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VITORINO NEMÉSIO
E A CIDADE DA HORTA (1)
VICTOR RUI DORES
Dores, V. R. (2004), Vitorino Nemésio e a cidade da Horta. Boletim do Núcleo Cultural da Horta, 13: 101-110.
 
Resumo: O ambiente na cidade da Horta no princípio do século XX e a sua influência em alguns aspectos biográficos e da escrita de ficção de Vitorino Nemésio.

No mês de Maio do ano de 1918, Vitorino Nemésio, então com 16 anos de idade, desembarcava, pela primeira vez, na cidade da Horta. A vida não lhe corria de feição em termos de sucesso escolar, pois um ano antes, sofrera vários desaires estudantis (entre os quais a expulsão do Liceu de Angra e a reprovação do 5º ano), e, por isso mesmo, sentindo-se incompreendido pelos professores, deixa a sua ilha Terceira.e resolve apresentar-se a exames, como aluno externo, no então Liceu Nacional da Horta.

O futuro e brilhante professor catedrático começa por ser mau aluno... Do período do Liceu de Angra, Nemésio apenas guardará boas recordações de Ferreira Deusdado, "meu sábio professor de História e primeiro consultor literário que me meteu nesta vida de letra de forma periódica e de espírito irreciclável".

Aliás, Nemésio voltará, mais tarde, a reincidir com esta atitude de se julgar injustamente classificado pelos professores ao trocar a Faculdade de Letras de Coimbra pela de Lisboa, onde concluirá, com elevadas classificações, os exames do
4º ano, vindo a concluir o curso de Filologia Românica em 1931.

Doutorado em 1935 e tendo ascendido à cátedra em 1942, o seu magistério na Faculdade de Letras de Lisboa prolongou-se durante três décadas, leccionando Literatura e Cultura Portuguesa, Francesa e Brasileira, além de cursos de Literatura Italiana e Espanhola.

Nas suas Notas Autobiográficas - escritas em 1971 a pedido de David Mourão Ferreira), Nemésio reIlata que, nos exames do 5º ano que ao Liceu da Horta foi fazer, contou com a complacência dos professores Simão de Roches da Cunha Brum (mais conhecido por Barão de Roches ), que lhe passou o ponto de Ciências, e Florêncio Terra, "excelente contista, mas severo em Matemática, deu-me 10. E passei" (cf. GARCIA, 1978).

Mas não só. Numa pesquisa que realizei no Arquivo da agora Escola Básica 3/ Secundária Dr. Manuel de Arriaga, percorrendo o "Índice alfabético dos indivíduos que têm feito exames neste Liceu Nacional da Horta" (folha 125), encontrei os Termos de Exames de Alunos Externos do Curso Geral (Livro 31, folha 79), onde se encontram os resultados das provas escritas e orais obtidos por Nemésio no exame do 5º ano. Assim, nas Provas escritas foram-Ihe dadas as seguintes notas:

Composição em portuguez -15 valores;

Composição em francez -10 valores;

Tradução de latim para portuguez - 11 valores;

Tradução de portuguez para inglez -10 valores;

Exercício mathematico: arithmetica, algebra e geometria -10 valores;

Exercício de physica -12 valores;

Exercício de desenho -8 valores

Nas Provas orais do mesmo exame, o nosso jovem escritor foi "corrido" a 10:

Portuguez -10 valores;

Latim - 10 valores;

Francez - 10 valores;

Inglez -10 valores;

Geographia; 10 valores;

Mathemótica -10 valores;

Sciencias naturaes -10 valores;

Desenho -10 valores.

Nemésio concluía, assim, o Curso Geral dos Liceus, no dia 16 de Julho de 1918, com a qualificação final de "dez valores, suficiente". O Presidente do Júri era constituído por Florêncio José Terra, sendo vogais Manuel Agostinho Simas, Simão de Roches da Cunha Brum, Francisco Espínola de Mendonça e Alexandre Fernandes da Costa Feijão.

A estada de Nemésio na cidade da Horta durou de Maio a Agosto de 1918. Na sua edição de 13 de Maio, o jornal O Telégrafo, na secção "Noticiário" dava conta: "Para completar o curso geral dos liceus encontra-se na Horta o sr. Vitorino Nemésio, autor do livro Canto Matinal, de Angra do Heroísmo". E na edição de 13 de Agosto do mesmo ano, noticiava aquele jornal: "Retirou a Angra o sr. Victorino Nemésio, que à Horta viera fazer o exame do 5º ano do liceu". (Poderá parecer curioso que um "fedelho" de 16 anos mereça honras de notícia de jornal, mas a1 verdade é que Nemésio, um ano antes de chegar à Horta, havia enviado um exemplar de Canto Matinal a Manuel Emídio Gonçalves, director de O Telégrafo...).

Durante esse período de tempo, o "tímido e bisonho rapazinho" vai conhecer, na Horta, pessoas de quem falará, mais tarde, no romance Mau Tempo no Canal. Foram elas, entre outras: o dr. José Machado de Serpa, senador da República e estudioso; o padre Nunes da Rosa, contista e, na altura, professor do Liceu da Horta; Osório Goulart, poeta pamasiano, pela mão de quem Nemésio participará nalgumas tertúlias literárias; o dr. Neves, político e polemista; o comendador Bulcão; a poetisa e pedagoga Silvina de Sousa (que utilizava o pseudónimo de Iracema); o maestro Symaria, cujo nome, na referida obra, surgirá grafado em Sigmalia. Será ainda apresentado em casa das senhoras Arriaga, irmãs de Manuel de Arriaga, "modelos das Streets do romance" e tomar-se-á íntimo da família Goulart Medeiros (GARCIA, 1978).

 
 
Victor Rui Dores - Conservatório Regional da Horta. Rua Marcelino Lima. 9900-122 Horta.