do escarro e do mijo não reza a história do mundo.
da esporra há ténues vislumbres
entre os dentes de uma narrativa
cujas pernas se abrem a qualquer membro sem sombra.
o sarro permanece no copo
por onde bebemos o último vinho.
(deixou nódoas nas paredes e no tecto da casa
que nem várias camadas de tinta conseguiram ocultar.
a merda, mesmo limpa, continuará sendo merda.
não vale a pena escondê-lo.)
é preciso descalçar
as frases, mesmo que os pés sejam feios.
mostrar a trampa
que cobre uma parte do mundo, os ossos
(mordidos pelos cães?) que alguém lançou no carneiro.
e, no entanto, há luz no meio do entulho: livros
colocados numa mão incerta
cuja humidade permite o nascimento
de fungos e, mais tarde, de pequenas plantas
(haverá por ali um grão de mostarda
ou outra semente cuja árvore um dia reconheceremos?)
livros – e tecidos impuros
com húmus e estrume
no meio da batalha.
fósforo e amónio não fertilizam
a linguagem. só um estrume ácido
(ou a acumulação de matéria orgânica sobre o solo)
dá garantias de crescimento.
mesmo que no teatro da existência escolhamos
vestes apodrecidas – e o cheiro da flatulência e dos excrementos
afaste a multidão
(tão tarde vos chegastes, quando a minha carne
trazia apenas um odor que vos agradava)
são essas as palavras que interessam
descobertas, com paciência, entre
quilos e quilos de trampa. |