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MARIA AZENHA
Falam dentro de mim as aves
falam dentro de mim as aves

falam dentro de mim as aves
o voo das nuvens no interior dos meus sonhos
habitadas por crianças. muros. frágeis sílabas de orvalho.
tenho caminhado muito . pai. do lado de dentro das ruas
o regresso é haver ontem. casas. tectos.
lâmpadas acesas no interior dos lençóis.
escavo as noites com pérolas . para olhar a treva das águas.

há o que escrevo nas paredes do vento
com a seiva das árvores
vejo toda a eternidade embaciada nos vidros
fechados
das janelas dos teus olhos . que dão para o rio

ninguém sabe onde corre o livro do vapor dos barcos. nem eu própria.
perdi-me
nas asas do escuro do lume. na viagem.

deve haver pássaros espreitando as páginas
que as minhas folhas caídas respiram

lá longe. pai. os dias separam-se com poemas acesos na lua

ardo. ao canto do quarto.
na mansidão do vazio.

um lugar puro
estou em frente ao jardim, mãe. levantei - me muito cedo. para chamar-te. as
abelhas dançam em redor do teu núcleo . é quase primavera
dentro do meu peito.
e sei que há fendas muito fundas nas paredes dos teus olhos.
é de onde vejo.

as tuas mãos esguias. fazem sombras
sobre a teia
dos muros.estendem-se para além das ruas.como pétalas
feridas
pelo chão mais duro.
as crianças. as que mataram de frio . dormem ao relento
através da lua.
suponho que escrevo. não sei. não me recordo.

estou num quarto escuro. que se move dentro do meu pensamento.


a minha voz começa aqui.
debaixo das nuvens.



é de lá que sai a luz