MARIA ESTELA GUEDES
Foto: Ed. Guimarães
Música: http://triplov.com/letras/mario_montaut/Estela/index.htm

O município de Vila Nova de Foz Côa com os poetas
O concelho de Vila Nova de Foz Côa é de referência, declaram Presidente e Vice-presidente da Câmara. É o único em Portugal com dois patrimónios mundiais - gravuras paleolíticas do Côa e paisagem construída no Douro. Além das ações regulares relacionadas com eles, o concelho tem ainda a Festa da Amendoeira, no início da primavera, 15 dias de feira e festas populares, outras iniciativas (concentração de motards em fins de maio, coincidindo com o encontro de poetas, observação casual), atividades próprias do Centro Cultural, e o Festival de Poesia.

Adstrito aos recintos paleográficos, abriu o ano passado um museu de nível internacional, criado em edifício de arquitetura notável, que já foi justamente premiado: críptico, alapado no cimo do monte de onde se avista uma soberba paisagem, e em especial o ponto em que o Côa funde as suas nas águas do Douro, o Museu do Côa é uma grandiosa mole de cimento que não ofende a paisagem e de longe não se vê, confundido com ela.

Foi em dois jantares no restaurante do Museu que fiquei inteirada, pelos responsáveis camarários, do que significa exatamente a expressão "concelho de referência", se bem que parte do seu conteúdo constitua para mim experiência vivida, no decurso não só do Festival de Poesia como de outras ações, na Escola Secundária, a convite de Jorge Maximino. A título particular, também visitei um dos setores paleográficos abertos ao público, a Canada do Inferno. As visitas precisam de marcação prévia, porque limitadas pela necessidade de guia e pelo número de lugares nas viaturas do Parque. É uma experiência marcante ter a delicadeza das gravuras ao alcance dos dedos, aflorando na imensidão dos montes que marginam o rio.

O Festival de Poesia celebrou este ano o seu 30º aniversário, o que exige louvor e agradecimentos ao seu mentor, Jorge Maximino, que conheço desde a primeira edição, famosa pela impressionante atuação de Natália Correia. Movimenta umas centenas de pessoas, entre participantes e pessoal de receção e apoio. Centrado na poesia angolana e sua edição, contou neste mês de maio de 2014 com a presença, entre mais, de um angolano cuja história já marcou profundamente a da literatura portuguesa, desde que o Prémio da Sociedade Portuguesa de Escritores foi atribuído ao seu romance Luuanda. O facto provocou o interrogatório de jurados por parte da Polícia política e motivou o encerramento da Sociedade - refiro-me a Luandino Vieira, naturalmente, que esteve em Vila Nova de Foz Côa como editor da Nossomos. Para divulgação, foram oferecidos livros recentes, graficamente impecáveis, de poetas angolanos: Zetho Cunha Gonçalves, David Capelenguela e Nok Nogueira, que estiveram presentes no Festival, e de Agostinho Neto, Manuel Rui, M. António, Aires de Almeida Santos, Viriato da Cruz e António Jacinto. Participou no debate sobre a poesia angolana José Carlos Venâncio, que também apresentou o livro em lançamento, Meu amor da Rua Onze, de Aires de Almeida Santos.

Os poetas tiveram vários encontros com os alunos da Escola Secundária, onde foram cordialmente recebidos pelo diretor, Jorge Silva, e pelos professores, em especial Rui Pinto, responsável pelas aulas de Português mais avançadas. Leituras no Centro Cultural, no café Terrinca, que habitualmente recebe os poetas, no Aldeia Douro Restaurante, no Museu do Côa, no barco rabelo "Senhora da Veiga" e no Centro Cultural, deram corpo ao encontro, animado com Aurelino Costa, poeta e diseur, e com o belo show de Aldo Milá e João Branco, músicos angolanos. Encerrou o espetáculo a boa surpresa dos professores, que brindaram o público com divertidas danças do seu recém-criado Rancho Folclórico e Etnográfico do Agrupamento de Escolas de Vila Nova de Foz Côa.

Uma nota agradada aos responsáveis superiores da autarquia, que não se limitam a patrocinar e a fazer discursos de circunstância: Gustavo Duarte, Presidente da Câmara, e João Paulo Sousa, Vice-presidente, estiveram presentes nos jantares, e é no final que habitualmente os poetas dizem os seus textos, na sessão de leituras de Zetho Gonçalves no restaurante Aldeia Douro e no concerto de Aldo Milá, pelo menos, convivendo com prazer. Outros nem querem ouvir falar de cultura, patrocinam de péssima vontade e não se dignam estar presentes em momento nenhum, sem se darem conta de que a principal parcela da crise não é a falta de dinheiro, é a falta de cultura.

Falta, sim, o mais importante, a chave de ouro para este município exemplar em todos os domínios, onde se come bem em toda a parte, desde o mais modesto ao mais luxuoso restaurante e onde a Internet é gratuita para todos: Vila Nova de Foz Côa é um concelho que devia servir de exemplo ao próprio Governo, pelo que já se contou e pelo que fecha este artigo: não tem dívidas.

Casa dos Banhos . 27 de maio de 2014
 
MEMÓRIA AUDIOVISUAL DO FESTIVAL

OS POETAS
http://www.youtube.com/watch?v=zxWPI55nTBU&list=UU4X6m9lrj5c7XW1AvXXSVdw&feature=share
 
RANCHO FOLCLÓRICO E ETNOGRÁFICO DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE VILA NOVA DE FOZ CÔA
http://www.youtube.com/watch?v=CuJLe5uydoQ&feature=share&list=UU4X6m9lrj5c7XW1AvXXSVdw&index=1
 
 
MUSEU DO CÔA COM O FESTIVAL DE POESIA
http://www.youtube.com/watch?v=1oqW7SRIWts&list=UU4X6m9lrj5c7XW1AvXXSVdw&feature=share
SITE OFICIAL DE VILA NOVA DE FOZ CÔA
https://www.google.pt/#q=vila+nova+de+foz+coa
Índice antigo

Maria Estela Guedes (1947, Britiande / Portugal). Diretora do Triplov

Membro da Associação Portuguesa de Escritores, da Sociedade Portuguesa de Autores, do Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de Aquino. Directora do TriploV.

LIVROS

“Herberto Helder, Poeta Obscuro”. Moraes Editores, Lisboa, 1979;  “SO2” . Guimarães Editores, Lisboa, 1980; “Eco, Pedras Rolantes”, Ler Editora, Lisboa, 1983; “Crime no Museu de Philosophia Natural”, Guimarães Editores, Lisboa, 1984; “Mário de Sá Carneiro”. Editorial Presença, Lisboa, 1985; “O Lagarto do Âmbar”. Rolim Editora, Lisboa, 1987; “Ernesto de Sousa – Itinerário dos Itinerários”. Galeria Almada Negreiros, Lisboa, 1987 (colaboração e co-organização); “À Sombra de Orpheu”. Guimarães Editores e Associação Portuguesa de Escritores, Lisboa, 1990; “Prof. G. F. Sacarrão”. Lisboa. Museu Nacional de História Natural-Museu Bocage, 1993; “Carbonários : Operação Salamandra: Chioglossa lusitanica Bocage, 1864”. Em colaboração com Nuno Marques Peiriço. Palmela, Contraponto Editora, 1998; “Lápis de Carvão”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2005; “A_maar_gato”. Lisboa, Editorial Minerva, 2005; “À la Carbonara”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2007. Em co-autoria com J.-C. Cabanel & Silvio Luis Benítez Lopez; “A Boba”. Apenas Livros Editora, Lisboa, 2007; “Tríptico a solo”. São Paulo, Editora Escrituras, 2007; “A poesia na Óptica da Óptica”. Lisboa, Apenas Livros Lda, 2008; “Chão de papel”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2009; “Geisers”. Bembibre, Ed. Incomunidade, 2009; “Quem, às portas de Tebas? – Três artistas modernos em Portugal”. Editora Arte-Livros, São Paulo, 2010. “Tango Sebastião”. Apenas Livros Editora, Lisboa. 2010. «A obra ao rubro de Herberto Helder», São Paulo, Editora Escrituras, 1010; "Arboreto». São Paulo, Arte-Livros, 2011; "Risco da terra", Lisboa, Apenas Livros, 2011; "Brasil", São Paulo, Arte-Livros, 2012; "Um bilhete para o Teatro do Céu", Lisboa, Apenas Livros, 2013.

ALGUNS COLECTIVOS

"Poem'arte - nas margens da poesia". III Bienal de Poesia de Silves, 2008, Câmara Municipal de Silves. Inclui CDRom homónimo, com poemas ditos pelos elementos do grupo Experiment'arte. “O reverso do olhar”, Exposição Internacional de Surrealismo Actual. Coimbra, 2008; “Os dias do amor - Um poema para cada dia do ano”. Parede, Ministério dos Livros Editores, 2009. Entrada sobre a Carbonária no Dicionário Histórico das Ordens e Instituições Afins em Portugal, Lisboa, Gradiva Editora, 2010; «A minha vida vista do papel», in Ana Maria Haddad Baptista & Rosemary Roggero, Tempo-Memória na Educação. São Paulo, 2014.

TEATRO

Multimedia “O Lagarto do Âmbar, levado à cena em 1987, no ACARTE, Fundação Calouste Gulbenkian, com direcção de Alberto Lopes e interpretação de João Grosso, Ângela Pinto e Maria José Camecelha, e cenografia de Xana; “A Boba”, levado à cena em 2008 no Teatro Experimental de Cascais, com encenação de Carlos Avilez, cenografia de Fernando Alvarez  e interpretação de Maria Vieira.