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JOSÉ CASQUILHO::::......::::

 Das árvores sagradas

D’ouverte qu’elle était jadis, l’humanité s’est de plus en plus refermée sur elle-même. (…) La nature toute entière s’en trouve dévalué. Autrefois, en elle tout était signe, elle-même avait une signification que chacun, en son for intérieur, ressentait. Parce que il l’a perdu, l’homme aujourd’hui la détruit et par là se condamne
Jacques  Brosse, 1989

Mircea Eliade conta-nos que a imagem da árvore não foi escolhida unicamente para simbolizar o Cosmos, mas também para exprimir a Vida, a juventude, a imortalidade, a sapiência [1]. A existência do homo religiosus é aberta para o mundo, o homem religioso nunca está sózinho, pois vive nele uma parte do Mundo.

Jacques Brosse [2] recorda-nos que para o selvagem - que no seu sentido original é o habitante da floresta, da selva -, tal como para o sábio, a árvore é verdadeiramente a primeira das criaturas terrestres e o ser vivo que une a terra e o céu, indicando o caminho dos deuses .

Há inúmeros relatos de árvores sagradas em muitas culturas: Yggdrasill era o freixo gigante da mitologia nórdica, o mensageiro de Ygg, um dos nomes de Odin, o pai dos deuses; enquanto que em Creta o freixo era consagrado a Posídon e o carvalho a Zeus; o carvalho de Dodona, interpretado pelas Plêiades, constituía o oráculo mais poderoso da região [3] e sob a sua casca viviam as dríades, uma das categorias de ninfas.  O carvalho, mais especificamente o Quercus robur, ficou sucessivamente associado a Júpiter e na mitologia nórdica a Donar-Thor, sempre o deus dos raios e trovões. É o signo basal da astrologia celta, onde o nome druida, semelhante ao termo grego para carvalho sagrado, drus, significa sabedoria da árvore.

A propósito das representações da árvore sagrada na Mesopotamia [4] diz-se que não há culto da árvore em si, mas que sob aquela figuração se esconde sempre uma entidade espiritual. A árvore permite conjugar dois infinitos opostos unindo duas profundidades simétricas e de sentidos contrários: as raízes mergulhadas na impenetrável matéria subterrânea e a copa imersa em luz [5].

Existem histórias sacrificiais ligadas a árvores: o sacrifício original de Attis que renasceu como pinheiro-manso, os reis sacrificados a Yggdrasil, o senhor escorchado das culturas mesoamericanas, e outras. Também há histórias felizes: Buda alcançou a iluminação, ou o despertar, debaixo de uma figueira, Ficus religiosa.

A oliveira é árvore bendita, símbolo da paz para os gregos e romanos, o azeite é o óleo sagrado por excelência, e que ilumina. O Messias, Mâschiak em hebreu, o Ungido do Senhor, traduzido em grego por Khristos, é o que recebeu a unção do óleo santo.

 A língua portuguesa é particularmente rica e discriminante em termos genéricos ligados a árvores, partes e conjuntos, conforme se pode ver na tabela abaixo, elaborada por Hjelmslev e transcrita por Eco [6]:

Numa tabela assim trata-se com valores que emanam do sistema, associados a dimensões de extensão e intensidade, denotação e conotação, que se podem organizar numa estrutura tensiva como diferenças, transportando uma mensagem que se pode definir como a forma significante que o destinatário, baseado em códigos determinados, preenche de sentido.

A árvore sagrada significa em muitas culturas o Axis Mundi - o eixo do mundo - em torno do qual a comunidade se identifica e regenera - esse é o seu signo principal.  Deleuze [7] recorda-nos que a superfície é o lugar do sentido: os signos permanecem desprovidos de sentido enquanto não entram na organização de superfície que assegura a ressonância de duas séries.

Bouguereau, "Ninfas e Sátiro" (1873)

Referências:

[1] Mircea Eliade. 1957. O Sagrado e o Profano – a essência das religiões. Martins Fontes, São Paulo, 2001.

[2] Jacques Brosse. 1989. Mythologie des Arbres. Librairie, Plon, Paris.

[3] http://greciantiga.org/arquivo.asp?num=0477

[4] Nell Parrot. 1937. Les Représentations de l’arbre sacré sur les monuments de Mésopotamie et d’Elam, Paris.

[5] ver uma interpretação simbólica no final deste texto:
: http://www.triplov.com/casquilho/2008/Triade/triade.pdf

[6] Umberto Eco. (1968), 2001. A Estrutura Ausente. Editora Perspectiva SA, São Paulo, 2007.

[7] Giles Deleuze. (1969), 1998. Lógica do Sentido. Editora Perspectiva SA, São Paulo, 2006.

José Pinto Casquilho. Centro de Ecologia Aplicada Baeta Neves (CEABN/UTL), Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens
josecasquilho@gmail.com
(CECL/UNL).