredite hoje eu não vou precisar cozinhar e as empregadinhas personagens da Globo continuam paltando disseminando apregoando lavando a mente de prenconceitos nordestinas e negras para pobre acreditar que vale menos que o rico que direito eles têm de mostrar isso que direito têm que direito têm de ganhar centenas de vezes mais o que faz o trabalho deles mais importante útil essencial Gugu ganhando quase 5 milhões de reais por mês e pra mostrar o que o que nadanada de nada passatempo embrutecedor alienador eletrônico o Brasil não precisa dele não precisa de um baixinho polaco fingindo pra ele mesmo que realmente está fazendo algo muito bom que está fazendo a diferença que está transformando o Brasil transformando o Brasil num país de merda ele não faz nenhuma diferença para a nação eu seria muito infeliz no lugar dele dele e de centenas de engravatados cheios de si prefiro ser infeliz sem essa minha marmita podem levar 

F

bom praqueles que acham que pobres se ajudam cuidado pra não deixar o barraco aberto ninguém se ajuda se ajuda é pra garantir favores futuros rabo preso meu irmão isso eu não tenho é pena é sempre bom ter o rabo penhorado com alguém deixarem socar até o ar sumir do peito o reflexo da janela do carro é enrugado sujo pra sentir o cheiro é impossível a cidade fede demais o carro segue ignora não é comigo que culpa tenho eu esse vagabundo tem que trabalhar não sabe fazer outra coisa a não ser ficar pedindo trocado nem trocado nem dado vá te catar mas amanhã senhor vai ser tu comendo merda pode escrever 

G

isso é uma doença o mal tá incrustado no ser arraigado até os cabelos 

F

mas os ricos são espertos se ajudam um lambendo o saco do outro enquanto o ouro vai se formando no rabo a moeda vira vira e o troca-troca continua um cuspinho aqui manteguinha ali vaievem deslizando tranquilo sem drama mas o troca-troca é tão sem lógica que é melhor cuidar muito bem rico só cuida de rico rico que vira pobre se fode duas vezes rico só fica mais rico só ganha dinheiro quem tem dinheiro quem tem um fusca não pode ter um Mercedez a não ser que o engravatado se foda caia na merda e começe a andar de bike cuidado senhor fique de olho na bolsa seu deus money está pouco se lixando contigo a lógica dele é outra tu é mais um macaquinho do sistema um puppet animado à base de consumo e ele sabe disse e é zombeteiro adora brincadeirinhas dar sustinho em madame

 

 

Homero Gomes - (Curitiba/PR - Brasil, 1978).
Vem colocando trechos de seu livro «Jamé Vu» na Internet, enquanto ele permanece no prelo <www.twitter.com/hgomesjamevu>. Escreveu Sísifo Desatento (contos) – finalista do Prêmio Sesc de Literatura edição 2007 – <www.twitter.com/sisifodesatento>, Três (teatro), Mimesis (poemas e micro-prosa-poética) e A jornada de A Bao A Qu (infanto-juvenil). Colaborou com os periódicos brasileiros Rascunho, Cult, Ficções e, atualmente, é colunista de O Bule <www.o-bule.blogspot.com>.
Contato:
homero.gomes@gmail.com

 

 

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