::::::::::::::::::::Eduardo Aroso
NESTA HORA QUASE DE NATAL
Não é o frio que impede a leveza do corpo,
nem as trombetas de mentira
fazem desfalecer a alma.
Hoje escrevo em forma de pedido:
deixem-me só
sem palavras compradas
sem os ouvidos agredidos.
Deixem-me repousar com a natureza
e os seus penedos quietos
de recolhida beleza.
Deixem-me só
sem novos Herodes e os seus decretos.
Quero nascer
nesse leito antigo que é de sempre
para quem o souber tecer.
Retirem as cataratas orgulhosas
que foram crescendo sobre o mundo.
Quero ver a limpidez das estrelas
e anseio ver o rosto das crianças
outra vez reflectido de esperança.
Deixem-me só, que desta maneira
eu toco o coração por dentro,
tacteando sem distracções.
Eu vou pelo subtil caminho
dos anjos e das orações
Sem nada, estou mais livre
de me acrescentarem a ferida,
e caio na gruta sem arrepios.
Lá onde não há calor ou frio,
o berço de tudo é a flor da vida.
Deixem-me só.
Apenas com o sopro original,
nesta hora quase de Natal.
 Coimbra, 16 –12-06
Eduardo Aroso