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ANA LUÍSA JANEIRA
As expos de Sevilha e Lisboa

HÁ 10 ANOS
na Península Ibérica, mais uma exposição universal

PARA UMA ARQUEOLOGIA EPISTÉMICA
DAS EXPOS DE SEVILHA E LISBOA - INDEX

I - As brechas da Filosofia das Ciências perguntam pela arqueologia epistémica das Expos ‘92 e ‘98

As Exposições Universais e Internacionais são manifestações colectivas equivalendo a um discurso global complexo. Durante cento e cinquenta anos, este discurso tem permitido a emergência de enunciados maiores, passiveis de um tratamento epistémico. Facto tanto mais desejável quanto estas realizações estão sempre ligadas, por objectivos explícitos e implícitos, a interesses económicos e políticos, servindo canais de comunicação pública associados a atitudes inovadoras, adquiridos de última moda e produtos revolucionários, que sempre traduzem conquistas do conhecimento, interceptando-se nas três configurantes maiores do conjunto: Arquitectura e Urbanismo, Tecnologia e Ciência, Arte e Espéctaculo.

A Expo de Sevilha correspondeu ao intuito de enaltecer uma Espanha moderna no contexto da integração europeia. Fê-lo através de complexos urbanísticos e arquitectónicos, que serviram para reequilibrar a cidade no sentido oriental e reconquistar as margens do Guadalquivir. Independente do que vem ocorrendo depois de 1992, a Cartuja fez questão de acolher pavilhões muito sofisticados, avenidas largas e múltiplos jardins, cobertos por uma vegetação especialmente cuidada, com destaque para as espécies latino-americanas. Isso acontecendo, enquanto que o Caminho das Descobertas, a culminar no Pavilhão do Futuro, convidava o público para questões prementes da actualidade, com destaque para as questões ecológicas.

É evidente que a Expo ‘98 definiu e ergueu uma Lisboa Oriental renovada, ou mesmo totalmente nova. Na verdade, o acontecimento, aquém e álem da sua existência datada, constituiu-se como uma aposta efectiva, visando consequências a longo prazo. Se se conjugar este aspecto, já de si muito importante, com os efeitos decorrentes da Ponte Vasco da Gama, a imagem de Lisboa enriqueceu-se ainda, por uma perspectiva que permitiu descobrir um lado seu, até então quase oculto ou pouco visível.

Menos evidente, mas nem por isso secundária em ambos os casos, a forma como a componente tecnológica se fez sentir privilegiou mais uma expressão tecnocientífica ou de ciência aplicada, do que o interior da ciência fundamental. Com efeito, as várias vertentes optaram pelo carácter exibicionista do saber e do saber-fazer, através de objectos escolhidos pela sua capacidade de maior sucesso sensorial ou emocional.

Assim, as tecnologias da informação e as telecomunicações receberam as maiores honras, em Sevilha. Neste particular, a Expo de Lisboa enalteceu a realidade virtual, modo recente de questionar os conceitos tradicionais de potência e acto aristotélicos; surgindo, pois, como uma emergência muito atractiva, pois constituia uma primeira aproximação, com foros de descoberta fascinante, para o grande público português.

Além disso, o impacto espectacular constituiu-se como arte e artifício expositivo. De uma estética rica em vários quadrantes, embora muitas vezes pobre em termos museológicos e museográficos, manifestou-se através de espaços e de tempos visuais muito fortes, em Espanha e em Portugal.

Para além de outras tantas descontinuidades, ocorridas na globalidade do processo, as figuras epistémicas que concorrem para esta conjugação entre os complexos urbanísticos e arquitectónicos remanescentes, a componente tecnológica relevante e o impacto espectacular mobilizador começaram a fazer parte da configuração das Expos, ao longo do século passado. Ou seja, independentemente das mudanças ocorridas, a configuração das Expos mantém nexos permanentes com um modelo de sociedade, de ciência e das relações entre elas, que começou a emergir em 1851.

ANA LUÍSA JANEIRA

Professora Associada com Agregação em Filosofia das Ciências do Departamento de Química e Bioquímica da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Rua Ernesto de Vasconcelos, 1700 Lisboa, tel. 351.217573141, fax 351.217500088.

Co-fundadora, primeira coordenadora e, actualmente, investigadora do Centro Interdisciplinar de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade de Lisboa (CICTSUL).

Instituto de Investigação Científica Bento da Rocha Cabral
Calçada Bento da Rocha Cabral, 14 - 1250-047 Lisboa

janeira@fc.ul.pt

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