Portugal é particularmente rico em fósseis de dinossáurios, quer se trate de restos osteológicos (ossos e dentes), quer icnológicos, ou seja, vestígios da sua existência, como são as pegadas, os ovos ou os gastrólitos (pedras que ingeriam para com elas triturar os alimentos, à semelhança do que faz a moela das galinhas). A variedade e quantidade dos achados torna o nosso país uma das regiões da Europa com mais interesse na Paleontologia e na Paleobiologia destes animais. Todavia, continuamos sem estruturas devidamente apetrechadas em equipamentos e meios humanos capazes de corresponder a esta riqueza.
Nos últimos anos, mercê de apoios financeiros e encorajamentos das Fundações para a Ciência e a Tecnologia, Luso-Americana para o Desenvolvimento e Calouste Gulbenkian e de algumas autarquias como as da Batalha, Lourinhã, Pombal, Sesimbra, Sintra e Torres Vedras tem sido possível trazer à luz do conhecimento páginas valiosas da nossa história mais antiga.
Num número que não ultrapassa os dedos de uma mão, os paleontólogos nacionais neste capítulo da Ciência dos fósseis e alguns colegas e amigos do exterior são os protagonistas desta luz que teima em não se apagar, não obstante a "falta de oxigénio" que sempre caracterizou a nossa investigação científica neste domínio.
Um panorama do que tem sido o trabalho de recolha e estudo destes achados reduz-se aos acervos expostos no Museu do Instituto Geológico e Mineiro, no Museu da Lourinhã (GEAL) e no Museu Nacional de História Natural da Universidade de Lisboa.
A descoberta dos primeiros vestígios de dinossáurios, no nosso território, remonta à segunda metade do século XIX, e refere-se, por exemplo, a achados, na zona da Lourinhã, do geólogo Carlos Ribeiro ou à jazida com pegadas de dinossáurios terópodes (carnívoros) do Jurássico superior do Cabo Mondego (Figueira da Foz). Esta última foi estudada por Jacinto Pedro Gomes, naturalista do então Gabinete de Mineralogia e Geologia da Escola Politécnica, hoje um departamento do Museu Nacional de História Natural, e representa uma das primeiras investigações, à escala mundial, nesta área da Paleontologia. No que se refere aos primeiros estudos de restos ósseos, esse mérito pertence ao paleontólogo francês H. E. Sauvage, ao serviço da antiga Direcção dos Trabalhos Geológicos de Portugal (actual Instituto Geológico e Mineiro) e cuja publicação data de 1898.
Após quase meio século de inactividade neste domínio, o interesse pelo estudo dos dinossáurios ressurge, na mesma instituição, nos anos 40 e 50 do século XX, então com a designação oficial de Serviços Geológicos de Portugal. G. Zbyszewski e A. F. de Lapparent são os autores deste período áureo da Paleontologia portuguesa. A seguir a novo período de duas décadas de algum silêncio, o último quartel do século que acabou de findar ficou marcado pela publicação de numerosos achados e estudos em torno desta temática. Neste período são de salientar os trabalhos levados a cabo sob as tutelas do Museu Nacional de História Natural da Universidade de Lisboa e do Museu da Lourinhã (GEAL). A par desta vertente de investigação, menos conhecida do grande público, assistiu-se, na última década, à sua conveniente mediatização nos jornais, na rádio, nas televisões e, sobretudo, nas exposições, com reflexos no maior interesse por parte das entidades financiadoras da investigação e melhor compreensão das administrações central e local, face à preservação e musealização do nosso património geológico e paleontológico.
Na Orla Meso-cenozóica Ocidental são muitas as ocorrências de fósseis de dinossáurios. Desde o Jurássico inferior (numa época em que a abertura do Oceano Atlântico ainda não tinha atingido estas latitudes e os dinossáurios eram livres de circular entre terras da Europa e da América do Norte) até ao Cretácico superior, já com um mar profundo entre os dois continentes, as terras baixas, planas e em parte alagadiças, de então, foram palco de vastos ecossistemas, nos quais os dinossáurios foram protagonistas de relevo.
O mais antigo vestígio deste tipo de animais (ainda hoje enigmático) foi recolhido no Jurássico inferior (200 Ma) de S. Pedro de Muel e talvez corresponda a um ancestral dos dinossáurios couraçados, a que foi dado o nome de Lusitanosaurus. Do Jurássico médio (175-180 Ma) apenas se conhecem dois importantes trilhos com pegadas. Na Serra d'Aire, a conhecida Pedreira do Galinha pôs a descoberto vinte pistas de saurópodes (herbívoros, quadrúpedes), duas das quais consideradas as mais longas conhecidas. Classificada como Monumento Natural, parcialmente musealizada, esta jazida está a cumprir a sua função pedagógica e cultural, com cerca de 50000 visitantes/ano. Da mesma altura, merece destaque a imponente jazida com pegadas de terópodes (carnívoros, bípedes) de média estatura, de Vale de Meios (Alcanede), rica de marcas tridáctilas, profundas e bem desenhadas, muitas organizadas em pistas paralelas, evidenciando o carácter gregário destes dinossáurios. O estudo, em curso, desta jazida permitirá conhecer melhor a fauna de dinossáurios num momento da história da Terra que no nosso país é muito parco em vestígios deste grupo de animais
Do Jurássico superior (140-150 Ma) são conhecidas várias ocorrências ósseas de terópodes, um deles recentemente estudado, proveniente de Andrés (Pombal), identificado como Allosaurus fragilis, a mesma espécie conhecida em formações contemporâneas na América do Norte, uma descoberta a corroborar a então continuidade das terras, hoje de um lado e outro do Atlântico. Entre os terópodes refere-se, ainda Lourinhanosaurus, género criado em 1998 pela equipa do GEAL (Lourinhã) a partir de fósseis recolhidos naquela região. Da mesma época, merecem destaque grandes saurópodes como Brachiosaurus (?) , Lourinhasaurus e outros identificados como Hypsilophodon, Camptosaurus, além do estegossaurídeo Dacentrurus com longos espinhos ósseos no dorso, e do anquilossaurio nodossaurídeo Dracopelta, caracterizado pela respectiva couraça óssea. Localidades, como Alenquer, Alfeizerão, Areia Branca, Baleal, Cambelas, Lourinhã, Ourém, Pombal, Ribamar, S. Martinho do Porto e Torres Vedras ganharam notoriedade entre os paleontólogos de todo o mundo. As regiões de Torres Vedras, da Lourinhã e de Pombal são, hoje, uma referência nacional no que concerne as jazidas de dinossáurios, com relevo para a ocorrência de ninhos de ovos de terópodes em Paimogo-Lourinhã, no interior dos quais foi possível reconhecer os esqueletos dos respectivos embriões. Próximo desta localidade, em Porto Dinheiro, os trabalhos de escavação de um saurópode conduziram à descoberta de dezenas de gastrólitos, representados por seixos rolados no início da década de 90 do século XX.
Também a mina de carvão (lignito) da Guimarota, em Leiria, célebre pelos restos fósseis de mamíferos primitivos do Jurássico superior, tem fornecido abundantes restos de dinossáurios, nomeadamente dentes. Como jazidas com pegadas de dinossáurios desta época, para além da histórica ocorrência do Cabo Mondego, destaca-se a da Pedra da Mua, no Cabo Espichel e a da Pedreira do Avelino, em Zambujal (Sesimbra), ambas com vestígios de saurópodes, classificadas como Monumentos Naturais mas a aguardar a conveniente e necessária musealização.
Do Cretácico inferior (com 110 a 130 Ma) são de assinalar restos osteológicos atribuídos a terópodes, saurópodes camarasaurídeos e/ou braquiosaurídeos e a um ornitópode (herbívoro bípede) do género Iguanodon e, ainda, duas importantes jazidas com pegadas, uma em Lagosteiros (Sesimbra), classificada como Monumento Natural e outra no extremo sul da Praia Grande (Colares), ambas com carnívoros e herbívoros.
Com idade atribuída à base do Cretácico superior (95 Ma), a jazida com pegadas de dinossáurio de Pego Longo (Carenque, Sintra) igualmente classificada como Monumento Natural, constitui outra importante referência do nosso património geológico, com um dos mais longos trilhos conhecidos em formações desta idade, há dez anos à espera da desejada musealização.
Nas regiões de Aveiro, Taveiro e Viso, em formações do topo do Cretácico superior (70 Ma), foram encontrados restos de pequenas dimensões atribuídos, entre outros, a terópodes e saurópodes.
Na Orla Mesocenozóica Meridional, onde ainda não haviam sido localizados vestígios fósseis destes animais, foram recentemente encontrados, no Concelho de Vila do Bispo, três trilhos atribuíveis a saurópodes na Praia da Foia do Carro (Jurássico superior - 150 Ma), pegadas tridáctilas de pequenos carnívoros e um trilho constituído por oito pegadas de um bípede herbívoro semelhante a Iguanodon na Praia da Salema e quatro outros trilhos atribuíveis a ornitópodes, também iguanodontídeos, n a Praia Santa. As duas últimas jazidas são do Cretácico inferior (110 Ma) e contribuíram com a primeira evidência inequívoca de pistas de iguanodontídeos em Portugal. |