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ERNESTO DE SOUSA
33 Folhas: X ou a incógnita

re capítulo

faltava acrescentar
a palavra é
333333333333333333333;...313;...3
 
e um código
e o inventário... 3172... 1/3 L

fotografia....prata....ausência......presença
palavras...tempo...tempo
e o som talvez da tua voz
máquinas e números

dedico este livro de meditação profunda
ao teu corpo

a todas as MINHAS mulheres
a todas as mulheres, portanto
a mim
ao meu corpo
com efeito
desde há muito que toda a filosofia
se ME resume nesta ideia
que descobri atraiçoando o pensamento
de Aragon
que a inventara atraiçoando o pensamento de Marx:
o MEU destino é o de TODAS as mulheres
(é um axioma anti-narcisista
Marx já o sabia
o destino do homem é o homem)

corolário do anterior
cito agora Romain Rolland
a alma existe..................é o corpo

o corpoo....a mulher
corpo frágil do mundo
é redondo

tem a fortaleza das pedras
é terra

António Nobre
também eu
apetece-me comer terra algumas vezes

sim
o teu corpo
é a casa......onde habito.......................a minha
mas eu sou a casa
habitada

o lado de dentro
da paisagem

estendo a mão..............para a paisagem
e habito
a
 
os meus gestos 
são
o teu corpo

a minha carícia é redonda
por dentro

porque o seu fim
é um começar
é um caminhar
no teu corpo

na sombra luminosa
do teu corpo
 
é um leve rumor de anatomia
aprendida devagar

como se tudo o que vamos inventar já estivesse
rigorosamente inscrito desenhado
ali centro de tudo

em............fim

re...............começado

digo mulher por hábito
por comodidade
mas na verdade  o teu corpo
é um
e qualquer
o meu corpo...............a mão por exemplo
esta mão instante
 


X

 

a mão
por dentro
e não só redonda mas única
e central

digo ainda.............qualquer corpo
mulher eu

na tua carícia masculinafeminina
falo de ti
de todas as mulheres

porque não só me deixei embalar por ti
centro do mundo
e amor
como sabia
sempre o soube para lá de todos os figimentos
e utilidades
das nossas mais secretas metamorfoses
 
corpo menino e alimento
tu é que existes realmente
e tudo o mais
faz de conta
somos diferentes

faz de conta
e por isso nos vestimos e penteamos
nos vemos ao espelho
e mais a pintura
a cultura e a tatuagem
e os objectos invulgarmente sonoros
excitantes bem entendido
e propícios

mas tudo isso
são acessórios
é acessório
do nosso teatro corpo
do teu corpo

teatro macabro orgia
e a esperança ainda disponível
missa de cor
missa de som
ritual
porque só podes estar presente

a ausência do teu corpo
a tua ausência não é apenas insuportável.........impensável
o fim do mundo que
precisamente...........não tem fim.............é tempo
a tua ausência destruiria todas as razões e a fé
apagaria os caminhos
tornar-nos-ia imortais
e as casas.............vãs.........inexistentes

por isso não estás nunca ausente
as carícias pétreas e duras
maquinais
cristalinas
e do interior da terra
são
sinais
da tua presença absoluta

o teu corpo
é a virilha e o púbis
a palavra
a saliva
é por vezes um escuro gritar
e depois o suor estendido
ocupando a cama toda e a sombra e o recanto
o sono e a ternura
funda
de novo.........a terra
é ainda o meu corpo
as palavras que o designam
podem não ser ditadas para esta
qualquer memória
basta dizer
o sexo
o sexo
o sexo
 
como as...............fotografias do teu corpo
e os livros
e este livro

apenas ouropéis..........fingimentos
acessórios
da nossa metamorfose..........orgia
registo alquímico
da tua presença absoluta
agora
aqui

O TEU CORPO É O MEU CORPO

agora.........aqui:
teatro.........metamorfose  orgia
o teu corpo
o meu corpo

















Retrato de ES por José Estêvão (Leonel Moura). Alunos do Conservatório improvisam diante das amplicópias de "Olympia", na Cooperativa Diferença, Lisboa, 1980. Poster  "Make Love" (verde e amarelo).