HERNANI DIMANTAS:

A CULTURA HACKER
É UMA NOVA FORMA DE PENSAR






HERNANI DIMANTAS estréia no mercado editorial com o livro Marketing Hacker: A Revolução dos Mercados, pela editora Garamond. A obra conta, por meio de uma série de artigos, a trajetória do projeto www.marketinghacker.com.br .

Um dos mais antigos colaboradores da Novae e de diversos outros projetos livres na Web, HD - para os mais próximos - dialoga com autores como Pierre Lévy e com textos como o Manifesto Cluetrain e aborda a revolução que a Internet possibilita nas relações de produção e consumo de mercadorias e mensagens. "À premissa das empresas de que o consumidor deve ser seduzido para o consumo acrítico, massivo e passivo de produtos e mensagens, Hernani Dimantas responde com a estratégia hacker, ou seja, com a participação coletiva, inteligente e crítica nos processos de produção", diz umas das coordenadoras da obra, Maria Alzira Brum Lemos.

Mas explicações do que faz ou o que pensa HD é dispensável para quem vive diariamente a Internet, independente dos grandes portais com suas senhas de acesso e seus truques comerciais. Nesse mundo, conhecemos bem Dimantas, que freqüenta tribos tão diversas e antagônicas que vão do mundo blog e imprensa alternativa, a colaborações pontuais com grandes players da mídia de massa. "Acredito na necessidade de incrustar este discurso na maior quantidade de canais."

Longe de parecer um paradoxo, o objetivo de HD, de fato, é carregar sua bandeira que busca desmascarar marketing, marqueteiros e seus clones, e falar para quem quiser ouvir. E debater. "Os discursos fajutos, as pessoas do mal, se valem de formas de comunicação baseadas no retrocesso."

Nessa entrevista, realizada durante uma semana inteira, por email e ICQ, HD se mostrou feliz, mau humorado e por muitas vezes impaciente. Características de quem concebeu uma obra que, com certeza, merece ser lida. (Mas de que a redação da Novae ainda não recebeu seu exemplar :o))).


Novae - Como foi a aventura de conceber seu livro?

HD - A palavra conceber cai muito bem. Um livro é um parto. Pois, o processo é muito meticuloso. A Garamond é uma editora muito rigorosa. Faz questão absoluta em manter uma alta qualidade na produção. A edição do livro esteve sob os cuidados do Ari Roitman e da Maria Alzira Brum Lemos. Ambos trabalharam com afinco no Marketing Hacker: A Revolução dos Mercados. O livro ficou muito legal!

Novae - E o marketing hacker (blog), com o lançamento do livro, acabou ou continua?

HD - Sinceramente, gostaria de parar. Acho que o objetivo do projeto foi alcançado. Ou seja, consegui incrementar o debate em torno da cultura hacker, do manifesto cluetrain e tropicalizar essa conversação nas comunidades online. Tenho outros projetos, tais como a Buzzine, o Asap, o Mercado Hype. Gostaria também de poder contribuir mais para a Novae. Atualmente tenho me esforçado para incrementar a Buzzine. A idéia da Buzzine é dar mais vozes aos mercados. Num espaço colaborativo, onde a comunidade é quem conduz o site. O conteúdo é moderado (e editado) pelas próprias pessoas que participam. A colaboração do Daniel Pádua que fez o novo design e, também, me ajudou na definição da taxonomia e da arquitetura do site trouxe um novo gás para o projeto. O Felipe Fonseca tem me ajudado na customização do Drupal. Um sistema fantástico que permite que toda essa colaboração online aconteça.

Novae - O Hernani, enfim, rompeu o firewall corporativo ou foi absorvido por ele?

HD - Não acho que consegui romper o firewall corporativo. Minhas incursões na mídia tradicional ainda são muito tímidas. Embora, eu acredito na necessidade de incrustar este discurso na maior quantidade de canais. Não creio que este processo diminua o valor da minha atuação online. Pois o debate transcende o meio. O Felipe falou uma coisa interessante: "Não se trata de procurar a resposta para os problemas do mundo, mas perceber que a solução está no encontro de todas as possíveis respostas".

Novae - E sua relação com a mídia de massa como anda?

HD - A comunicação de massa não é adversária. Apenas esta deixando de ter a importância que teve durante a era industrial. O Marketing Hacker foi desenvolvido como um projeto de mídia tática. O próximo passo é utilizar a mídia de massa para promover e incentivar a descentralização da mídia. Isto esta acontecendo na rede, mas é necessário dar condições financeiras para que as vozes despontem em todas as mídias. Estou seguro de que a próxima geração de colunistas, escritores e formadores de opinião seja oriunda da Internet.

Novae - pra ser alternativo a vida inteira, sem romper com suas crenças?

HD - Alternativo é um termo complicado. Somos alternativos a um sistema quando comemos pela beirada. Penso que o discurso está cada vez mais se tornando a realidade online. A minha crença neste projeto é cada vez maior. Pois estamos vendo a sociedade digital crescer num ritmo alucinante. Muitas pessoas estão falando, gritando e subvertendo o velho discurso. É possível pensar diferente.

Novae - Como você vê o ativismo editorial na WEB, que não visa o lucro e ainda vive pelo prazer hacker?

HD - O ativismo editorial é fruto da descentralização. Da possibilidade de publicação sem o filtro do editor e, principalmente, do enfoque da empresa de comunicação. Desta forma, as pessoas tem a possibilidade de colocar online as suas crenças e apontar os defeitos da sociedade corrupta em todos os sentidos. Mas a reputação destas publicações vai depender exclusivamente da relevância e da verossemelhança do que é dito. E de como é dito. O ativismo, então, passou a representar uma verdade mais próxima do cotidiano das pessoas. Os discursos fajutos, as pessoas do mal, se valem de formas de comunicação baseadas no retrocesso. Assim, vemos o spam empestear a rede. Até quando? Até a sociedade entender que a evolução é necessária. Mas esse ativismo editorial, ou a revolução da voz, não deveria estar alheia à remuneração. Afinal, a cultura hacker está modificando os padrões do capitalismo, mas sem implosão. A cultura hacker está apresentando um novo modo de produção. Que substitui as velhas fábricas por um processo de colaboração global. Este processo foi muito bem sucedido na indústria de software, elevando o Linux a um nível competitivo numa indústria baseada no copyright. Da mesma forma, a descentralização da informação está elevando a publicação autoral à competição com a mídia tradicional. Cabe dizer que a publicação autoral depende exclusivamente dos micromercados, das micro audiências e, principalmente, da linkania.

Novae - Você acha que o novo governo do Brasil, historicamente de esquerda, pode fazer a diferença quando falamos em software livre?

HD - Não é à toa que o Richard Stallman tem visitado o Brasil constantemente. Ele aponta a India e o Brasil como países com mais potencial no desenvolvimento do software livre. O governo do Rio Grande do Sul e a Prefeitura de São Paulo (ambos na gestão do PT) adotaram o software livre em programas estratégicos. No entanto, não me parece que a estratégia para adoção do software livre seja prioridade do governo Lula. Pois é difícil a compreensão do real significado do software livre no desenvolvimento tecnológico do Brasil. Creio que a questão é muito mais uma política progressista do que a economia gerada pela liberdade de utilização do software. É uma opção de crescimento formatada num projeto de colaboração. A tecnologia é cosmopolita. E pode utilizar quem quiser. Sem royalties... totalmente copyleft.

Novae - E os fóruns de discussão. Há alguns anos foi um participante ativo de algumas listas na web, que vc abandonou por discordar das condutas. Fale-nos como está sua relação com essa norma de comunidade.

HD - Ainda participo de muitas listas de debates. Mas, realmente, diminui a frequência. Eu nunca abandonei uma lista por discordar da conduta. Quando isso acontecia, eu sempre tratava de enfrentar os problemas com questionamentos fortes. No entanto, algumas listas vão deixando de ser interessantes. Existe um fluxo e refluxo de idéias. As pessoas mudam e os debates acabam se tornando insossos e repetitivos. A migração é natural. Atualmente participo da MetaFora, um debate que vai além da mesmice. O projeto matáfora apoia toda essa frente de trabalho livre e criativo. Atualmente, o grupo conta com mais de 150 pessoas. São pessoas que têm feito a internet acontecer. Pessoas como: Felipe Fonseca, Nemonox, Cris Dias, Edney Souza, Marcelo Estraviz (que entra e sai), Paulo Colacino, Felipe Albertão, Giseli Vasconcelos, Dalton Martins... e mais... muito mais que omiti apenas por limitação de espaço. A MetáFora pode ser definida como uma chocadeira colaborativa. Não dá para prever o futuro, mas seguramente podemos perceber pelo presente que deste grupo muita coisa interessante está sendo feita. A expectativa é de crescimento. A MetaFora é responsável direta ou indiretamente pelos projetos: BlogChalking, Buzzine, Metaong - , N5M, Metareciclagem (Agente Cidadão) e muito mais.