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JOSÉ CASQUILHO:::.....::::

 Da informação à mensagem: folhagem

Apenas a folhagem

De novo o encontro onde as linguagens abrem umas sobre as outras, o rapaz. Da árvore encarnada, meio dentro da memória, apenas a folhagem salta pelos olhos e se espalha pelo rosto, o que me põe a braços com as palavras. As raízes entram-lhe pelo sangue, abrem-lhe internos focos de paixão, não tarda que penetrem pela terra a cujos intestinos vão buscar com que saciar-lhe os olhos – as visões ascendem tumultuosamente, como seiva a ferver, creio que por vezes trazem pedra misturada. Lembro-me de o ver assim, todo ele tomado pela força da folhagem.
Luís Miguel Nava [∞]

Umberto Eco confronta-nos [1] com a diferença entre a mensagem como forma significante e sistema de significados e conclui que no primeiro caso trata-se da configuração gráfica ou acústica que pode subsistir mesmo se não fôr recebida, ou entendida, enquanto que no segundo caso é a forma significante que o destinatário, baseado em determinados códigos, preenche de sentido.  À estrutura linguística fonema/monema/sintagma o autor justapõe figura/signo/sema como análoga para outras semióticas que envolvam elementos com dupla articulação, mas em qualquer caso a estrutura ternária aí está [2]. O triângulo na enunciação e articulação do sentido foi a estrutura elementar trabalhada na obra de C. S. Peirce no âmbito da tricotomia do signo, salientando o autor que [3]: conjugando duas forças num paralelogramo a resultante é realmente uma terceira.

Três instâncias constituem pois o signo [4]: o semainon – o signo propriamente dito, que, enquanto forma, pode tomar a função de significante; o tynchanon – o referente, entendido como aquilo que existe realmente, o acontecimento, e o semainómemon – o conteúdo ou instância incorporal que estabelece a relação entre um signo e uma coisa, um incorporal pois que é da ordem da relação pura; o lekton cabe dentro dessa categoria.

Não são os objectos singulares da realidade que são designados pela linguagem mas os conceitos que os subsumem e conotam [5] e o mundo não contitui um dado para uma interpretação simbólica da linguagem, mas um constructum, o resultado da elaboração, onde determinar a significação de um enunciado equivale a definir o seu valor semântico. Desde Saussure que a semântica é referida como tendo por objecto analisar deslocamentos da relação entre o significado e o significante.

Deleuze refere-nos que uma das relações da proposição enunciada é frequentemente chamada manifestação [6], o enunciado dos desejos e das crenças, que são inferências causais, onde o desejo é a causa interna de uma imagem no que se refere à existência do objecto e a crença é a espera desse objecto. A espera de um objecto sugere um espaço de acontecimentos relacionado com a ocorrência da multiplicidade de todos os objectos daquele género ou espécie, e uma medida de verosimilhança ou de possibilidade: a probabilidade. Na Teoria da Informação, ou teoria matemática da comunicação, a informação é o que supre a incerteza, resolvendo-a numa determinação [7]; a  incerteza é máxima quando a distribuição de probabilidades é uniforme, o que corresponde a acontecimentos equiprováveis, geradores de objectos igualmente possíveis.

A fórmula que mede a incerteza transmuta-se em Ecologia para uma medida de diversidade, quando os acontecimentos são indíviduos das diferentes espécies presentes num ecossistema. A entropia estatística deixa de conotar desordem, caos, incerteza, para passar a denotar riqueza, diversidade, complexidade, ali presentes.

Existe o conceito de geometria da informação [8] onde a métrica da informação esperada de Fisher incide sobre uma variedade diferenciável obtida pela família das densidades de probabilidade num espaço de acontecimentos fixo, de medida 1 [9], e gera uma função potencial; ora com uma função potencial regressamos ao quadro da morfogénese no âmbito do postulado da estabilidade estrutural [10], coleções de formas: legissignos icónicos, remáticos, mas também índices e argumentos. Ou semas.

Lembra-nos Wilson [11] que o maior empreendimento da mente humana sempre foi e sempre será o objectivo de conectar as ciências com as humanidades e que a chave da unificação é a consiliência: concordância de induções provindas de séries distintas.

PS1 – Luís Costa [&], obrigado pelos emails onde me fizeste reencontrar o Luís Miguel Nava, é uma maneira de matar saudades no meio da folhagem: o fundo selvagem; espero ter-vos deixado a_braços de palavras,

PS2 – gato meu [*], o possessivo é só para salientar a presença da ausência deixa lá; olhava aqui o diamante e interrogava-me: será que se chama zircão?

Notas e Referências:

[∞] Luís Miguel Nava. 1979. Poemas.Editora Limiar, Porto, 1987.

[1] Umberto Eco (1968), 2001. A Estrutura Ausente. Editora Perspectiva, S. A., São Paulo, 2007.

[2] eu preferiria a designação traço como unidade elementar, equivalente à sílaba na palavra: o fonema;

[3] “If two forces are combined  according to the parallelogram of forces, their resultant is a real third “: http://www.textlog.de/4294.html

[4] José  A.  Mourão e Maria A.  Babo. 2007.  Semiótica – Genealogias e Cartografias. MinervaCoimbra,  Coimbra.

[5] Adriano D. Rodrigues. 1996. Dimensões pragmáticas do sentido. Edições Cosmos, Lisboa.

[6] Gilles Deleuze. (1969) 1998. Lógica do Sentido. Editora Perspectiva SA, São Paulo, 2006.

[7] para quem quiser aprofundar: http://www.triplov.com/casquilho/2008/semantic-manifold/semantic-manifold.pdf

[8] Khadiga Arwini, C. T. J. Dodson. 2008. Information Geometry. Springer-Verlag, Berlin.

[9] veja-se http://pt.wikipedia.org/wiki/Medida_(matem%C3%A1tica)

[10] pode-se vêr aqui o tema, onde o conceito de função potencial está alargado para o de função de Lyapounov: http://www.triplov.com/casquilho/2009/Morfogenese/index.html

[11] Edward O. Wilson. 1998. Consilience. La Unidad del Conocimiento. Galaxia Gutenberg, Barcelona, 1999.

[&] http://triplov.com/poesia/Luis-Costa/2009/Pascoa.html

[*] http://www.youtube.com/watch?v=4rb8aOzy9t4

José Pinto Casquilho. Centro de Ecologia Aplicada Baeta Neves (CEABN/UTL), Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens
josecasquilho@gmail.com
(CECL/UNL).